Para STF, imunidade não exclui aplicação da CLT a empregados de representações estrangeiras no Brasil (republicação)
O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, negou seguimento a um Recurso Extraordinário (RE 222368) do Consulado Geral do Japão que tentava modificar uma decisão da Justiça Trabalhista favorável à lavadeira Iracy Ribeiro de Lima.
A empregada, hoje já falecida, havia prestado serviços à representação do Consulado no Recife entre 1975 e 1990, tendo sido demitida sem justa causa. Iracy deixou de receber o pagamento das verbas rescisórias, tais como multa, férias atrasadas e décimo-terceiro salário. Também não houve baixa em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social. Durante o processamento da reclamação trabalhista, o Consulado nunca se preocupou em contestar as alegações da lavadeira, alegando sempre a imunidade de jurisdição.
A decisão do ministro-relator, Celso de Mello, está de acordo com a jurisprudência mais recente da corte, após o advento da Constituição de 1988, sendo o terceiro julgado nesse sentido. A nova interpretação leva em conta a evolução do direito internacional, segundo a qual a imunidade de jurisdição dos estados estrangeiros não é absoluta quando se trata de questões meramente privadas e, especialmente quanto a direitos trabalhistas.
“Situações como a constante destes autos legitimam a plena submissão de qualquer Estado estrangeiro à jurisdição doméstica do Poder Judiciário nacional”, afirmou o ministro, em sua decisão. Segundo ele, o particular tem direito legítimo ao ressarcimento por prejuízos que venha a sofrer por comportamento ilícito dos agentes diplomáticos na esfera privada de negócios jurídicos tais como contratos de natureza trabalhista, mercantil, empresarial ou civil. É inviável que se imponha aos brasileiros ou residentes em território nacional o dever de litigar em tribunais estrangeiros quando se tratar dessas matérias.
Por outro lado, o ministro Celso de Mello deixou claro que essa decisão refere-se à imunidade de jurisdição, não se estendendo à execução da sentença, pois esta é uma prerrogativa mais abrangente. Os estados estrangeiros só se submetem à execução forçada quando renunciam à intangibilidade de seus bens ou quando houver bens, que embora pertençam a esses Estados, não estejam diretamente relacionados às atividades-fim das legações diplomáticas ou representações consulares.
O relator não conheceu do recurso do Consulado do Japão por entender que não houve ofensa direta à Constituição Federal, uma premissa do Recurso Extraordinário. O ministro ainda destacou em sua ementa: “Privilégios diplomáticos não podem ser invocados, em processos trabalhistas, para coonestar o enriquecimento sem causa de Estados estrangeiros, em injusto detrimento de trabalhadores residentes em território brasileiro, sob pena de essa prática consagrar inaceitável desvio ético-jurídico, incompatível com o princípio da boa-fé e com os grandes postulados do direito internacional”.
Ministro Celso de Mello, relator do Recurso Extraordinário (cópia em alta resolução)