Regime militar: os anos difíceis do Supremo
O Supremo Tribunal Federal está há meio século instalado na Praça dos Três Poderes, o centro político da capital brasileira. À sua frente está o Palácio do Planalto, sede do Executivo. Recuado entre eles encontra-se o Congresso Nacional, sede do Legislativo. A praça foi projetada na forma de um triângulo perfeito, uma maneira de a geometria representar os freios e contrapesos que devem existir entre os três poderes da democracia brasileira.
Contudo, não se pode dizer que as relações do Supremo com seus vizinhos tenha sempre sido equilibrada e amistosa. Durante os anos em que os militares ocuparam o Palácio do Planalto, houve momentos de estremecimento entre o Executivo e o Supremo, ao ponto de, em 16 de janeiro 1969, três ministros serem aposentados à força e pela força do Ato Institucional 5 (AI 5).
Hermes Lima, Victor Nunes Leal e Evandro Lins e Silva eram considerados de esquerda pelos militares. Ao ouvirem o ato que os cassou – pela Voz do Brasil – outros dois ministros saíram por não concordarem com a aposentadoria compulsória: o então presidente da Corte, Gonçalves de Oliveira, e aquele que seria o seu sucessor na Presidência, Antônio Carlos Lafayette de Andrada.
“Subversivos”
Os três ministros retirados do Supremo tinham semelhanças: eram juristas, escritores, jornalistas e, sobretudo, políticos. Na década que precedeu o regime militar, eles circulavam no mais alto escalão da República, muitas vezes se revezando em cargos-chave, como de primeiro-ministro, chanceler e chefe da Casa Civil.
Tanto poder somado às ligações que os três tinham com a política anterior à era militar foi a razão maior das aposentadorias precoces. Victor Nunes, por exemplo, foi ministro da Casa Civil de Juscelino Kubitschek de 1956 a 1959.
Essa mesma cadeira foi ocupada em 1963 por Evandro Lins e Silva, já no governo de João Goulart. Entre os dois períodos, Hermes Lima ocupou um cargo também importante do Executivo: o de primeiro-ministro no regime parlamentarista (em 62 e 63, quando o cargo foi extinto). Neste mesmo ano, Evandro assumiu outro cargo deixado por Hermes Lima, o de chanceler do Brasil.
Hermes Lima e Evandro Lins e Silva são imortais da Academia Brasileira de Letras, e Victor Nunes Leal é o autor de uma obra que marcou a Ciência Política brasileira, chamada “Coronelismo, Enxada e Voto”.
O caso das chaves
Um episódio contado no livro “O Julgamento da Liberdade”, de Ézio Pires, demonstra o clima de intrigas entre o Planalto e o Supremo. O presidente da Corte em 1964, Álvaro Moutinho Ribeiro da Costa, teria dito ao general Castello Branco que, caso o Supremo sofresse repressão na consciência e julgamento dos magistrados, ele fecharia o Tribunal e entregaria as chaves na portaria do Palácio do Planalto.
Apesar da pressão constante dos militares sobre a Corte – inclusive na nomeação de novos ministros – não era interessante ao regime chegar ao ponto de fechá-lo, porque isso configuraria a ditadura na sua forma mais primitiva. Por isso, o Supremo permaneceu aberto, mas sob a extrema ingerência dos militares na vida da Corte.
Talvez a maior delas tenha sido a proibição de julgar habeas corpus pedido por autores de crimes políticos ou contrários à segurança nacional. Com isso, podia-se encobrir todas as violências do regime, institucionais ou mesmo físicas.
Anistia
Os resquícios dos chamados “Anos de Chumbo” ainda persistem. A Justiça analisa vários processos questionando decisões sobre a ditadura. Entre eles, destacam-se a quebra do sigilo dos documentos da ditadura e a revisão da Lei de Anistia (Lei nº 6.683/79), que perdoou os crimes políticos cometidos durante a ditadura.
A OAB defende a responsabilização criminal dos militares que praticaram tortura durante a ditadura. A entidade impetrou em outubro do ano passado a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 153 pedindo a revisão da Lei de Anistia.
O caso gerou polêmica dentro do Poder Executivo. A Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República e o Ministério da Justiça entendem que a anistia não abrange os crimes de tortura. A Advocacia Geral da União entende o contrário.
O pedido de revisão da Lei de Anistia está sendo analisado pelo Supremo. O relator é o ministro Eros Grau.
MG/LF//AM
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