Supremo rejeita denúncia do MPF contra o deputado federal Eduardo Campos
O Supremo Tribunal Federal rejeitou parcialmente hoje (12/11) a denúncia do Ministério Público Federal que responsabilizou o deputado federal Eduardo Henrique Accioly Campos (PSB/PE) por suposta emissão fraudulenta de títulos públicos do estado de Pernambuco para pagamento de precatórios pendentes. O Plenário rejeitou por unanimidade a acusação por prática dos crimes de falsidade ideológica (artigo 299, do Código Penal) e contra o Sistema Financeiro Nacional (artigos 5º e 6º da Lei 7492/86).
A decisão foi aprovada no julgamento do Inquérito 1690. Hoje o procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, argumentou que “todo o esquema de distribuição dos lucros da operação é descrito tanto no relatório do Banco Central, quanto no relatório da intitulada CPI dos Precatórios, instaurada no âmbito do Senado Federal”. Inquiriu ele se “esse caso rumorosíssimo na nossa nação”, como descrito, não caracterizaria para o STF “o que é necessário para o recebimento de uma denúncia, ou seja, a presença do fumus boni iuris (juízo de probabilidade do bom direito)”.
Em sustentação oral, os advogados de Eduardo Henrique Accioly Campos, de Fábio Barreto Nahoum, Mauro Enrico Barreto Nahoum, Ronaldo Ganon e Jairo da Cruz Ferreira sustentaram a inépcia da denúncia..Por indicação do relator, ministro Carlos Velloso, o Supremo adiou a conclusão do julgamento em relação aos outros envolvidos no processo quanto ao crime contra o Sistema Financeiro Nacional.
Em relação ao crime contra o Sistema Financeiro (artigo 7º, inciso 2º da Lei 7492/86), o Plenário acompanhou o voto do relator, ministro Carlos Velloso, ao julgar a denúncia inepta, por não vincular o ex-secretário de Fazenda do estado de Pernambuco ao suposto ato ilícito atribuído a ele, consistente no registro irregular de títulos estaduais junto ao Banco Central.
O STF também rejeitou a denúncia por falsidade ideológica, ao julgar que é preciso haver dolo (intenção) específico para que se caracterize sua prática, não sendo crime que exista sob a modalidade culposa (sem intenção). Eduardo Campos foi acusado pela inserção em documento público de lista de precatórios enviada ao Senado Federal e o Banco Central com declaração diversa da que deveria ser escrita. Conforme a denúncia, “apurou-se que o valor real dos precatórios totalizaria R$ 26 milhões, e não R$ 480 milhões solicitados”.
A denúncia diz que o secretário de Fazenda foi o “mentor intelectual da fraude perpetrada”, tendo também assinado a declaração que contém a lista de Precatórios “produzida a partir de Precatórios já existentes, contudo superavaliados”.
“Uma coisa me parece certa: Os Precatórios pendentes de pagamento não foram levantados pelo secretário de estado, mas por equipes de diversos órgãos, que teriam cometido as erronias e equívocos. Impossível responsabilizar o secretário de estado pela prática do fato”, afirmou o ministro Velloso.
“Narra a denúncia que o estado de Pernambuco agindo como instituição financeira por equiparação legal (artigo 1º, parágrafo único da lei 7492/86) teria emitido títulos mobiliários de forma fraudulenta, incorrendo, portanto, o secretário da Fazenda, nos crimes previstos nos artigos 5º, 6º e 7º, da Lei 7492/86”, observou o relator dando seguimento ao seu voto.
O ministro relator, Carlos Velloso, considerou inicialmente que o estado de Pernambuco não poderia ser equiparado a instituição financeira para os fins do disposto no artigo 1º, da Lei 7492/86, pois a emissão das Letras Financeiras para captação de recursos para o Tesouro do Estado não configuraria a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a custódia, emissão, distribuição, negociação, intermediação ou administração de valores mobiliários.
“Na estrutura do Direito Penal brasileiro, vige o princípio constitucional da reserva legal”, observou o ministro. Para ele somente as pessoas que se enquadram no conceito de instituição financeira poderiam responder pelos tipos penais nela estabelecidos. Assim, não entendeu ser o estado de Pernambuco uma instituição financeira, e, por conseqüência, o secretário de Fazenda não teria praticado os crimes previstos nos artigos 5º, 6º e 7º da Lei 7.492/86, e rejeitou a denúncia nesta parte.
