STF realiza primeiro dia de audiência pública sobre vínculo empregatício entre motoristas de aplicativos e plataformas digitais
Relator do recurso em debate, ministro Edson Fachin destaca diálogo plural e democrático em sessão que reúne especialistas para embasar decisão._
O ministro Edson Fachin, vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), iniciou nesta segunda-feira (9/12) a audiência pública que trata da possibilidade de reconhecimento de vínculo empregatício entre motoristas de aplicativos de transporte e empresas que administram as plataformas digitais.
Foram ouvidos na manhã e na tarde desta segunda-feira 43 expositores. A audiência tem continuidade na terça-feira (10/12), das 9h às 12h, na sala de sessões da Primeira Turma do STF.
Ao concluir os trabalhos deste primeiro dia, o ministro Fachin destacou o consenso entre os expositores sobre a importância do tema e sua relevância social, humana e econômica. Segundo ele, também ficou nítido que há discordância em diversos campos, o que é essencial para orientar a decisão a ser tomada pelo STF.
Para o ministro, outro ponto importante foi o reconhecimento de que esses dissensos devem ser resolvidos de forma institucional, segundo as regras do Estado Democrático de Direito. O relator destacou que essa condição permite o reconhecimento de dos direitos legítimos das pessoas e um ambiente sadio de mercado para as empresas. “Fora da institucionalidade só há arbítrio, violência e barbárie”, concluiu.
O assunto em debate é objeto do Recurso Extraordinário (RE 1446336), apresentado pela Uber. A matéria teve repercussão geral reconhecida (Tema 1.291), cuja tese fixada no julgamento será aplicada a todos os casos em tramitação no Judiciário brasileiro.
Abertura
A mesa de abertura contou com a presença do presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Aloysio Corrêa da Veiga, que afirmou que o tema é desafiador e tem provocado uma intensa judicialização, gerando conflito na jurisprudência dos tribunais brasileiros. Para ele, é preciso regulamentar essa nova forma de trabalho para garantir segurança e evitar violação de direitos.
O representante da Procuradoria Geral da República, o subprocurador-geral Paulo Vasconcelos Jacobina, também presente, destacou a habilidade do relator, ministro Fachin, de formular perguntas essenciais como base para a construção da justiça, o que reflete o diálogo plural e a paciência no processo. Também mencionou a relevância de buscar soluções justas em um cenário de crise no emprego, o que reforça o compromisso com uma justiça inclusiva e construtiva.
Falando em nome da Advocacia-Geral da União (AGU), Lyvan Bispo dos Santos disse que a AGU já se manifestou nos autos no sentido de que essa relação de trabalho deve ser analisada de forma ampla e atual, sem a aplicação da CLT de forma literal e automática.
A audiência pública tem transmissão ao vivo na TV e na Rádio Justiça e, ainda, no canal do STF no YouTube.
RESUMOS DOS EXPOSITORES (manhã):
Carlos Alberto Grana, do Ministério do Trabalho e Emprego:
Destacou que os trabalhadores de aplicativos atuam numa categoria desregulamentada, sem proteção e com jornadas insanas. E defendeu o fim dessa situação, ressaltando a ausência de negociações coletivas e a recente organização do setor.
Benedito Brunca, do Ministério da Previdência Social:
Afirmou que a pasta conta um histórico de inclusão e proteção social. Disse ainda esperar pela regulação clara da matéria, a fim de que se possa garantir a proteção dos trabalhadores, alinhada à missão fundamental do órgão.
Tatiana Bianchini, da Defensoria Pública da União (DPU):
Argumentou que a falta de vínculo formal entre plataformas digitais e trabalhadores, aliada à ausência de regulamentação, resulta no descumprimento de direitos essenciais que garantem uma vida digna.
Renan Bernardi Kalil, do Ministério Público do Trabalho (MPT):
Falou da necessidade de se reconhecer a relação de emprego entre trabalhadores e empresas proprietárias de plataformas para evitar violação de direitos trabalhistas, além de destacar que se trata de sofisticado sistema de gestão de mão-de-obra.
