Roda de conversa do STF resgata memórias dos atentados de 8 de janeiro

Pessoas que atuaram no combate aos invasores e na reconstrução do edifício-sede relembram o que viveram. Ministros da Corte participaram do evento.

08/01/2025 21:11 - Atualizado há 8 horas atrás
Foto: Fellipe Sampaio /STF

8 de janeiro de 2023, 15h40: o prédio histórico do Supremo Tribunal Federal (STF) é invadido e depredado por golpistas. Dois anos depois, servidores e colaboradores que atuaram diretamente na segurança da Corte, na reconstrução das instalações e na restauração das obras destruídas se reuniram para compartilhar suas experiências e relatar o que testemunharam naquele dia que marcou a história recente do país. O encontro, realizado nesta quarta-feira (8/1) no STF, contou com a presença de ministros e integra as ações promovidas pelo Tribunal para lembrar os dois anos da data.

Abertura

Em sua fala no evento, o ministro Edson Fachin, vice-presidente no exercício da Presidência do STF, disse que “os atentados de 8 de janeiro foram a face visível de um movimento subterrâneo que articulava um golpe de Estado”. Em seu entendimento, os atos revelaram um triste sentimento antidemocrático, agravado pela intolerância e pela agressividade. “Relembrar esta data constitui um esforço para virarmos a página, mas sem arrancá-la da história”.

“O 8 de janeiro não é um simples fato pretérito, mas uma ferida aberta na sociedade brasileira”, afirmou o ministro Gilmar Mendes (decano) na abertura do encontro. Ele destacou a importância simbólica de manter a memória do episódio como forma de prevenir retrocessos e fortalecer a democracia. Mendes também defendeu a necessidade de se discutir reformas institucionais para que tentativas golpistas não voltem a acontecer.

Para o ministro Alexandre de Moraes, não houve uma manifestação livre, democrática, mas sim uma tentativa de golpe. “O sentimento de impunidade e a loucura total das redes sociais fez com que os próprios criminosos se filmassem praticando os crimes e postassem convocando novos criminosos a aderirem à tentativa de golpe. O golpe não ocorreu, as instituições democráticas reagiram”.

A ministra Cármen Lúcia, o ministro Cristiano Zanin e o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamin, também estiveram presentes.

Experiências

As pessoas que participaram da roda de conversa trabalham no Tribunal. De segunda a sexta, um deles pode ser visto comandando a equipe de carregadores. A outra cuida da limpeza. Uma é restauradora de obras históricas. O outro é responsável pela manutenção arquitetônica do edifício. Três trabalham na segurança. Independentemente de cargos e títulos, cada um se pôs à prova no dia dos ataques e nos meses que se seguiram para a sua reconstrução.

Barbárie

Rogério Viana, assessor da Secretaria de Segurança do STF, lembra que, naquela tarde, os golpistas não cederam a nenhuma investida dos agentes responsáveis por conter a invasão. “Em 30 anos de trabalho, eu nunca tinha visto nada parecido. Foi muito, muito rápido. Quando eles começaram a descer e romperam a barreira do Batalhão de Choque, eu percebi que algo de ruim ia acontecer”.

“Para mim todo o problema aconteceu quando abriram a Esplanada dos Ministérios e fizeram o acompanhamento com um número ínfimo de policiais para um número gigante de manifestantes”, disse o secretário de Segurança do STF, Marcelo Schettini. “Acho que gastamos todas as nossas granadas, todo o gás lacrimogêneo, todas as balas de borracha. Mesmo assim, o que se seguiu foi a barbárie”.

Fernando Souza, ex-gerente de Segurança Orgânica do STF que atuou no dia, lembrou do confronto com um dos golpistas no momento da invasão ao prédio do STF. “O que a gente viu aqui não sai da cabeça”, enfatizou. “Tentamos o máximo que deu”.

Reconstrução

Maria de Fátima Ribeiro, auxiliar de limpeza, não se esquece da dificuldade que enfrentou. “A gente trabalhou incansavelmente. Era dia, era tarde, a gente não tinha hora para parar. Mas conseguimos limpar em tempo e aprendemos muito com essa experiência, fortalecendo os valores democráticos da cooperação. O trabalho de cada um fez a diferença. É fundamental lembrar e valorizar esse esforço”.

Mesmo assim, depois que viu a dimensão da destruição, Hygor Araújo, coordenador de Arquitetura, Engenharia e Manutenção do STF, achou que não seria possível reconstruir o prédio em tempo hábil para o retorno das atividades do Judiciário naquele ano. “Comentei isso com a ministra Rosa Weber [então presidente do Supremo] e nunca esqueci da expressão dela: ‘O Supremo vai mostrar sua força, nós vamos reconstruir’, ela falou”.

Hygor disse que passou os dias seguintes praticamente morando no STF. A missão era recompor as dependências do edifício para a reabertura do ano judicial, a menos de um mês dali. “Passei aqui o carnaval todo e também a Semana Santa. Reconstruímos o primeiro andar, depois o segundo, o terceiro, junto com toda a nossa equipe”. 21 dias depois, o Plenário estava pronto para receber a primeira sessão do ano.  

Democracia

A restauradora Ivy da Silva lembrou que, apesar dos esforços coletivos, nem tudo foi possível recuperar. “Existem obras que são irrecuperáveis. Mas a gente tem como ética deixar à mostra os danos que a peça sofreu ou a intervenção que foi feita, justamente para que se conte a história do evento. E o nosso trabalho não acabou. É assim também com a democracia”, destacou.  

“Todos nós nos recordamos onde estávamos no dia 8 de janeiro de 2023”, disse a juíza Flávia Carvalho, ouvidora do STF. “Ainda que o Supremo tenha sido reconstruído, aquela lembrança de horror precisa voltar, para que aquele episódio nunca mais se repita. Que essa memória permaneça viva em nós, para que possamos nos manter defensores e defensoras da democracia”.

Salão Nobre

O bate-papo ocorreu no Salão Nobre, um dos espaços mais destruídos pelos invasores e que, hoje, está recomposto. Em sua decoração, há móveis e documentos históricos, além de bustos e presentes recebidos de autoridades estrangeiras, como um conjunto de porcelana chinesa que acabou estilhaçado.

(Gustavo Aguiar/AD//CF)

Veja aqui fotos do evento.

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