STF suspende julgamento de denúncia contra deputado Remi Trinta por fraude contra o SUS

15/10/2003 20:21 - Atualizado há 6 meses atrás

Um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa suspendeu o julgamento da denúncia oferecida em Inquérito (Inq 1968) pelo Ministério Público Federal (MPF) em face de suposta fraude contra o Sistema Único de Saúde (SUS) praticada pelo deputado federal Remi Trinta (PL/MA), um dos donos da Clínica Santa Luzia, em São Luiz (MA).


Segundo o MPF, as fraudes contra o SUS seriam enumeradas nas seguintes ações: adulteração de datas; grafias de controle semelhantes; prescrições e evoluções médicas e de enfermagem similares, utilizando-se o mesmo tipo gráfico; números de leitos de enfermagem iguais aos números de leitos da Unidade de Terapia Intensiva (UTI); cobrança de exames não realizados, entre outras. O MPF pediu a instauração de Ação Penal para que Trinta e seus sócios sejam processados e condenados por, supostamente, terem cometido crime de estelionato.


Conforme a denúncia da Procuradoria, as fraudes teriam alcançado cerca de R$ 700 mil apenas no ano de 1995. “Evidencia-se que Remy Abreu Trinta, Maria José Abreu Trinta e Nilson Santos Garcia, proprietários e administradores da Clínica Santa Luzia, beneficiaram-se diretamente desse esquema de fraudes que, por sua condição de administradores, não poderiam desconhecer, aproveitando-se das Autorizações de Internação Hospitalares (AIHs) falsas para buscar, junto ao Sistema Único de Saúde, pelo menos ao longo de 1995, o pagamento de serviços hospitalares indevidos”, argumentou o Ministério Público.


A defesa do deputado federal alegou atipicidade do fato criminal imputado, pois a participação de Remi Trinta estaria limitada à cobrança de faturas atrasadas, conforme reconhecido em decisão judicial. Sustentou, ainda, que a denúncia não conteria a configuração do crime de estelionato, ou seja, o efetivo prejuízo material, muito menos a configuração do crime de uso de documento falso. Por fim, alegou a incapacidade investigatória do Ministério Público Federal.


O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, em parecer, se pronunciou no sentido de que o crime de estelionato estaria devidamente qualificado na denúncia, pois a mesma apontaria as respectivas irregularidades e responsabilidade dos administradores da clínica. Quanto à capacidade investigatória do Ministério Público (MP), Fonteles expôs que “na visão do texto constitucional adotou, sem sombra de dúvida, o sistema acusatório, e acho que é o sistema que mais se coaduna com o Estado Democrático de Direito, em que as funções ficam bem destacadas e definidas”.


Apontou que a Constituição Federal confere, no texto do artigo 129, inciso I, a titularidade da investigação criminal, necessariamente precedente ao ato acusatório em juízo, exclusivamente ao MP. Ao final, opinou pelo recebimento da denúncia, por fato criminoso atribuído ao deputado federal e outros.


O ministro relator, Marco Aurélio, iniciou seu voto observando que “a premissa inafastável é de que este inquérito só apenas surgiu diante de investigação promovida pelo Ministério Público”. Firmou que o respaldo da denúncia sobre os indícios de autoria seria o que realmente foi apurado na investigação criminal realizada pelo Ministério Público, e não se teria nos autos outros elementos que pudessem embasar a denúncia.
 
Marco Aurélio manteve seu convencimento segundo o qual o inquérito criminal não  deveria ser realizado pelo Ministério Público, mas sim pela Polícia Federal, instituição competente – segundo o artigo 144, parágrafo 1º, inciso I, da CF – para apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas.
 
O ministro ressaltou o comando constitucional que distingue a titularidade da Ação Penal e a feitura de investigações para fundamentá-la. “Descabe concluir de forma diversa, sob pena de inversão da disciplina constitucional, potencializando-se o objetivo a ser alcançado em detrimento do meio. O inciso I do artigo 129 da Constituição Federal versa sobre a ação penal pública e com esta não se confunde fase que poderá ou não antecedê-la, ou seja, a do inquérito”, manifestou Marco Aurélio. Por fim, considerou insubsistente a denúncia apresentada, pois se basearia, exclusivamente, nos dados colhidos pelo inquérito implementado pelo Ministério Público, e a rejeitou.


O ministro Nelson Jobim adiantou seu voto, e considerou que o local para a manifestação do PGR seria no Congresso Nacional, onde, no momento da Constituinte, o Ministério Público intentou a possibilidade de produzir a investigação concorrentemente à autoridade policial, por ser titular da Ação Penal Pública. Porém, tal tentativa foi vedada pela Constituição Federal.


Ainda, Jobim observou que a denúncia pode ser ofertada pelo MP independente da instauração de inquérito criminal, desde que existam elementos suficientes a fundamentá-la. Ao contrário, poderá solicitar à Polícia a instauração de inquérito para apuração dos fatos. Ao final de seu voto, rejeitou a denúncia. Após os votos dos ministros Marco Aurélio e Nelson Jobim rejeitando a denúncia, pediu vista dos autos o ministro Joaquim Barbosa.



Ministro Marco Aurélio, relator do Inquérito (cópia em alta resolução)


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