Presidente do STF pede novo pacto por Brasil Republicano

Na entrevista coletiva concedida à imprensa na tarde desta terça-feira (1º), o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, falou sobre a “necessidade de um novo pacto pelo Poder Judiciário republicano, independente e célere”. Para ele, é preciso avançar e se pensar na organização do Estado como um todo.

01/07/2008 17:40 - Atualizado há 12 meses atrás

Na entrevista coletiva concedida à imprensa na tarde desta terça-feira (1º), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, disse que conversou recentemente com o presidente Lula sobre a “necessidade de um novo pacto pelo Poder Judiciário republicano, independente e célere”. A íntegra da coletiva pode ser ouvida no site da Rádio Justiça.

No entender do ministro, é preciso avançar e se pensar em um Brasil republicano, pensando na organização do Estado como um todo. Nesse sentido, o ministro defendeu a criação de uma nova lei contra abusos de autoridades. “Acho que nós deveríamos discutir isso de uma forma bastante aberta, porque já são notórios os abusos perpetrados”.

“Muitas vezes esses fatos [abusos de autoridades] são revelados, e depois ficam na memória apenas daqueles que são eventualmente prejudicados ou atingidos”. Gilmar Mendes enfatizou que o STF vai exigir do procurador-geral que dê maior atenção às representações contra autoridades. Às vezes, nem a PGR cuida dessas representações, talvez porque, de certa forma, a procuradoria se sinta, cúmplice ou conivente, salientou o ministro.

Atuação da PF

“É preciso encerrar com esse quadro de intimidação. É fundamental que o presidente da República, que o ministro da Justiça, que o diretor da Polícia Federal ponham cobro a esse tipo de situação. É abusivo o que se vem realizando. Não é possível instaurar no Brasil modelo de Estado policial. Repudiamos com toda veemência, e os senhores conhecem minha posição sobre isso. É chegada a hora do Brasil reinstitucionalizar essas relações”.

Essas foram algumas das expressões usadas por Gilmar Mendes para falar da atuação da Polícia Federal (PF). Para o ministro, esses episódios, como o que envolveu o nome do ex-presidente do STF Carlos Velloso, têm nítido caráter de retaliação, de “controle ideológico contra os juízes”. Seria preciso "seminário" para tratar da atuação da PF, disse o ministro.

Lembrando dos casos em que o nome ministro Sepúlveda Pertence – também aposentado e do seu próprio, todos no ano passado, teriam sido citados em conversas telefônicas interceptadas pela PF, o presidente do Supremo disse acreditar que as atuações da PF têm objetivo de retaliar a ação dos magistrados.

O ministro afirmou ter tomado conhecimento de que, no caso envolvendo seu nome no curso da Operação Navalha – que investigava supostos ilícitos da construtora Gautama, a ação foi projetada a partir da assessoria de imprensa da própria PF, que teria pedido aos órgãos de imprensa que divulgassem o fato.

Na época, Gilmar disse que chegou a conferir, em seu gabinete, se não recebera da Gautama uma gravata, uma folhinha ou um calendário. “Veja que cuidado a gente tem de ter. Que tipo de terrorismo lamentável, que coisa de gângster. Quem faz isso, na verdade, não é agente público, é gângster”.

Investigação contra parlamentares

“Tribunal existe para julgar, não para condenar”, disse o ministro Gilmar Mendes, ao responder pergunta sobre as os inquéritos e ações penais que tramitam no Supremo contra parlamentares e autoridades.

Um dos problemas, segundo Gilmar Mendes, é o fato de que, quando o parlamentar que responde a ação no STF perde a prerrogativa de foro – por não ser eleito ou reeleito, o processo vai para outra instância judicial. Depois, eleito prefeito, exemplificou Mendes, o processo vai para o TJ, depois eleito governador, vai para o STJ. É o que o ministro chamou de “ciranda do processo”. Isso tudo contribui para esse quadro de indefinição no entender do presidente do STF. Mas Gilmar Mendes foi enfático: estamos focados nesse tema, queremos dar prioridade ao julgamento das ações penais originárias.

Gilmar Mendes ressaltou, porém, que a imprensa deveria divulgar que o Tribunal tem julgado muitos casos de autoridades, rejeitando diversas denúncias apresentadas pelo procurador-geral da República. São denúncias ineptas, ou que apontam fatos que não correspondem a tipos penais, explicou o presidente.

Núcleo de Ações Penais

O ministro revelou que está criando, no STF, um Núcleo de Acompanhamento de Ações Penais originárias. A idéia, segundo Gilmar Mendes, é exatamente evitar que exista demora na tramitação dos processos, principalmente nas fases em que são “utilizados” juizes federais para auxiliar na instrução do processo, ouvindo réus e testemunhas. A ação penal do mensalão foi um exemplo disso, salientou. Houve um acompanhamento rigoroso, e os interrogatórios acabaram acontecendo de forma bastante célere, lembrou.

