Supremo recebe parecer contra importação de pneus usados ou reformados
Em parecer ontem (6) encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3938, o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, reiterou manifestação contra a importação de pneus usados ou reformados pelo Brasil.
A ADI foi proposta pelo governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB), contra o artigo 47-A do Decreto 3.179, de 21 de setembro de 1999, na redação que lhe foi dada pelo Decreto 3.010, de 14 de setembro de 2001, que prevê multa de R$ 400,00 por unidade importada de pneu usado ou reformado e aplica igual pena para quem comercializar, transportar, armazenar, guardar ou mantiver em depósito tal produto.
A proibição de importar pneu usado ou reformado data de 1991, quando a Portaria nº 8, baixada em 14 de maio daquele ano pelo Departamento de Comércio Exterior (Decex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, proibiu, em seu artigo 27, a importação de bens de consumo usados.
Reiteração
O parecer encaminhado ao STF reforça manifestação anterior da Procuradoria-Geral da República (PGR) no mesmo sentido, na Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 101, proposta pelo presidente da República em setembro de 2006 contra decisões judiciais que autorizaram a importação de pneumáticos usados ou reformados.
O procurador-geral argumenta, na ADPF, que as decisões violam o artigo 225 da Constituição Federal (CF) que assegura a todos o direito de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à sociedade o dever de preservá-lo.
Por sua importância econômica e ecológica, a importação de pneus já foi objeto de audiência pública, em junho do ano passado, convocada pela relatora da ADPF 101, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, para que todos os segmentos envolvidos pudessem manifestar-se a respeito.
A PGR prevê que a questão – objeto, além da ADI 3938 e da ADPF 101, também da ADI 3241 – deverá ter, mesmo, um desfecho, no STF, quando do julgamento dessa ADPF. Segundo ela, o processo, já “instruído para julgamento, está amplamente aparelhado, com significativa ação dos inúmeros agentes envolvidos no debate acerca da proibição da importação de pneumáticos usados para fim de reforma ou remodelagem”.
ADI 3938
Na ADI 3938, agora objeto de parecer da PGR, o governador do Paraná, Roberto Requião, alega que a importação de pneus usados ou reformados não está prevista em lei como prática lesiva ao meio ambiente e que, portanto, o dispositivo por ele contestado ofenderia o artigo 5º, inciso II, da CF (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”).
Por outro lado, os decretos impugnados teriam instituído uma pena absoluta, pois não teriam considerado a gravidade da conduta individual dos agentes. E isso representaria infração ao inciso XLVI do artigo 5º da CF.
Argumenta ainda, que os decretos violariam a liberdade de atividade profissional, ante restrição a uma conduta empresarial legítima (artigo 5º, inciso XII da CF) . Representariam, igualmente, uma intervenção desmedida na ordem econômica, em infração ao artigo 170 da Constituição.
Reserva legal
Em seu parecer, a PGR endossa argumento da Advocacia Geral da União (AGU) que contesta os argumentos do governador paranaense e sustenta, de início, que ele não tem legitimidade jurídica para propor a ação, pois “a vedação, ou não, de uma dada prática comercial, ligada às pautas de importação, de controle da União (CF, artigo 22, VIII), escapa ao âmbito político do governo do estado”. No entender da PGR, este somente poderia cogitar de uma articulação contra o dispositivo impugnado via Congresso Nacional.
“O Ministério Público Federal tem posição firme sobre a matéria, que se verga pela completa legitimidade da ação estatal, em repulsa à intenção de se admitir a importação irrestrita desse material que, bem examinado, constitui típico despojo”, afirma a PGR.
Segundo ela, “o Poder Executivo, autorizado pela Lei 9.605/98 (em seus artigos 70, 72, caput e incisos I e III, e 74) e, dentro das inspirações dos valores eleitos pelos artigos 196, 170, I e VI, e 225, caput e parágrafo 3º, da Lei Maior, está obrigado a detectar e banir práticas que demonstrem ser lesivas ao meio ambiente e à saúde pública”.
Assim, segundo a Procuradoria, “não há como se dizer que não existem coordenadas legais para a ação governamental, singelamente acenando que não há específica previsão normativa, fora os atos emanados pelo Poder Executivo e seus órgãos de controle”.
Ela recorda, neste contexto, que o parágrafo 3º do artigo 225 da CF prevê que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Observa ainda que, “no universo constitucional, não tem espaço a estagnação estatal frente a um caracterizado (pelos organismos públicos competentes) fenômeno de dano ao meio ambiente, ao argumento de ausência de previsão legal que tipifique a conduta como tal”.
Para ilustrar esse argumento afirma que, “se determinado medicamento, ou produto alimentício, ou químico, ou biológico, demonstra grave efeito no meio ambiente ou na saúde pública dos brasileiros, o Estado deve, por seus agentes de vigilância, atuar para, imediatamente, tornar a sua entrada no território nacional absolutamente proibida”.
“Não se exige autorização legal específica para essa determinada ação, porque o agente público tem, de antemão, o dever de apurar essa intercorrência de fazê-la cessar”, completa.
Assim, segundo a PGR, torna-se “absolutamente vazio o discurso de violação do artigo 5º, II, da Lei Maior”. Do mesmo modo, ela rejeita o argumento de intervenção pública desmedida na ordem econômica. “Afinal, bastaria objetar que nenhuma, absolutamente nenhuma, atividade humana pode ser exercida de maneira irrestrita. Os limites estão na consolidação de outros valores que não só a liberdade, pois, exercida esta em excesso, converte-se em abuso do outro”.
FK/LF