André Gonçalves Zipperer, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil:
Apresentou dados levantados pela Universidade Federal do Paraná, os quais mostram que, das pouco mais de 1,5 mil plataformas digitais catalogadas até o final de 2023, praticamente metade atua no setor de transporte, cada uma com um modelo de negócio distinto. Para ele, essas diferenças exigem cautela na criação de precedentes e soluções universais, pois um único precedente pode não atender à diversidade das plataformas. Além disso, afirmou ainda não ter dúvida de que o caso em análise se trata de uma relação de trabalho.
Daniel Agrobom, da Frente Parlamentar em Defesa dos Motoristas e Motoentregadores por Aplicativos (FPMA):
O deputado federal defendeu que o fortalecimento da economia não se faz à custa da supressão de direitos, mas, sim, pelo incentivo à inovação e pela valorização do trabalho digno. Para ele, os trabalhadores autônomos devem ser valorizados e protegidos com leis justas, que assegurem sua proteção contra decisões arbitrárias das plataformas digitais.
Marcelo Manzano, do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp):
Argumentou que plataformas transferem riscos aos mais frágeis (famílias e trabalhadores). E defendeu que a regulação deve alcançar investidores e fundos de risco e sugeriu tributar seus altos ganhos para financiar direitos trabalhistas e a previdência social.
Leonel Augusto Gonçalves da Silva e Wallace Costa Landim, da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava):
Leonel defendeu a reestruturação dos serviços oferecidos pelas plataformas para assegurar uma remuneração mais justa e propôs ainda a criação de critérios de transparência, como uma tabela de custo mínimo por corrida e percentuais de descontos. Já Wallace, presidente da Abrava, destacou a necessidade de regulamentação e ressaltou que a falta de segurança nos ganhos e estabilidade no trabalho é uma grande preocupação para os motoristas.
Solimar Corrêa, do Sindicato de Motoristas de Transportes por Aplicativo do Estado do Pará (SindtApp):
Afirmou que os motoristas de aplicativos não possuem autonomia para o gerenciamento do trabalho. Disse ainda que a falta de reconhecimento de vínculo empregatício perpetuaria uma lógica que nega aos motoristas direitos mínimos, rebaixando-os a cidadãos de segunda categoria e distanciando-os da dignidade e da proteção.
Magda Barros Biavasch, da Associação Brasileia de Juristas pela Democracia (ABJD):
De acordo com ela, as decisões das cortes constitucionais europeias que reconhecem a condição de trabalhador nessas hipóteses têm influenciado positivamente acórdãos da justiça trabalhista brasileira. Disse ainda que retirar ou impedir direitos representaria retrocesso e prejudicaria gravemente o sistema público de proteção social ao trabalho.
José Eymard Loguercio, da Central Única dos Trabalhadores (CUT):
Defendeu que a falsa autonomia dos motoristas de aplicativos oculta a verdadeira relação de trabalho com as empresas. Para ele, esses trabalhadores precisam ser reconhecidos como tal, com direito à organização e negociação coletiva, e que as empresas devem ser responsabilizadas legalmente.
Leandro da Cruz Medeiros, do Sindicato dos Trabalhadores com Aplicativos de Transporte Terrestre Intermunicipal do Estado de São Paulo (StatteSP):
Destacou que os motoristas de aplicativos enfrentam riscos diários, como assaltos e acidentes. Segundo ele, as plataformas transferem esses riscos para a sociedade enquanto exploram os motoristas, sem oferecer proteção adequada e deixando-os desassistidos. Afirmou ainda que não há liberdade nem autonomia nesse trabalho, mas sim um controle total exercido pelas plataformas.
Antonio Escosteguy Castro, do Sindicato dos Motoristas de Transporte Privado Individual de Passageiros por Aplicativo do Rio Grande do Sul (Simtrapli-RS):
Para ele, os motoristas são substituídos sem direitos, enquanto a atividade promovida pelos aplicativos costuma ser a principal ou única fonte de sustento dos trabalhadores, condição que demostra a dependência econômica e a assimetria da relação.
