Procuradoria-Geral da República defende a proibição da importação de pneus usados
O subprocurador-geral da República Mário José Gisi expôs os argumentos do Ministério Público Federal favoráveis à proibição da importação de pneus usados, na audiência pública promovida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para debater a questão.
“O assoreamento de rios por pneus usados é uma realidade. A emissão de gases na queima de pneus usados é uma realidade. A proliferação da dengue é uma realidade. Os altos lucros decorrentes da importação de pneus usados e, mesmo, os artifícios ilícitos para introdução, no país, de tais produtos, inclusive para se eximir de tributos respectivos, também é uma realidade”, advertiu o subprocurador-geral.
Ele elogiou a iniciativa da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha – relatora, no STF, de ação proposta pelo Presidente da República para cassar decisões judiciais que permitem a importação de pneus usados – de promover o evento, observando que ele “enriquece o conhecimento da matéria, especialmente em se tratando de um tema com o qual já estamos lidando há pelo menos 15 anos, desde a primeira instância”.
Preponderância do ambiental sobre o econômico
O subprocurador-geral valorou a iniciativa do governo federal de propor a ação em debate no STF e a convergência de opiniões sobre ela dentro do Executivo como algo raro. Criticou, por outro lado, a tendência daqueles que priorizam a economia em detrimento das questões ambientais.
“Tem havido, no governo federal, preponderância absoluta à questão econômica em detrimento da questão ambiental”, afirmou. Como exemplos, citou a “seqüência de usinas hidrelétricas que estão sendo feitas, sem nenhum cuidado na questão do zoneamento, do ordenamento territorial”.
Mário José Gisi observou que, “na verdade, parcela do governo federal, voltada para o crescimento econômico, não quer esse ordenamento territorial, não quer esse tipo de atitude que dê uma transparência maior para as ações que envolvem o conjunto de atividades próprias do Poder Executivo, para que se permita, com mais facilidade, a inserção do componente econômico, que é preponderante”.
Nesse contexto, ele registrou que o interesse do Paraná, defensor da importação de pneus e representado, na audiência, pelo presidente de seu Instituto Ambiental, “é mais do que tudo econômico, pois, no fundo, quer assegurar, além do emprego, o recolhimento de ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) que essa indústria de remoldagem, que é forte no estado, lhe proporciona”.
Cada um é responsável pelo lixo que produz
O subprocurador-geral defendeu o entendimento de que “cada um deve ser responsável pelo lixo que produz”. Ele manifestou sua esperança de que essa regra venha a se estender para quem utiliza garrafas pet, pneus, pilhas e baterias e, ainda, embalagens de agrotóxicos. “A regra há de se estender – e é o que se busca – para todos aqueles cujos produtos impliquem resíduos que prejudiquem o meio ambiente”, afirmou.
“A quebra desse princípio implica possibilidades ilimitadas, se formos observar o que vem por trás de uma eventual abertura dessas importações”, afirmou. Ele advertiu para a “grave e possivelmente insuperável situação ambiental futura” em decorrência de fatos como a importação de pneus usados.
Gisi afirmou que caso a importação de pneus usados seja permitida, a pretexto de ajudar os países em desenvolvimento, seria possível, também, pensar “que os lixos plásticos em geral podem igualmente vir a trazer benefícios de idêntica natureza, inclusive o lixo atômico. Por que não? Pois temos amplas áreas em nosso território, e certamente iremos beneficiar muita gente com dinheiro que ganharíamos, vendendo espaços e áreas para abrigarmos o lixo de países do primeiro mundo, que certamente vão ter muita alegria em pagar para nós recebermos esse material aqui, para gerarmos alguns empregos, algumas possibilidades de melhoria para o povo menos prestigiado deste país”.
Ao defender a proibição da importação de pneus usados, ele comparou essa atividade ao descaminho, que era tolerado com a atividade dos chamados “sacoleiros” que trazem produtos do Paraguai, sem o pagamento de impostos. “Lembro – porque trabalhei no Paraná – da luta de muitas pessoas, de fato carentes, que tinham o descaminho – o material que vinha de Foz do Iguaçu – como uma forma de vida, de vender, de sobreviver. Mas, infelizmente, teve de ser coibida, diante do contexto em que se posicionou o Brasil a respeito”, afirmou.
“Da mesma forma, vemos o drama dos países andinos, que precisam banir a produção de coca, embora seja uma das principais fontes de renda desses países”, observou.
Princípio constitucional
O subprocurador-geral lembrou que o artigo 170 da Constituição Federal, que trata da Ordem Econômica, inclui entre os princípios gerais da atividade econômica a defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme impacto ambiental, dos produtos e serviços e dos seus processos de elaboração e prestação.
“Na verdade, nós estamos falando de necessidades ilimitadas para recursos limitados”, disse o representante da Procuradoria-Geral da República, ao encerrar sua intervenção. “Nós, seres humanos, sempre gritamos para dar mais um passo nessa briga, que tem como principal vítima o meio ambiente, sem nos darmos conta de que estamos afundando juntos pela deterioração sistemática e acelerada do nosso patrimônio ambiental”.
FK/LF