Pedido de vista adia julgamento da ADI contra MP do setor elétrico

04/02/2004 20:37 - Atualizado há 6 meses atrás


Pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa suspendeu o julgamento das liminares requeridas nas Ações Diretas de Constitucionalidade (ADIs 3090 e 3100) ajuizadas contra a Medida Provisória 144, editada em 10/12/2003, que definiu o modelo do setor elétrico brasileiro. As ADIs foram ajuizadas, respectivamente, pelos Partidos da Social Democracia Brasileira (PSDB) e da Frente Liberal (PFL).


O ministro Gilmar Mendes, relator das ADIS, observou que na ADI 3090 o PSDB buscou demonstrar a relação entre o modelo de setor elétrico e o quadro constitucional anterior e posterior à Emenda Constitucional nº 6.


O Partido argumenta que qualquer alteração normativa na legislação configuraria regulamentação do parágrafo 1º do artigo 176 da Constituição Federal, conforme o entendimento firmado pelo STF na ADI 2005. O PSDB aponta a violação, pela MP 144, dos princípios constitucionais federativo, da defesa do consumidor, do ato jurídico perfeito e ao princípio da reserva legal.


O PSDB alegou, ainda, a ausência de relevância e urgência para a edição da Medida Provisória impugnada e pediu a declaração da inconstitucionalidade dos artigos 1º a 21 da Medida Provisória nº 144, de 10 de dezembro de 2003.


Na ADI 3100, ajuizada pelo PFL, o ministro relator Gilmar Mendes observou que o objeto da Ação também é a integralidade da MP 144/2003. Os argumentos do PFL se aproximam das impugnações feitas na ADI 3090.


 


O PFL alegou a inconstitucionalidade da MP 144, na parte em que promove alterações na disciplina do Operador Nacional do Sistema Elétrico (NOS), na parte em que extingue o Mercado Atacadista de Energia Elétrica (MAE), e na parte em que impõe o uso da arbitragem para a solução de conflitos. Pediu, por fim, o efeito vinculante da decisão proferida na ADI 2005.


 


O advogado Admar Gonzaga, que falou em nome do PFL, citou a similaridade da medida em julgamento com a MP nº 1.819, editada pelo governo FHC em 1999, com o objetivo de alterar a legislação que disciplinava o setor elétrico. Tal MP teve sua eficácia suspensa na ADI 2005 pelo STF.


 


O advogado argumentou que a MP 144 promove alteração da competência da Aneel, da mesma forma que pretendia a MP 1.819, e que não houve mudança na Constituição Federal que justifique mudança na interpretação do STF.


 


Gonzaga rebateu o artigo 1o da MP, dizendo que a delegação de competência legislativa ao governo, prevista no texto, só é possível por meio de resolução do Congresso Nacional, conforme o artigo 68 da Constituição. Citou, ainda, que a sucessão do Mercado Atacadista de Energia (MAE) pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, como dispõe a MP, corresponde à extinção do MAE. Como associação civil sem fins lucrativos, alega que a mesma não pode ser extinta por lei, pois afronta o artigo 5o, inciso XIX, da Constituição Federal.


 


O advogado citou como flagrante inconstitucionalidade a interferência do governo no Operador Nacional do Sistema (ONS) ao definir colegiado, mandato e indicação de diretores, pois o ONS trata-se de pessoa jurídica de direito privado, contrariando o artigo 5o. Concluiu que “este julgamento é um marco que definirá o grau de interferência que o Estado e o governo poderão exercer na iniciativa privada”.


 


O advogado-geral da União, Álvaro Augusto Ribeiro Costa, ao sustentar o posicionamento da União, observou que a MP 144 está em tramitação no Congresso e já foi aprovada pela Câmara, com juízo positivo a respeito de sua constitucionalidade. Frisou que os problemas trazidos pelo “apagão” seriam suficientes para justificar a urgência das determinações da medida.


 


Sobre a tese de que a MP fere o artigo 246 da Constituição, que proíbe o uso de medida provisória para regulamentar artigo alterado por emenda constitucional, Ribeiro Costa alegou que essa interpretação não procederia, pois a EC nº 6 alterou apenas o artigo 176, parágrafo 1º, sobre o conceito de empresa estrangeira – o que não diz respeito à MP 144.


 


O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, ao opinar nas ADIs, observou que essas cautelares são medidas excepcionais, supondo urgência e risco de dano à segurança jurídica. Para o representante do Ministério Público Federal (MPF) os argumentos da excepcional urgência e dano da situação jurídica não caberiam neste momento, pois na circunstância não haveria possibilidade de dano, nem excepcional urgência, por razões claras e óbvias. “Uma das razões da convocação extraordinária do Parlamento brasileiro foi discutir exatamente esse tema”, afirmou o procurador-geral.


