Marco Aurélio concede habeas corpus a condenados por castração de menores em Altamira

15/12/2004 18:51 - Atualizado há 12 meses atrás

O ministro do Supremo Marco Aurélio concedeu liminares, em habeas corpus, ao médico Anísio Ferreira de Sousa (HC 85222) e ao comerciante Amailton Madeira Gomes (HC 85223), dois dos quatro condenados por seqüestro, emasculação (castração) e assassinato de menores em Altamira (PA), entre 1989 e 1992. Com a decisão, eles poderão aguardar, em liberdade, o julgamento dos recursos de apelação que tramitam na 15ª Vara Penal-Tribunal do Júri de Belém, contra as sentenças condenatórias.


Anísio Ferreira de Sousa e Amailton Madeira Gomes solicitaram a extensão da liminar deferida ao médico Césio Flávio Caldas Brandão (HC 85179) pelo ministro Marco Aurélio, no final de novembro. As prisões preventivas foram decretadas pelo presidente do Tribunal do Júri, com base no fato de os réus residirem em Estados diferentes do local do julgamento. Césio Brandão mora no Espírito Santo; Anísio de Sousa, em Goiás; e Amailton Gomes, no Ceará.


Nas decisões liminares, proferidas no dia 10 de dezembro, Marco Aurélio destacou que Anísio Ferreira e Amailton Gomes, assim como Césio Brandão, são réus primários, têm bons antecedentes e estão presos há mais de um ano. Afirmou que a circunstância de os condenados viverem em unidades da Federação diversas daquela em que foram julgados não é motivo para ensejar, por si só, a custódia, “afigurando-se o recolhimento como execução precoce, açodada, temporã do título judicial, sujeito ainda a modificação, em face da recorribilidade ordinária”.


“Pouco importa a gravidade das imputações. Quanto maior, mais há de se ter zelo na observância dos preceitos viabilizadores da defesa, do texto constitucional, a encerrar o princípio da não-culpabilidade, até que se tenha a culpa formada, e esta pressupõe a imutabilidade da decisão condenatória”, observou o ministro. “O barulho da turba, a repercussão dos acontecimentos na sociedade, na mídia, não podem servir à execução precoce da pena”, asseverou.


SI/FV


Leia mais:
02/12/2004 – 20:50 – STF defere liminar para condenado por participação em caso de emasculados de Altamira (PA)

07/12/2004 – 16:42 – Outros condenados por castração de menores em Altamira recorrem ao STF



Ministro Marco Aurélio é o relator do habeas  (cópia em alta resolução)



Leia, abaixo, a íntegra das decisões do ministro:







HABEAS CORPUS 85.222-0 PARÁ


 

























RELATOR


:


MIN. MARCO AURÉLIO


PACIENTE(S)


:


ANÍSIO FERREIRA DE SOUSA OU ANÍZIO FERREIRA DE SOUZA OU ANÍSIO FERREIRA DE SOUZA


IMPETRANTE(S)


:


JÂNIO ROCHA DE SIQUEIRA


COATOR(A/S)(ES)


:


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA


 


 


 


 


 


DECISÃO


 


 


PROCESSO – CONDENAÇÃO – RECURSO – SUBMISSÃO À CUSTÓDIA DO ESTADO – DOMICÍLIO FORA DO LOCAL DO DISTRITO DA CULPA – IMPROPRIEDADE – LIMINAR DEFERIDA A CO-RÉU EM IDÊNTICA SITUAÇÃO – EXTENSÃO.