Sobre a questão do foro por prerrogativa de função, Gilmar Mendes disse que se o processo do Mensalão estivesse tramitando na 1º instância, talvez os prognósticos do relator, ministro Joaquim Barbosa – de que o julgamento deve acontecer por volta de 2011, deveriam ser multiplicados, talvez para 2028 – isso se já não estivessem prescritos todos os crimes.

Citando o caso do senador Ronaldo Cunha Lima, que renunciou para não ser condenado pelo STF, horas antes de seu julgamento, Gilmar Mendes defende que os inquéritos e ações devem tramitar na instância onde foram iniciados. No caso de Cunha Lima, como o crime aconteceu quando ele era governador, com a renúncia do parlamentar, a ação voltaria a tramitar no STJ.

Raposa Serra do Sol

Gilmar Mendes voltou a afirmar que a questão da demarcação da área indígena Raposa Serra do Sol é prioridade máxima do Supremo. O presidente disse que tem mantido contato com o relator das ações que discutem o tema, ministro Ayres Britto, para que seja possível analisar o tema já em agosto.

“Ficha Suja” de candidatos

“Não vejo com entusiasmo”. Essa a resposta do ministro sobre a possibilidade de se rejeitar candidaturas de pessoas que respondam a processos na Justiça. Gilmar Mendes ressaltou que, nos dias de hoje, é extremamente fácil se abrir um processo contra um adversário. Ele lembrou, ainda, que durante o regime militar houve uma lei que determinava que pessoas com condenações em duas instâncias eram inelegíveis. Mas essa norma já foi considerada inconstitucional pelo próprio TSE.

“Tenho horror a populismo, muito mais a populismo de índole judicial”. Gilmar Mendes disse que a criação desse tipo de lista pode levar a que se cometam injustiças. “E uma injustiça que se cometa já será suficiente para questionar esse procedimento”. Para o ministro, a sociedade é que deve se mobilizar, os partidos políticos devem fazer sua seleção. “E a imprensa que publique e assuma suas responsabilidades”.

Assalto em Fortaleza

“Na medida em que criminosos comuns se sentem tão livres, é a nossa liberdade que está em jogo”. Questionado sobre o assalto sofrido em Fortaleza no último domingo (29), o presidente do STF disse que a questão da segurança pública é, hoje, uma prioridade nacional. Mendes voltou a defender, inclusive, que não se deve “ideologizar” o debate sobre o uso – ou não, das Forças Armadas em determinadas situações. É preciso, sim, que haja uma coordenação entre governo federal e estadual, no sentido de acontecer uma ação conjunta. Para Gilmar Mendes, o importante é que se coloque em prática políticas públicas que possam reduzir drasticamente a criminalidade.

Créditos orçamentários

"O país deixou de ter um orçamento verdadeiro". Para Gilmar Mendes, o Brasil precisa de uma nova lei orçamentária. Boa parte dos escândalos que acontecem, hoje, estão “sediados nesse modelo de emenda parlamentar”, frisou. "Talvez devêssemos repensar urgentemente esse modelo", disse o ministro. Ele lembra que essa forma de orçamento já deu péssimos resultados, "e tem capacidade de produzir resultados ainda piores". De acordo com o ministro, o STF tentou dar uma resposta a isso, quando proferiu decisão sobre crédito extraordinário em matéria orçamentária, declarando que o presidente da República deve observar os requisitos constitucionais da urgência e da relevância para editar medidas provisórias para abertura desse tipo de crédito.  

Repercussão Geral

Antes de começar a responder as perguntas dos jornalistas, Gilmar Mendes fez um balanço geral sobre a atividade jurisdicional do STF no semestre. Ele deu destaque à Repercussão Geral, instituto que começou a ser aplicada mais intensamente a partir desse primeiro semestre.

Com a repercussão geral, “nós queremos fazer um julgamento responsável e bem informado. Mas, para isso, nós não precisamos nos pronunciar em 10 mil processos. Basta um caso, como qualquer corte constitucional digna do nome pode fazer”. O presidente disse que o Tribunal não está fugindo da sua responsabilidade de responder àss questões constitucionais relevantes. Apenas está trabalhando com métodos racionais e responsáveis.

Liberação das pesquisas com células-tronco, suspensão de partes da Lei de Imprensa e as sete súmulas vinculantes editadas neste ano foram as principais decisões lembradas por Gilmar Mendes, que aconteceram no primeiro semestre.

Outro trabalho realizado neste semestre, e que Gilmar Mendes ressaltou que pretende intensificar no próximo semestre, é no sentido de ampliar a articulação entre o Supremo Tribunal Federal e os demais tribunais. “O sucesso desse modelo da repercussão geral depende, necessariamente, do bom entendimento com os demais tribunais”. O presidente explicou que o Supremo precisa saber que processos – envolvendo matérias constitucionais importantes, aguardam julgamento nos diversos tribunais.

MB/EH

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