Luciano Benetti Timm, da Associação Brasileira de Liberdade Econômica:
Para ele, a livre iniciativa é um princípio constitucional e um direito fundamental. Em sua avaliação, é necessário ter cautela com a intervenção estatal na economia.
Carlos Alberto Pereira de Castro, do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP):
Destacou que a relação entre motoristas de aplicativos e empresas não é meramente comercial, pois os motoristas veem as plataformas como o seu trabalho. Alertou ainda para a falta de contribuição dessas empresas à seguridade social, o que prejudica a cidadania e gera desigualdade no sistema.
Gustavo Ramos, da Associação dos Trabalhadores por Aplicativo do Distrito Federal:
Argumentou que a gestão algorítmica resulta na precarização da profissão. Abordou ainda fatores como jornadas extenuantes, baixos ganhos, falta de transparência nos cálculos de remuneração, além do aumento de acidentes, mortes e a violência contra motoristas.
André Gusthavo Martins Gomes Farias, do Sindicato dos servidores da Justiça do Trabalho do Paraná (Sinjutra):
Sugeriu que a lacuna jurídica do trabalho realizado por meio de plataformas digitais seja solucionada pela analogia com a norma dos trabalhadores avulsos. Para ele, a solução seria uma forma de garantir a igualdade de direitos sem vínculo de emprego formal, até que haja uma regulamentação específica para motoristas de aplicativos.
Mauro de Azevedo Menezes, da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra):
Disse caber à justiça do trabalho examinar as especificidades nos casos concretos, diferenciando tecnicamente a natureza da relação em cada hipótese. Argumentou ainda que o direito deve criar um ambiente normativo voltado ao desenvolvimento e não, simplesmente, beneficiar o poder econômico ou político.
André Porto, da Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia:
Para ele, a relação entre motoristas e entregadores com as plataformas não configura vínculo empregatício, uma vez que se trata de trabalhadores autônomos, sem subordinação e com liberdade para decidir quando e onde atuar. Defendeu também que o reconhecimento de vínculo resultaria em redução de postos de trabalho, diminuição da renda desses profissionais e aumento dos preços das corridas e entregas.
Fabiana Regina Siviero Sanovick, da 99 Tecnologia LTDA:
Defendeu que as plataformas operam em uma relação comercial, o que possibilita flexibilidade e autonomia aos motoristas, que pode escolher quais corridas aceitar e qual empresa usar. Para ela, a imposição de vínculo empregatício poderia prejudicar o modelo de negócio e o acesso ao transporte nas periferias.
Diego Barreto, da Agência de Restaurantes Online S.A. (iFood):
Segundo Diego, a plataforma não é uma empresa de logística, mas um ecossistema de conveniência que vai além dos restaurantes, incluindo benefícios como crédito para comerciantes. Também explicou que, embora os entregadores usem mochilas do iFood, muitos não atuam com por meio do aplicativo, trabalhando diretamente com os estabelecimentos. Segundo ele, a empresa acredita que é necessária a regulação da relação entre motoristas de carro e entregadores.
Paulo de Carvalho Yamamoto, da Federação Internacional dos Trabalhadores em Transporte (ITF) e a Rede Internacional de Advogadas e Advogados de Trabalhadoras e Trabalhadores (ILAW Network):
Afirmou que os trabalhadores não contam com liberdade real, pois as atividades são totalmente controladas pelas plataformas. Para ele, a liberdade proposta é, na verdade, a precarização da dignidade trabalhista, e defendeu que o Brasil tem a oportunidade de adotar melhores práticas internacionais para proteger o ordenamento jurídico.
RESUMOS DOS EXPOSITORES (tarde):
Paulo Roberto Guimarães, do Observatório Nacional de Segurança Viária e Veicular (ONSV):
Segundo ele, estudos científicos confirmam que o transporte por aplicativos interferiu de forma positiva na segurança viária do país. Um exemplo é a redução de 75% nas vítimas de acidente trânsito na faixa entre 18 e 24 anos (segmentou que passou a dirigir menos com a chegada de aplicativos). E defendeu que a regulamentação deve ter a segurança do passageiro como peça central.