 


 


1.          A inicial de folha 2 a 9 revela brado contra o que se tem como o maior erro judiciário da Justiça brasileira. Eis um resumo da peça: a) o paciente, brasileiro, casado, médico, tendo dois filhos, estudantes universitários, também do curso de Medicina, acha-se sob a custódia do Estado, sendo co-réu no Processo nº 2002.2.027206-3 da 15ª Vara Penal – Tribunal do Júri, Comarca de Belém – do Estado do Pará; b) condenado, interpôs apelação; todavia, prolatada a sentença condenatória, fora-lhe inviabilizada a permanência em liberdade, enquanto tramita a apelação, em vista do fato de possuir domicílio fora do distrito da culpa – em Goiás, para onde se transferira; c) havendo respondido ao processo em liberdade, assim se mantivera por mais de 8 anos, até a realização do Júri, sempre atendendo aos chamamentos do Judiciário; d) fazendo-se alusão ao relatório da Superintendência da Polícia Civil do Maranhão, Inquérito nº 003/2004, sustenta-se que a condenação imposta implicou erro judiciário, vindo a ser descoberto aquele que seria o maior serial killer da criminologia brasileira e, quiçá, do mundo – o mecânico de bicicletas Francisco das Chagas Rodrigues de Brito; e) até mesmo pedido de prisão preventiva deixara de ser acolhido em relação ao citado mecânico, que confessou os crimes, tudo a revelar a cegueira da Justiça local; f) sem encontrar-se eco na Justiça do Estado, apelou-se para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, que realizou audiências públicas nas quais deixaram de comparecer o Superintendente da Polícia Federal no Pará e a Promotora de Justiça que atuara no Júri bem como o Juiz-Presidente deste último.


 


          Então, requer-se a concessão de medida acauteladora, a viabilizar a soltura do paciente, tal como ocorreu com o co-réu Césio Flávio Caldas Brandão, considerado o Habeas Corpus nº 85.179-7/PA, ressaltando-se que a prisão preventiva do paciente foi revogada por decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Pará em setembro de 1995. Salienta-se que o paciente respondeu ao processo em liberdade, comparecendo pontualmente aos atos, jamais adotando postura contrária à tramitação regular do processo. Inicialmente, tal como os outros co-réus, inclusive o do habeas referido, fora impronunciado, modificando-se o quadro por decisão do Tribunal de Justiça. Assevera-se a primariedade e os bons antecedentes do paciente, como registrados em sentença, estando já sob a custódia do Estado há mais de ano.


 


2.          Reitero o que consignei no Habeas Corpus nº 85.179-7/PA, fazendo-o a partir da premissa de vivermos em uma Federação integrada por Estados e Municípios, consoante dispõe o artigo 1º da Carta da República. A premissa da preventiva não encontra base no arcabouço normativo. A circunstância de o condenado viver em unidade da Federação diversa daquela em que julgado não é de molde a ensejar, por si só, a custódia, afigurando-se o recolhimento como execução precoce, açodada, temporã do título judicial, sujeito ainda a modificação, em face da recorribilidade ordinária. Nas informações prestadas ao Tribunal de Justiça, para efeitos de apreciação do primeiro habeas corpus impetrado, o Presidente do Tribunal do Júri assentou que decretara a prisão, impedindo que o condenado aguardasse solto o julgamento da apelação, ante o fato de o ora paciente residir em Estado diferente daquele do distrito da culpa, ou seja, no caso, no Estado de Goiás. O fundamento da prisão, ao primeiro lance de olhos, não se mostrou idôneo, discrepando das balizas legais. Trata-se de réu primário, sem antecedentes criminais, profissional da Medicina. A rigor, criou-se pressuposto de recorribilidade, isto é, o recolhimento à cadeia pública, infringindo-se até mesmo a norma extravagante do artigo 594 do Código de Processo Penal, documento que data do Estado Novo. Da leitura de tal dispositivo e do artigo 312 do mesmo diploma, depreende-se que a prisão esdrúxula não tem lugar quando se cuida de sentenciado primário e de bons antecedentes. Pouco importa a gravidade das imputações. Quanto maior, mais há de se ter zelo na observância dos preceitos viabilizadores da defesa, do texto constitucional, a encerrar o princípio da não-culpabilidade, até que se tenha a culpa formada, e esta pressupõe a imutabilidade da decisão condenatória. Também não conta com envergadura capaz de conduzir ao imediato recolhimento do condenado a pena imposta, por maior que esta seja. O barulho da turba, a repercussão dos acontecimentos na sociedade, na mídia, não podem servir à execução precoce da pena. Cabe atentar para a organicidade e dinâmica próprias ao Direito, para o princípio da não-culpabilidade, no que encerra a necessária preclusão do decreto condenatório, a imutabilidade na via recursal, a formação, portanto, da culpa.


