Ministros aposentados relembram a implantação da repercussão geral no STF
Ellen Gracie presidia a Corte quando houve a regulamentação do instituto, e Sepúlveda Pertence foi relator do caso em que foi fixado o marco temporal para aplicação do filtro processual.
Previsto na Reforma do Judiciário (Emenda Constitucional 45/2004), o instituto da repercussão geral só veio a ser regulamentado no final de 2006 pela Lei 11.418/2006. No Supremo, foi implantado em 2007, na gestão da ministra Ellen Gracie na Presidência. Hoje, 15 anos depois, ela lembra o desafio de implantar o mecanismo que viria a ter o maior impacto no passivo de processos na Corte, que, na época, era de 150 mil ações, e de convencer colegas que não eram afeitos a modernidades tecnológicas.
Foram os técnicos do próprio Supremo que desenvolveram um sistema deliberativo, onde o processo era lançado, seguido de uma breve argumentação, para avaliar a relevância da matéria, considerando os requisitos da repercussão geral. O Plenário tinha, então, 20 dias para se manifestar. O sistema computava os votos, e os resultados eram informados aos tribunais estaduais e federais para que processos semelhantes fossem sobrestados. “Foi necessária uma série de tratativas e muita conversa para chegarmos ao convencimento de que aquela seria a melhor solução”, relembra Ellen Gracie. Ao final da sua gestão, em 2008, o passivo de processos no STF havia caído 60%.
Para a ministra aposentada, a forma como o STF lidou com a comunicação aos tribunais foi decisiva para esse resultado. “Se o Supremo tivesse se mantido isolado, apenas cuidando da sua jurisdição ou do seu passivo, teríamos criado uma avalanche de casos que subiriam para depois voltar, em prejuízo do jurisdicionado”, explica.
Ellen Gracie alerta para a necessidade de que o julgamento de um recurso cuja repercussão geral tenha sido reconhecida não demore. “É preciso julgar o mérito, para dar vazão a milhares de casos que dizem respeito à tese jurídica firmada”, afirmou. Para ela, o instituto tem efeito positivo principalmente sobre matérias tributárias e previdenciárias. Matérias criminais e de família, a seu ver, têm muitas especificidades que não comportam esse tipo de solução.
Marco temporal
Segundo as regras da repercussão geral, somente processos que contestam decisões colegiadas anteriores a 3/5/2007 podem chegar ao STF sem a preliminar desse instituto. Os recursos extraordinários contra decisões posteriores têm de conter um capítulo à parte com argumentos defendendo a existência da repercussão geral no tema em discussão. Caso contrário, os pedidos são automaticamente rejeitados.
O ministro Sepúlveda Pertence foi o relator da questão de ordem no Agravo de Instrumento (AI) 664567, em que a Corte estabeleceu os requisitos para a utilização efetiva da ferramenta de filtragem processual, fixando esse marco temporal. Pertence lembra que analisou a então novidade pelas lentes do ministro Victor Nunes Leal, que, já na década de 1960, defendeu a adoção de um instituto semelhante, ao qual chamou de “arguição de relevância”, mas não teve sucesso na sua implantação.
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