Pedido de vista suspende o julgamento de ADI que contesta lei paraense que desmembrou município

15/03/2007 18:54 - Atualizado há 12 meses atrás

O ministro Gilmar Mendes pediu vista da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3689, proposta pelo PMDB ao Supremo Tribunal Federal (STF) para declarar inconstitucional a Lei nº 6.066/97, do Estado do Pará. Essa norma autorizou o desmembramento político, geográfico e econômico de parte do município de Água Azul do Norte, integrando-a ao município de Ourilândia do Norte.

Entenda o caso

De acordo com o texto da lei questionada, todos os bens imóveis existentes na área incorporada, passam ao domínio de Ourilândia do Norte, assim como os funcionários públicos de água Azul do Norte, que exerçam atividades na área incorporada, passam a integrar o quadro de pessoal do município incorporador.

O Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) alega ofensa ao artigo 18, parágrafo 4º da Constituição Federal. Alega que a incorporação das áreas ao município ocorreu sem que a lei complementar federal, a que se refere o artigo 18, parágrafo 4º da Constituição, fosse promulgada. Assim, para o partido, enquanto não existir legislação complementar federal “fixando os critérios gerais em que devem basear-se os Estados Membros, qualquer alteração em municípios está constitucionalmente proibida”.

Sustenta ainda o impetrante que a manifestação em plebiscito, somente da população da área a ser incorporada, fere o inciso 4º, do artigo 18, da Constituição da República. Esse mandamento constitucional estabelece, como requisito para o desmembramento, consulta prévia às populações de ambos os municípios diretamente interessados no processo de desmembramento e incorporação e não só da população da área envolvida na disputa intermunicipal.

O relatório de Eros Grau

Quando a ação foi ajuizada, o ministro Eros Grau, relator da ação, não deferiu medida cautelar considerando a relevância do caso, afetando o julgamento ao plenário para que a decisão fosse de caráter definitivo.

Hoje (15), ao julgar a ação improcedente, o relator lembrou o histórico da região onde se localizam os municípios, cuja origem se deu nas décadas de 1970 e 80, quando o governo Federal ali implantou o Projeto Tucumã que, segundo o prefeito de Ourilândia do Norte, visava ocupar a Amazônia por colonizadores vindos do sul do Brasil, possuidores de recursos financeiros. Para o prefeito, “os demais retirantes de outros lugares do País, atraídos pela propaganda de terras férteis e de baixo custo que não foram absorvidos pelo projeto, deram origem à Vila Gurita”, cujas terras se tornaram o município de Ourilândia do Norte, tornando-se vizinho de Água Azul do Norte.

No entanto, continua a narrativa do prefeito, os habitantes da região limítrofe hoje em litígio, “continuaram a suprir suas necessidades no município de Ourilândia, embora estivessem situados formalmente em Água Azul”. Esses moradores uniram-se e deram início ao movimento de alteração da divisa territorial, “levando-se em consideração a divisa histórica, cultural e social que estava bem delimitada pelos costumes e tradições”, ou seja, legitimada pela luta da convivência histórica e social. Essa legitimação se deu também porque houve a continuidade do atendimento das necessidades básicas da população, por parte de Ourilândia, desde o princípio até hoje, conclui o prefeito municipal de Ourilândia do Norte.

O voto

Para o ministro Eros Grau, “o processo legislativo de que resultou a Lei paraense, iniciou-se ao tempo da redação original do parágrafo 4º, do artigo 18 da Constituição do Brasil”, a publicação, em agosto de 1997, no entanto, é posterior à Emenda Constitucional nº 15/96. O ministro revelou que “o território em questão dista da sede do município de Água Azul do Norte, mais de 90 quilômetros, razão pela qual pareceu razoável aos moradores postularem a incorporação da faixa de terra, ao município de Ourilândia, do qual está distante apenas 12 quilômetros”. Para o ministro a lei atacada pela ADI somente positivou situação de fato preexistente, os cidadãos residentes naquela gleba distante 90 km do município ao qual pertenciam formalmente, “requereram a agregação do território ao município que supria as necessidades da população”.

Ao votar pela improcedência da ação, o ministro Eros Grau, declarou que “essa Corte não pode se limitar a prática de um mero exercício de subsunção (aplicação da lei), cumpre consideramos prudentemente a circunstância de aqui estarmos diante de uma situação de exceção e as conseqüências perniciosas que adviriam de eventual declaração de inconstitucionalidade da lei estadual”. Para o relator, o território em questão está efetivamente integrado ao município de Ourilândia, com o exercício de atos próprios ao município, tais como participação em eleições regulares, arrecadação de tributos, presta serviços públicos, exerce poder de polícia, celebrados casamentos e registrados nascimentos e óbitos. A realidade é decorrente de uma decisão política consolidada.

O relator alertou o Plenário que os interessados na declaração de inconstitucionalidade da lei poderiam a ter pleiteado “já há nove anos, não o fizeram, fazem-no agora, posteriormente à confirmação da localização de uma reserva de níquel no local”. Em face do princípio da segurança jurídica, Eros Grau reafirmou sua posição no sentido da preservação da gleba no município de Ourilândia do Norte, lembrando jurisprudência da Corte no Mandado de Segurança 24268, quando esse princípio foi aplicado de forma exemplar. Para o ministro este é uma situação excepcional, “não prevista pelo direito positivo, porém instalada pela força normativa dos fatos”.

Ao concluir seu entendimento, Eros Grau afirmou que neste caso “esta Corte não há de proceder como o legista que examina um corpo morto – a infração à letra escrita da constituição – aqui estamos diante de uma realidade política de modificação dos limites de um ente político da Federação, cumpre verificarmos o que, no caso, menos compromete a força normativa futura da Constituição e sua função de estabilização. O que menos a sacrifica, a agressão à regra do parágrafo 4º, do artigo 18, ou a violação do princípio federativo?”

O julgamento foi suspenso pelo pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, com quem se encontra um caso semelhante ao presente (ADI 2240).

IN/LF


Ministro Eros Grau, relator. (cópia em alta resolução)

Leia mais:

17/03/2006 – PMDB pede suspensão de lei que alterou limites municipais no Pará

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