Para MPF, nas Eleições 2010 incidem regras de inelegibilidade da Ficha Limpa
Em nome do Ministério Público Federal (MPF), o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pediu o desprovimento do Recurso Extraordinário (RE) 633703, no qual se discute a constitucionalidade da chamada Lei da Ficha Limpa e sua aplicação nas eleições realizadas em 2010. Autor do recurso, Leonídio Henrique Correa Bouças questiona a Lei da Ficha Limpa, uma vez que com base nela teve seu registro negado ao cargo de deputado estadual em Minas Gerais.
Segundo Gurgel, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais condenou Leonídio por improbidade administrativa, determinando o ressarcimento do dano, a perda da função pública de deputado estadual, a suspensão dos direitos políticos por seis anos e oito meses e a proibição de contratar com o poder público ou receber incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de cinco anos. À época dos fatos, ele era secretário municipal de serviços urbanos.
Portanto, conforme o procurador-geral, o candidato se enquadra perfeitamente na inelegibilidade inscrita no artigo 1º, inciso I, alínea “L” da Lei Complementar nº 64/90, com redação da LC 135, diante da condenação à suspensão dos direitos políticos “em decisão proferida por órgão judicial colegiado por ato doloso de improbidade administrativa que importou lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito”.
Reflexos sociais
Roberto Gurgel lembrou que, em dois julgamentos anteriores, o Supremo já examinou a aplicação da Lei Complementar nº 135/10 – conhecida como Lei da Ficha Limpa – nas Eleições de 2010. Isso ocorreu nos recursos interpostos por Joaquim Roriz e Jader Barbalho. “Naquelas oportunidades, destaquei que nas últimas décadas, como é notório, a frequência tristemente enorme de um variado festival de improbidades e outras mazelas envolvendo o chamado mundo político fez com que a sociedade, em grande parte, se desencantasse dos políticos e da própria política”, disse.
Conforme ele, o pano de fundo submetido à apreciação do Supremo é a valorização do político e a “óbvia importância fundamental no Estado Democrático de Direito da atividade política”. O procurador-geral reiterou que a decisão a ser proferida pela Corte “trará inevitáveis reflexos na forma como a sociedade brasileira vê o político e a atividade política”.
A LC 135, segundo Gurgel, assegura uma escolha de representante “investida de dignidade mínima para o exercício do mandato”. Para ele, a norma está dirigida a todas as candidaturas sem distinção entre candidatos ou partidos políticos, “não havendo a quebra de igualdade que é precisamente o valor protegido pelo artigo 16, da Constituição da República”.
O procurador-geral assinalou que, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 354, o Supremo entendeu que o princípio da anualidade refere-se apenas ao aspecto instrumental do direito eleitoral e que, no julgamento do RE 129392, a Corte assentou a inaplicabilidade deste princípio à vigência imediata da Lei das Inelegibilidades, rejeitando a arguição de constitucionalidade da LC 64/90. “Fica, portanto, claro que as normas que trazem alteração nos critérios que definem as hipóteses de inelegibilidade não se identificam como de processo eleitoral, sendo, ao revés, de natureza material ou até constitucional como explicitado no precedente, deixando de incidir, portanto, o óbice do artigo 16, da Constituição Federal”, afirmou.
Edição da LC x convenções
Quanto ao argumento da defesa de ofensa ao princípio da presunção de inocência, a Procuradoria entendeu que este princípio dirige-se à proteção na esfera penal. Em relação a outra alegação apontada, Gurgel afirmou que a norma foi editada antes mesmo da realização das convenções e está sendo aplicada a registros de candidatura posteriores a sua vigência, “não havendo que se perquirir de nenhum agravamento, pois a causa de inelegibilidade incide sobre a situação do candidato no momento do registro da candidatura”.
O procurador-geral disse que o MP continua convencido do acerto da orientação firmada pelo Tribunal Superior Eleitoral e pelo STF quanto à questão. De acordo com ele, “a higidez do entendimento majoritário do TSE conforta a Procuradoria-Geral da República na medida em que consubstancia orientação fincada em fundamentos jurídicos extremamente sólidos e não no clamor popular como se pretende afirmar para desqualificar aqueles que sustentam tal posição que reverencia a Constituição, o Estado Democrático de Direito e a República”.
Regime democrático
Por fim, Roberto Gurgel reiterou a afirmação de que o Ministério Público talvez não tenha tido, desde o advento da Constituição de 1988, “oportunidade igual de tão concretamente atuar no cumprimento da missão constitucional de defesa do regime democrático”.
EC/CG