 


3.          Defiro a medida acauteladora. Expeça-se alvará de soltura, a ser cumprido com as cautelas próprias, ou seja, caso o paciente não esteja submetido à custódia do Estado por motivo diverso do retratado na ata de julgamento do Processo nº 2002.2.027206-3, do 3º Tribunal do Júri da Capital – Juízo de Direito da 15º Vara Penal.


 


4.          Estando neste processo as peças indispensáveis ao julgamento do pedido de concessão de ordem, voltado a assegurar a liberdade do paciente até o julgamento da apelação interposta, colha-se o parecer da Procuradoria Geral da República.


 


5.          Publique-se.


 


Brasília, 10 de dezembro de 2004.


 


 


 


 


 


Ministro MARCO AURÉLIO


Relator


 







HABEAS CORPUS 85.223-8 PARÁ


 

























RELATOR


:


MIN. MARCO AURÉLIO


PACIENTE(S)


:


AMAILTON MADEIRA GOMES


IMPETRANTE(S)


:


JÂNIO ROCHA DE SIQUEIRA


COATOR(A/S)(ES)


:


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA


 


 


 


 


 


DECISÃO


 


 


PROCESSO – CONDENAÇÃO – RECURSO – SUBMISSÃO À CUSTÓDIA DO ESTADO – DOMICÍLIO FORA DO LOCAL DO DISTRITO DA CULPA – IMPROPRIEDADE – LIMINAR DEFERIDA A CO-RÉU EM IDÊNTICA SITUAÇÃO – EXTENSÃO.


 


 


1.          Este habeas tem inicial subscrita pelo mesmo profissional da advocacia – Doutor Jânio Siqueira – que firmou a do Habeas Corpus nº 85.222-0/PA. Valho-me da síntese procedida no citado habeas, considerado o fato de se tratar de co-réus e o pleito – tal como consignado no anterior, fazendo-se referência ao Habeas Corpus nº 85.179-7/PA – de extensão da ordem, esclarecendo que aqui não se cuida de profissional da Medicina, mas de comerciante:


 


 


1. A inicial de folha 2 a 9 revela brado contra o que se tem como o maior erro judiciário da Justiça brasileira. Eis um resumo da peça: a) o paciente, brasileiro, casado, médico, tendo dois filhos, estudantes universitários, também do curso de Medicina, acha-se sob a custódia do Estado, sendo co-réu no Processo nº 2002.2.027206-3 da 15ª Vara Penal – Tribunal do Júri, Comarca de Belém – do Estado do Pará; b) condenado, interpôs apelação; todavia, prolatada a sentença condenatória, fora-lhe inviabilizada a permanência em liberdade, enquanto tramita a apelação, em vista do fato de possuir domicílio fora do distrito da culpa – em Goiás, para onde se transferira; c) havendo respondido ao processo em liberdade, assim se mantivera por mais de 8 anos, até a realização do Júri, sempre atendendo aos chamamentos do Judiciário; d) fazendo-se alusão ao relatório da Superintendência da Polícia Civil do Maranhão, Inquérito nº 003/2004, sustenta-se que a condenação imposta implicou erro judiciário, vindo a ser descoberto aquele que seria o maior serial killer da criminologia brasileira e, quiçá, do mundo – o mecânico de bicicletas Francisco das Chagas Rodrigues de Brito; e) até mesmo pedido de prisão preventiva deixara de ser acolhido em relação ao citado mecânico, que confessou os crimes, tudo a revelar a cegueira da Justiça local; f) sem encontrar-se eco na Justiça do Estado, apelou-se para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, que realizou audiências públicas nas quais deixaram de comparecer o Superintendente da Polícia Federal no Pará e a Promotora de Justiça que atuara no Júri bem como o Juiz-Presidente deste último.


