Suspensos processos sobre homologação da reserva Raposa Serra do Sol

01/10/2004 15:59 - Atualizado há 12 meses atrás

Liminar do ministro do STF Carlos Ayres Britto suspendeu o andamento dos processos que impediram a homologação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.


A decisão paralisa, até decisão de mérito em Reclamação (RCL 2833) proposta pelo Ministério Público Federal (MPF), a ação popular que tramita na 1ª Vara da Seção Judiciária de Roraima e um recurso que está no Tribunal Regional Federal da 1ª Região.


O pedido principal do MPF é para que os processos sejam julgados pelo Supremo. Para o procurador-geral da República, Claudio Fonteles, como a homologação da reserva configura conflito entre a União e o Estado de Roraima, cabe ao STF analisar o caso (artigo 102, inciso I, alínea “f”, da Constituição Federal).


De um lado, a União e a Funai querem ver cumprida portaria do Ministério da Justiça que determinou a homologação contínua. De outro, há decisões judiciais acolhendo o argumento de terceiros alegando que a área pertencente ao Estado de Roraima seria afetada pela demarcação do Ministério da Justiça.


Em despacho divulgado hoje (1º/10), o ministro Ayres Britto lembra que o STF já enfrentou questão semelhante ao julgar a Reclamação 424. Naquele caso, o Plenário entendeu configurar conflito entre União e Estado – de competência do STF – a hipótese de um cidadão, em nome próprio, propor ação popular em defesa do patrimônio público.


“Por outro lado, parece-me que a questão em debate na ação popular que tramita perante o Juízo-reclamado não possui índole exclusivamente patrimonial”, diz o ministro. Isso porque os autores da ação buscam proteger o patrimônio público roraimense ao atacar a portaria do Ministério da Justiça.


Para Britto, o caso se enquadra no entendimento, hoje sedimentado, de que a competência do STF para julgar causas e conflitos entre União, Estado e Distrito Federal restringe-se às hipóteses de litígios cuja potencialidade ofensiva possa vulnerar o princípio fundamental do pacto da Federação.


RR/CG


Leia mais:
27/09/2004 – 18:34 – MPF quer que Supremo defina processo de homologação da reserva indígena Raposa Serra do Sol


O ministro Carlos Ayres Britto deferiu a liminar (cópia em alta resolução)


Leia a íntegra da decisão do ministro Ayres Britto:


 MED. CAUT. EM RECLAMAÇÃO 2.833-0 RORAIMA


 


RELATOR : MIN. CARLOS BRITTO


RECLAMANTE(S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL


RECLAMADO(A/S) : JUIZ FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO


   JUDICIÁRIA DE RORAIMA


RECLAMADO(A/S) : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO


INTERESSADO(A/S) : SILVINO LOPES DA SILVA E OUTRO(A/S)


ADVOGADO(A/S) : LUIZ RITTLER BRITTO DE LUCENA E OUTRO(A/S)


 


DESPACHO: Vistos, etc.


Com fundamento  no  art. 102, inciso I, alínea “l”, da Carta-cidadã, o Ministério Público Federal maneja a presente reclamação com pedido de medida liminar. E o faz para preservar a competência deste colendo Tribunal que estaria sendo usurpada pelo Juízo da 1a Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Roraima.


 


2. Sustenta o reclamante que Silvino Lopes da Silva e outros ajuizaram uma ação popular em face da União e da FUNAI (Processo nº 9994200000014-7/RR). Aduz que, nesse feito, os autores tencionam questionar a validade jurídica da Portaria nº 820/MJ, de 11.12.98, que teria demarcado a área indígena denominada “Raposa Serra do Sol”.


 


3. Diz, ainda, o acionante que “a discussão central que se tem na presente lide diz com a preservação, por parte dos autores da ação popular, da área física do Estado de Roraima que, segundo eles, queda reduzida em 50% a vingar os limites traçados na Portaria demarcatória (…), ao passo que a FUNAI e a União Federal sustentam que os limites, como traçados na questionada Portaria, espelham terras indígenas, sobre as quais o Estado-membro da federação não tem qualquer ingerência, mas sim a União Federal”.


 


4. Prossigo neste breve relatório para consignar que, após declinar os fundamentos jurídicos da sua pretensão de ver julgada procedente esta reclamação, o acionante formula o seu pedido. Em primeiro lugar, o requerente deduz a sua pretensão acautelatória, na qual pugna pela suspensão do andamento da Ação Popular nº 9994200000014-7/RR, bem como do AI nº 2004.01.00.011002-0 – TRF 1a Região. Já no tocante ao mérito da causa, o reclamante postula o reconhecimento da usurpação da competência originária deste Supremo Tribunal Federal e a remessa desses processos para esta egrégia Corte de Justiça.


 


5. Apresentada a matéria que se contém nesta reclamatória, passo a enfrentar o pedido de medida liminar. E, ao fazê-lo, convenço-me de que essa pretensão atende aos requisitos autorizadores da concessão do provimento preambular.


 


6. Em boa verdade, como bem salientou o reclamante às fls. 04, este Supremo Tribunal Federal já enfrentou questão semelhante à tratada nestes autos. Refiro-me ao julgamento da Reclamação 424, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, na qual esta colenda Corte decidiu:


 


“Ação Popular: natureza da legitimação do cidadão em nome próprio, mas na defesa do patrimônio público: caso singular de substituição processual.


II. STF: competência: conflito entre a União e o Estado: caracterização na ação popular em que os autores, pretendendo agir no interesse de um Estado-membro, postulam a anulação de decreto do Presidente da República e, pois, de ato imputável à União.”


 


          7. Por outro lado, parece-me que a questão em debate na ação popular que tramita perante o Juízo-reclamado não possui índole exclusivamente patrimonial. Isto porque, do exame da cópia da petição inicial da multicitada ação popular (fls. 06/16), vê-se que seus autores buscam proteger o patrimônio público roraimense, atacando a validade jurídica da Portaria nº 820/98, exarada pelo Ministério da Justiça. Sendo assim, afigura-se-me que o caso dos autos se enquadra no entendimento, hoje sedimentado, de que a competência estabelecida na mencionada alínea f se restringe “às hipóteses de litígios cuja potencialidade ofensiva revele-se apta a vulnerar os valores que informam o princípio fundamental que rege, em nosso ordenamento jurídico, o pacto da Federação” (ACO 359, Rel. Min. Celso de Mello).


 


          8. Nessa ampla moldura, defiro a medida liminar requestada para determinar a suspensão, até o julgamento de mérito desta reclamação, da Ação Popular nº 9994200000014-7, em trâmite perante a 1a Vara da Seção Judiciária de Roraima; bem como do AI nº 2004.01.00.011002-0, em curso no Tribunal Regional Federal da 1a Região.


          Solicitem-se informações aos reclamados.


          Intime-se.


          Publique-se.


          Brasília, 29 de setembro de 2004.


 


 


Ministro CARLOS AYRES BRITTO


Relator

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