Marilda de Paula Silveira, do Movimento Inovação Digital (MID):
A proteção do trabalho individual não pode ignorar a proteção do trabalho enquanto ecossistema. Para ela, diante da pluralidade dos contratos de intermediação de transportes, a proteção de um trabalhador pode representar a supressão de direitos de outros.
Tadeu Henrique Lopes da Cunha, da Associação Nacional de Procuradores do Trabalho (ANPT):
Afirmou que não há dúvida sobre a relação de emprego existente entre motoristas e empresas de transportes e reforçou a necessidade de que a decisão tomada pelo STF seja relacionada apenas ao Uber e não ao trabalho via plataformas digitais em geral, sob pena de igualar situações contratuais diferentes.
Nicolas Souza Santos, Aliança Nacional dos Entregadores por Aplicativos (ANEA):
Defendeu que é preciso afastar a ideia de que a previdência é a prioridade de todo trabalhador por aplicativos. Para ele, mais importante e urgente do que discutir o valor que as famílias de trabalhadores receberão após sua morte, é discutir prevenção, saúde e segurança do trabalhador, para que fatalidades não aconteçam. “Nosso acidente é de trabalho, e o estado está cego para isso”, disse.
André Luiz Queiroz Sturaro, vice-presidente da Associação Brasileira da Advocacia Trabalhista (Abrat):
Afirmou que a iniciativa à liberdade do trabalho proposta tanto pela Uber quanto por outras plataformas visa a continuidade da precarização das relações de trabalho, tendo como contrapartida a acumulação de capital e a concentração de renda, que causa um imenso fosso social na sociedade. “Essa precarização não é nova, mas se apresenta agora com uma faceta modernizada e mais agressiva”, disse.
Raquel Rodrigues Braga, da Associação Juízas e Juízes para a Democracia (AJD):
“A ameaça à democracia que paira no Brasil e no mundo também tem como alvo o direito do trabalho”, disse a juíza. Para ela, há um ataque deliberado às conquistas civilizatórias, entre elas às trabalhistas. “O que será dos trabalhadores de volta ao zero dos direitos tal qual o período inicial da industrialização?”, questionou.
Luiz Carlos Correa Albuquerque, do Sindicato dos Prestadores de Serviços por meio de APPs e Software para Dispositivos Eletrônicos do Rio de Janeiro e Região Metropolitana (SindMobi):
Chamou atenção para os riscos sofridos por profissionais que trabalham com transporte e entrega por aplicativos. Segundo ele, enquanto motoristas precisam apresentar uma série de documentos e antecedentes criminais para serem admitidos, os cadastros dos passageiros são extremamente frágeis. “Somos monitorados de forma rígida, mas quando precisamos da ajuda da empresa, ela se omite. Nos controla como empregados, e se esconde atrás da fraude ao nos chamar de parceiros comerciais para fugir de suas responsabilidades”, disse.
Gilderson Carlos Cavalcanti, presidente Sindicato dos Trabalhadores em Aplicativos de Transportes do Rio Grande do Norte (Sintat-RN):
Apontou a contradição do Brasil em tolerar que motoristas de aplicativo operem em condições extenuantes, de uma escala 7 por 0, enquanto o país debate sobre a modernização das relações de trabalho reconhecendo o impacto negativo que as jornadas 7 por 1 têm na saúde das pessoas. “Colecionamos histórias que revelam o preço alto que estamos pagando para trabalhar em condições de exploração, sem as condições necessárias para o mínimo plausível para a nossa dignidade”, afirmou.