 


Segundo Fonteles, a Câmara dos Deputados aprovou a MP 144 durante a convocação extraordinária e já se encontra sob exame do Senado, podendo ser convertida em lei nas próximas semanas. Assim, para o representante do MPF não haveria o preenchimento dos pressupostos de urgência e risco de dano à segurança jurídica para a concessão das liminares, e finalizou opinando pelo indeferimento da liminar.


 


O ministro Gilmar Mendes, ao proferir seu voto, observou que a alegação de ofensa ao artigo 246 pela MP 144 é procedente, em conformidade com a jurisprudência do STF firmada no julgamento da ADI 2473, da relatoria do ministro Néri da Silveira.


 


De acordo com Mendes, o julgamento da ADI 2473 foi mais preciso e claro, pois definiu que as medidas provisórias que versassem sobre o setor elétrico não poderiam estipular normas sobre a energia obtida através de potenciais hidráulicos. “Tenho como aplicável ao caso, todavia, o precedente da ADI 2473, uma vez que considero mais consentâneo com a regra do artigo 176, parágrafo 1º, da Constituição na redação da Emenda 6, em sua conjugação com o artigo 246”, afirmou Mendes.


O relator ponderou que a alteração feita pela EC nº 6 no setor elétrico brasileiro foi substancial, pois antes o setor elétrico era baseado na intervenção estatal e passou a ser voltado ao investimento privado e às regras de mercado, com uma atuação do Estado em posição de agente regulador.


“Assim, considerando os precedentes firmados pela Corte nas ADI’s 2005 e 2473, e considerando que o artigo 176, parágrafo 1º, da Constituição, foi objeto de substantiva alteração pela Emenda Constitucional nº 6, de 15 de agosto de 1995, tenho como aplicável ao caso a restrição do art. 246”, afirmou Mendes.


 


Sobre o alegado excesso no exercício do poder regulamentar, Mendes ponderou que não haveria dúvida de que os limites do poder regulamentar assume extraordinária relevância em sistemas que, tal como o brasileiro, restringem a delegação de poderes. A delegação de poderes feita pela MP 144 transfere ao Executivo a possibilidade de editar regulamento não só em relação às matérias ali expressamente descritas, mas também em relação a “outras matérias”, tornando-se uma cláusula de delegação em aberto. O ministro considerou que, nessa liminar “que a integralidade do artigo 1º é ofensiva ao princípio constitucional da legalidade, expresso nos artigos 5º, inciso II;e 84, IV, e à reserva legal especificamente prevista no artigo 175 da Constituição”.


Sobre a questão invocada do artigo 2º, o ministro Gilmar Mendes observou que também há uma delegação ampla ao Poder Executivo, sem que o legislador tenha fixado em lei qualquer decisão que permita controle quanto eventuais excessos no exercício do poder regulamentar.


“Esse é o teste, senhores ministros, que estamos obrigados a fazer na análise de delegações legislativas como estas. Quando não for possível vislumbrar qualquer parâmetro legal para controle da atividade regulamentar, permitindo uma liberdade absoluta nas opções do Executivo, restará evidente um quadro de delegação em branco”, afirmou Mendes.


O ministro deixou assentada a plausibilidade da alegação de inconstitucionalidade do artigo 2º, pois há inclusive disciplina da comercialização da energia de Itaipu, o que foi especificamente objeto de suspensão no julgamento da ADI 2005, por ofensa ao artigo 246.


 


Quanto às considerações específicas sobre a proporcionalidade do artigo 7º da MP 144, o ministro o considerou sob a perspectiva do princípio da proporcionalidade, referindo-se à parte daquele artigo que dá nova redação ao artigo 10 da Lei no 8.631/93. Para Mendes, também é duvidosa a constitucionalidade do dispositivo sob a perspectiva do princípio da proporcionalidade, tendo em vista suas três máximas parciais, a saber, a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.


 


 O ministro Gilmar Mendes, ao concluir seu voto, deferiu parcialmente as liminares requeridas pelos partidos nas ADIs 3090 e 3100. As liminares são no sentido de conferir à íntegra dos dispositivos da MP 144/03 interpretação conforme a Constituição, para afastar sua incidência em relação a qualquer atividade relacionada à exploração do potencial hidráulico para fins de produção de energia, considerada a restrição do artigo 246 da Constituição Federal. E suspendem a vigência dos artigos 1º, 2º e do 7º da MP/144, na parte em que este último dá nova redação ao art. 10 da Lei no 8.631/93. E indeferiu as liminares quanto aos demais dispositivos. Por fim, o ministro Joaquim Barbosa pediu vista das Ações.


 


#CG/RR//AM




Ministro Gilmar, relator das ADI (cópia em alta resolução)

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