Finalmente, o MPF atribuiu ao denunciado, Eduardo Campos, a conduta criminosa prevista no artigo 89, da Lei nº 8.666/93, por supostamente ter contratado sem licitação o Banco Vetor, embora não tivesse notória especialização expressa em lei para dispensar a licitação.
A denúncia, para o relator, não estabeleceria o vínculo entre o acusado e o ato ilícito que lhe está sendo imputado. Ressaltou que o responsável pelo controle e negociação (contratos, compras, pagamentos) das Letras do Tesouro estadual seria o Banco de Pernambuco. E à Secretaria da Fazenda estadual caberia apenas oficiar tecnicamente sobre as negociações. O relator observou que nesse ponto haveria fato de terceiro, incapaz de responsabilizar o acusado, a menos que houvesse a possibilidade de invocar a responsabilidade penal objetiva. E rejeitou nesse ponto a denúncia.
O ministro Carlos Ayres Britto divergiu do relator apenas quanto ao recebimento da denúncia com relação à conduta prevista no artigo 89, da Lei de Licitações (Lei 8.666/93). Os demais ministros acompanharam o relator.
HISTÓRICO
O Inquérito foi instaurado pelo Ministério Público Federal (MPF), em virtude das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado Federal, que apurou irregularidades relacionadas à autorização, emissão e negociação de Títulos Públicos estaduais e municipais em 1995 e 1996.
A denúncia sustenta que o estado de Pernambuco, agindo como instituição financeira, emitiu o valor de R$ 480 milhões de títulos mobiliários, chamados de Letras Financeiras do Estado de Pernambuco (LFTEPE), de modo fraudulento para pagamento de precatórios.
O pedido de autorização para a emissão dos títulos foi feito pelo então governador do estado Miguel Arraes, tendo participado também do suposto esquema, segundo o MPF, o deputado Eduardo Henrique Accioly Campos (PSB/PE), na época secretário da Fazenda do estado de Pernambuco, o ex-diretor-presidente do Banco de Pernambuco (Bandepe) Wanderley Bejamim de Souza, o ex-diretor de finanças do Bandepe Jorge Luiz Carneiro de Carvalho, os economistas Fábio Barreto Nahoum e Mauro Enrico Barreto Nahoum, os administradores Ronaldo Ganon e Wagner Batista Ramos, o contador Nivaldo Furtado de Almeida, o advogado Miguel Arraes de Alencar e o servidor do Banco Central aposentado Jairo da Cruz Ferreira. Com relação ao ex-governador de Pernambuco, a denúncia foi extinta pelo relator, ministro Carlos Velloso, em 30 de outubro de 2002, porque o crime prescreveu.
Eles teriam montado um esquema que ia da elaboração de documentos fraudulentos apresentados à Assembléia Legislativa de Pernambuco, ao Banco Central e ao Senado Federal para a autorização da emissão dos títulos, à criação das LFTEPE e sua colocação no mercado. Além disso, parte do valor emitido não teria ingressado nos cofres do estado porque cerca de 25% dos recursos teriam sido embolsados pelos supostos mentores por meio de comissões. Ainda, a lista de precatórios teria sido preparada pelo Banco Vetor, utilizando tecnologia de Wagner Ramos, valendo-se de precatórios inexistentes e superavaliados. Ademais, o Banco Vetor teria sido contratado sem licitação.
Os acusados foram denunciados pelos crimes de falsidade ideológica (artigo 299, parágrafo único, do Código Penal), afronta ao sistema financeiro nacional (artigo 6º, da Lei nº 7.492/86), registro irregular de título público (artigo 7º, inciso II, da Lei 7.492/86), apropriação indébita dos valores obtidos com a venda dos títulos (artigo 5º, da Lei nº 7.492/86) e dispensa irregular de licitação (artigo 89, da Lei 8.666/93). A denúncia chegou ao STF em virtude da prerrogativa de foro do deputado Eduardo Henrique Accioly Campos.
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