Painel discute resquícios da censura militar no “Seminário 30 anos Sem Censura”
O painel, presidido pelo presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Domingos Meirelles, teve como tema “Novas e Velhas Formas de Censura?”
O jornalista Domingos Meirelles, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), foi o coordenador do painel “Novas e Velhas Formas de Censura?”, realizado na tarde desta segunda-feira (11) no Seminário 30 Anos Sem Censura. O encontro é promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Supremo Tribunal Federal.
Segundo Meirelles, a censura se manifesta de diversas formas ao longo da história nos seus componentes político, econômico, religioso e moral e, em todos esses momentos, esteve intimamente ligada ao poder. “A censura é uma grande roda gigante que vai adquirindo movimento e expressões de acordo com o ângulo em que se observa o fenômeno”, disse.
Liberdade de expressão
A representante da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Judith Brito, destacou que, embora a ditadura militar e a censura sejam página virada na história do país, a imprensa ainda convive com resquícios desse sistema, em especial com as censuras prévias determinadas por decisões judiciais
Segundo Judith, tanto a Constituição Federal quanto o Supremo, ao interpretá-la, já assentaram que o interesse público se sobrepõe ao individual. “Ninguém pode proibir ninguém de dizer o que quer que seja”, afirmou. “Não é possível proibir previamente a divulgação de informações, no pressuposto de que elas poderão ser mentirosas ou caluniosas”.
Para a jornalista, erros e injustiças que possam ocorrer por meio da atuação da imprensa representam “mal menor diante do grande equívoco de se institucionalizar a censura prévia, mesmo que apenas pela via judicial”. Judith Brito citou o caso Watergate como exemplo emblemático em que o interesse público se sobrepôs aos interesses individuais e resultou em informações relevantes para a sociedade.
Ainda de acordo com a painelista, as reações às chamadas “fake news” são novas formas de censura. Para ela, com as novas formas digitais e o uso massivo das redes sociais, as notícias falsas são usadas como justificativa para tentar restringir a liberdade de expressão. “Notícias falsas devem ser debatidas com mais informação, nunca com menos”.
Novas formas de censura
Para a advogada Tais Gasparian, a censura atualmente se apresenta de outras formas: pelo embaraço, constrangimento, coação e violência simbólica. “A censura se tornou mais difusa e disfarçada”, disse.
De acordo com a advogada, isso se dá com a intersecção de três pontos: a responsabilização do jornalista, que, por ser alvo, passa a se autocensurar; o valor das indenizações, incoerentes e sem limites; e o prazo para a propositura de processo, que prescreve em três anos, período em que o profissional pode ser acionado na justiça pela publicação de notícia supostamente ofensiva.
Tais destacou que uma das mais perigosas ofensas atuais à liberdade de imprensa é a violação do sigilo da fonte determinada por decisões judiciais. A advogada explicou que a proteção constitucional ao sigilo da fonte não é para o jornalista, mas para a população. “Se não for preservada, a fonte não vai mais fornecer informações”, explicou.
Outra forma de ofensa à liberdade de informação é o direito ao esquecimento. Para Gasparian, informações, mesmo erradas, não devem ser apagadas como se nunca tivessem existido. “O que se deve fazer é corrigir a informação preservando-se o arquivo original”, afirmou.
Velha censura
A jornalista Helena Chagas destacou em sua participação no painel a preocupação com o momento pelo qual a democracia representativa está passando no mundo e, em especial, no Brasil. “No momento de polarização política que estamos passando, encontramos pessoas defendendo intervenção militar de maneira a desvalorizar coisas que conquistamos a duras penas, como a liberdade de imprensa e a redemocratização”, disse. Para ela, é função do jornalista revelar à sociedade o que foi a ditadura e a censura de estado sofrida pela imprensa.
Helena destacou ainda que o amplo acesso a informações e o poder digital de vigiar revestiriam a censura, nos dias atuais, de aspecto mais danoso que o utilizado na ditadura militar.
Imprensa
O jornalista Carlos Lindenberg relatou uma série de absurdos cometidos pela censura na época em que trabalhava no jornal O Estado de Minas. Segundo ele, a censura não é tema fácil de ser documentado, uma vez que a maior de suas marcas é a ausência de informações.
Lindenberg mostrou preocupação com o que chamou de erros na atuação da imprensa atualmente. Um deles seria o vazamento de informações sigilosas que deturpam a compreensão correta dos fatos pela opinião pública. “O jornalismo perdeu uma de suas qualidades essenciais, que é a apuração. O jornalista, de um modo geral, deixou de apurar o que chega facilmente em suas mãos”, disse.
O "Seminário 30 anos Sem Censura" é promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
SP/CF