 


Então, requer-se a concessão de medida acauteladora, a viabilizar a soltura do paciente, tal como ocorreu com o co-réu Césio Flávio Caldas Brandão, considerado o Habeas Corpus nº 85.179-7/PA, ressaltando-se que a prisão preventiva do paciente foi revogada por decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Pará em setembro de 1995. Salienta-se que o paciente respondeu ao processo em liberdade, comparecendo pontualmente aos atos, jamais adotando postura contrária à tramitação regular do processo. Inicialmente, tal como os outros co-réus, inclusive o do habeas referido, fora impronunciado, modificando-se o quadro por decisão do Tribunal de Justiça. Assevera-se a primariedade e os bons antecedentes do paciente, como registrados em sentença, estando já sob a custódia do Estado há mais de ano.


 


2.          A situação é assemelhada – afastada a identidade, diante da qualificação do paciente e do local de domicílio, já aqui, não o Estado do Espírito Santo (paciente do Habeas nº 85.179-7), não o Estado de Goiás (paciente do Habeas nº 85.222-0/PA), mas o Estado do Ceará. Eis o que consignei, ao deferir a medida acauteladora no Habeas Corpus nº 85.222-0/PA:


 


2. Reitero o que consignei no Habeas Corpus nº 85.179-7/PA, fazendo-o a partir da premissa de vivermos em uma Federação integrada por Estados e Municípios, consoante dispõe o artigo 1º da Carta da República. A premissa da preventiva não encontra base no arcabouço normativo. A circunstância de o condenado viver em unidade da Federação diversa daquela em que julgado não é de molde a ensejar, por si só, a custódia, afigurando-se o recolhimento como execução precoce, açodada, temporã do título judicial, sujeito ainda a modificação, em face da recorribilidade ordinária. Nas informações prestadas ao Tribunal de Justiça, para efeitos de apreciação do primeiro habeas corpus impetrado, o Presidente do Tribunal do Júri assentou que decretara a prisão, impedindo que o condenado aguardasse solto o julgamento da apelação, ante o fato de o ora paciente residir em Estado diferente daquele do distrito da culpa, ou seja, no caso, no Estado de Goiás. O fundamento da prisão, ao primeiro lance de olhos, não se mostrou idôneo, discrepando das balizas legais. Trata-se de réu primário, sem antecedentes criminais, profissional da Medicina. A rigor, criou-se pressuposto de recorribilidade, isto é, o recolhimento à cadeia pública, infringindo-se até mesmo a norma extravagante do artigo 594 do Código de Processo Penal, documento que data do Estado Novo. Da leitura de tal dispositivo e do artigo 312 do mesmo diploma, depreende-se que a prisão esdrúxula não tem lugar quando se cuida de sentenciado primário e de bons antecedentes. Pouco importa a gravidade das imputações. Quanto maior, mais há de se ter zelo na observância dos preceitos viabilizadores da defesa, do texto constitucional, a encerrar o princípio da não-culpabilidade, até que se tenha a culpa formada, e esta pressupõe a imutabilidade da decisão condenatória. Também não conta com envergadura capaz de conduzir ao imediato recolhimento do condenado a pena imposta, por maior que esta seja. O barulho da turba, a repercussão dos acontecimentos na sociedade, na mídia, não podem servir à execução precoce da pena. Cabe atentar para a organicidade e dinâmica próprias ao Direito, para o princípio da não-culpabilidade, no que encerra a necessária preclusão do decreto condenatório, a imutabilidade na via recursal, a formação, portanto, da culpa.


 


 


3.          Defiro a medida liminar. Expeça-se o alvará de soltura, a ser cumprido com as cautelas próprias, ou seja, caso o paciente não esteja submetido à custódia do Estado por motivo diverso do retratado na ata de julgamento do Processo nº 2002.2.027.206-3, do 3º Tribunal do Júri da Capital – Juízo de Direito da 15º Vara Penal.


 


4.          Estando no processo as peças indispensáveis ao julgamento do pedido de concessão de ordem, visando a assegurar ao paciente a liberdade, até apreciação do recurso interposto para julgamento pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará, colha-se o parecer da Procuradoria Geral da República.


 


5.          Publique-se.


 


Brasília, 10 de dezembro de 2004.


Ministro MARCO AURÉLIO


Relator


 


 


 



 

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