André Luiz Figueira Cardoso, advogado do Sindicato dos Motoristas (SindMaap-DF) e do Sindicato dos Permissionários de Táxis e Motoristas Auxiliares do (DF – SINPETAXI):
Afirmou que a chamada uberização do trabalho é apenas uma forma contemporânea de nomear a escravização dos motoristas de aplicativo de transportes. “O curral é a verdadeira cara do modelo de negócios que aqui se debate. Não há parceira possível que não seja a que existe entre a cicatriz e o chicote,” disse. Sugeriu que o STF reconheça o mínimo que estabeleça a dignidade dos trabalhadores, independentemente do reconhecimento da relação de vínculo empregatício.
Raiati Gomes de Souza, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Motoristas de Aplicativos e Empresas de Tecnologia de Transportes de Passageiros no Estado de Rondônia (SindMapp-RO):
Explicou que as empresas líderes no mercado, como a Uber e a 99, estão predando empresas locais menores, que oferecem melhores condições de trabalho, mas perdem em competitividade. “Para o serviço local em Rondônia, há clínica de saúde para os motoristas, que também não pagam IPVA. Mas o que os líderes do mercado fazem é reduzir a tarifação inicial, gerando desequilíbrio,” disse.
Rodrigo Lopes da Silva Correia, presidente do Sindicato dos Entregadores e Motociclistas Autônomos de Pernambuco (Seambape) e da Associação de Motociclistas Autônomos de Pernambuco (Amappe):
Abordou a suposta coação que os motoristas de aplicativo sofrem pelas empresas. Apresentou na audiência e-mails que a Uber teria enviado a ele dizendo que eventuais cancelamentos podem suspendê-lo da plataforma. “Não há autonomia do motorista nem mesmo para cancelar as corridas.” Disse que não quer ter a carteira assinada, mas pede autonomia para controlar a jornada de trabalho e poder de escolher corridas.
Gilberto Almeida dos Santos, presidente do Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Mototaxistas do Estado de São Paulo (SindiMotoSP):
Disse que os motoristas e entregadores são controlados por um algoritmo, e não por pessoas físicas. “O algoritmo é muito pior que um chefe normal, porque ele é invisível, e nós não conseguimos falar com ele”, afirmou. Para ele, as empresas também operam para o sufocamento dos sindicatos laborais. Defendeu que a falta de regulamentação do trabalho dos motoristas de aplicativo está gerando uma epidemia de acidentados e mutilados que vêm superlotando os hospitais brasileiros e inundando o sistema público de saúde. “Os trabalhadores estão sendo empurrados para um mecanismo de morte.”
André Freire Vieira Reis presidente da Associação dos Motofretistas, Mototaxistas e Motoentregadores da Bahia (AMMM-BA):
Argumentou que, quando começam a trabalhar com os aplicativos, os motoristas têm uma sensação inicial de que estão ganhando dinheiro, mas que, com o tempo, essa sensação se dissipa diante da suscetibilidade a que os profissionais estão expostos quando, por exemplo, sofrem um acidente ou têm de arcar com danos em seus veículos. Disse também que, agora, o modelo de serviço está sendo usado pelo tráfico de drogas, sem nenhuma segurança para os colaboradores.
Edgar Francisco da Silva, presidente da Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil (AmaBR):
Questionou a autonomia defendida pelas empresas. Argumentou que ser autônomo é poder negociar o serviço e as condições de trabalho, e que isso não é possível na relação com os motoristas. Disse que, em 2017, as empregas pagavam de R$ 8,90 a R$ 19 por uma corrida mínima, mas que, hoje, esse valor caiu para R$ 6,50. “Nesses seis anos, o preço de tudo o que usamos subiu, menos o valor das corridas”, disse. Afirmou que, com a remuneração baixa, os motoristas perdem em qualidade de vida, não conseguem fazer a manutenção básica de seus veículos e trabalham em condições cada vez mais precárias. “Acidentes com prestadores de serviços de aplicativos estão sendo registrados como acidentes de trânsito comuns, e não como acidentes de trabalho”, explicou.
