Pedido de vista adia julgamento de HC envolvendo direito de recorrer em liberdade
Um pedido de vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito interrompeu, nesta quarta-feira (9), o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), do Habeas Corpus (HC) 84078, em que o agricultor mineiro Omar Vítor Coelho, condenado à pena de reclusão de sete anos e seis meses por tentativa de homicídio qualificado, pleiteia o direito de recorrer em liberdade de sua sentença condenatória, já confirmada em segunda instância. O crime está previsto no artigo 121, parágrafo 2º, inciso IV, combinado com o artigo 14, inciso II, do Código Penal, com atenuantes previstas no artigo 65.
No HC, a defesa contesta decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de negar pedido semelhante. O tribunal fundamentou a decisão ao argumento de que, de acordo com a Lei nº 8.038/90, o Recurso Especial (REsp) interposto no próprio STJ contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), que confirmou a sentença condenatória e mandou expedir ordem de prisão contra o agricultor, não tem o efeito de suspender o cumprimento da pena sentenciada.
O pedido de vista foi formulado depois que o relator do processo, ministro Eros Grau, votou pela manutenção do réu em liberdade. Ele defendeu a tese de que a prisão, antes do julgamento de todos os recursos cabíveis, ofenderia frontalmente o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição, que dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Menezes Direito justificou seu pedido de vista argumentando que, recentemente, ao julgar o HC 90645, a Primeira Turma do STF decidiu em sentido contrário ao voto hoje proferido por Eros Grau. O ministro argumentou que precisava refletir mais sobre o assunto, antes de proferir seu voto no processo.
O processo chegou no STF em março de 2004, tendo como relator o ministro Nelson Jobim (aposentado) que, inicialmente, negou a liminar requerida e, posteriormente, voltou atrás para concedê-la. A decisão inicial foi tomada ante a informação de que o agricultor estaria realizando leilão de gado leiteiro e máquinas agrícolas, o que indicaria seu intuito de evadir-se para se furtar ao cumprimento da pena. Entretanto, investimentos posteriores dele mostraram que ele apenas mudara de ramo, mantendo sua antiga residência. Ainda em 2004, Eros Grau substituiu Jobim na relatoria do processo.
Em seu voto em favor da liberdade do réu, enquanto sua sentença condenatória não tiver transitado em julgado, o ministro Eros Grau criticou a Lei 8.038/90 (segundo a o RE e o REsp não têm caráter suspensivo), taxando-a de reacionária e criticou, também, o impulso punitivo que motivou a edição desta e de outras normas legais.
Ele defendeu a isonomia de tratamento para quem está ameaçado de ter restringida a sua liberdade com os casos de ameaça de restrição de direitos, sustentando que, neste segundo caso, menos grave que o primeiro, nunca a sentença é executada antes do seu trânsito em julgado. “E, se esta é vedada antes do trânsito em julgado, com muito mais razão o deve ser a privativa de liberdade antes da condenação definitiva”, sustentou.
Neste contexto, ele criticou a atitude de certa imprensa, “que lincha e considera culpados a todos, até prova em contrário”, numa inversão de princípios. “É preciso cuidado nos momentos de desvario, sob pena de retornarmos ao “olho por olho, dente por dente”, advertiu.
Ainda segundo Eros Grau, a Constituição, em seu artigo 5º, LVII, garante que nem lei nem juiz podem determinar a execução da pena antes do trânsito em julgado. Caso contrário, segundo ele, “é melhor sairmos com um porrete na mão, a arrebentar a espinha de quem nos contrariar”.
“A prisão só pode ser decretada a título cautelar, nos casos de prisão em flagrante, prisão temporária ou preventiva”, sustentou Eros Grau, opinando que a prisão durante a apelação é até um cerceamento do direito de defesa.
FK/LF
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