Luara Dias, advogada da Associação de Motofretistas Autônomos e Entregadores de Aplicativo do Distrito Federal e Entorno:
Segundo ela, a maior parte da receita de empresas como a Uber é proveniente do trabalho dos motoristas e motociclistas, o que demonstraria que sua atividade principal é o transporte, e não o fornecimento de tecnologia. Para Luara, isso demonstra que os conflitos entre essas empresas e trabalhadores deve ser resolvido pela Justiça do Trabalho.
Cezar Britto, advogado da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS):
Afirmou que a relação entre os aplicativos de transporte e entrega e os motoristas desrespeita as regras do trabalho digno. Segundo ele, não existe autonomia neste modelo de negócios, pois os trabalhadores nem mesmo podem discutir os percentuais que irão receber pelas corridas antecipadamente. Ele explicou que o trabalho digno pressupõe remuneração justa e jornada decente, o que não ocorre nessas relações.
Alexandre Vitorino Silva, diretor jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI):
Segundo ele, a relação entre empresas e motoristas é uma forma peculiar de trabalho que não configura vínculo empregatício. Vitorino afirmou que esse modelo de negócios revolucionou a mobilidade urbana, pois leva passageiros a locais nem sempre servidos pelo sistema de transporte. Também entende que, pela legislação atual, não há como configurar vínculo de subordinação, pois quem define o período de trabalho são os motoristas.
Ricardo Oliveira Godoi, assessor jurídico da Confederação Nacional de Serviços (CNS):
Para ele, as empresas oferecem autonomia aos motoristas e conveniência aos usuários. A discussão é sobre a chamada nova economia, e é necessário haver uma adequação às novas formas de negócios e relações interpessoais, devido a suas características de forte uso de tecnologia. Os aplicativos, em seu entendimento, fazem a intermediação entre motoristas e passageiros, possibilitando gerar renda com bens subutilizados. Afirmou que, entre outros benefícios, a redução do número de veículos privados diminui a poluição ambiental.
Mário de Conto, Confederação Nacional das Cooperativas (CNCoop):
O representante da CNCoop mostrou como funcionam as cooperativas de plataforma de intermediação de serviços, modelo no qual os trabalhadores definem o valor de seu trabalho. Como exemplo, ele citou a LigaCoop, que opera em cidades do Rio Grande do Sul, na qual motoristas têm participação nos resultados e nas decisões operacionais, oferecendo tarifas mais justas e com maior ganho nas corridas. Segundo ele, esse formato oferece preços mais justos para os usuários e, por ser local, valoriza a comunidade.
Luiz Carlos Garcia Galvão, pela Nova Central Sindical de Trabalhadores:
O representante sindical afirmou que não há autonomia na relação entre plataformas e trabalhadores, que são obrigados a seguir as ordens das empresas para garantir renda mínima. Segundo ele, as empresas, além de não oferecer amparo, forçam os motociclistas a trabalhar em jornadas exaustivas que colocam em riscos suas vidas e as de terceiros.
Solimar Corrêa, pela Central Força Sindical:
Ela afirmou que os trabalhadores vinculados às plataformas não vivem no que classificou como um “mundo encantado” pintado pelas empresas. Ela considera que os trabalhadores estão precarizados e não trabalham de forma autônoma, pois não têm escolha sobre a remuneração. Ela lembrou que decisões judiciais na França e na Espanha já reconheceram vínculo de emprego entre trabalhadores e plataformas ou os classificaram como categorias intermediárias. Segundo ela, essas experiências demonstram a possibilidade de regulamentar essas relações sem comprometer suas viabilidade e fazendo justiça social.
Francisco Canindé Pegado, secretário-geral da União Geral dos Trabalhadores (UGT):
Refutou as afirmações de que os motoristas prestariam serviços às plataformas de forma eventual e não continuada. Ele explicou que, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD), do IBGE, 778 mil trabalhadores afirmaram que têm como atividade principal o transporte de passageiros e que mais de 1,2 milhões estão vinculados às duas principais plataformas. Ele destacou a precariedade deste formato de trabalho, pois além de jornadas exaustivas, o motorista não está coberto pela previdência social quando se acidenta.
(Da redação do STF)
Confira imagens da audiência no Flickr do STF.