Leia a íntegra do discurso do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a abertura do Ano Judiciário de 2005
Vivemos um momento singular na história da nação. A consciência de que é necessário prosseguir com as reformas necessárias para a conquista da justiça social está presente em diversos setores da sociedade civil e do Estado.
Para que tais reformas sejam efetivadas, aprofundando cada vez mais as instituições democráticas no nosso país, é preciso manter um diálogo constante e produtivo.
É exatamente por esse motivo que fiz questão de aceitar o convite do presidente da Suprema Corte, o ministro Nelson Jobim, de vir até aqui participar da abertura do Ano Judiciário.
Não estou cumprindo uma mera formalidade. Estou, isto sim, reconhecendo a importância da relação harmoniosa e produtiva que existe entre os Poderes da República. Relação que só foi conquistada graças ao fato de termos em comum os ideais de justiça social e a consciência de nossa responsabilidade no grande processo que está mudando a nação. O Poder Judiciário tem um papel fundamental nessas mudanças.
No dia 8 de dezembro do ano passado, após 12 anos de tramitação, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 45, mais conhecida como a Reforma do Poder Judiciário.
Trata-se da alteração mais profunda realizada na estrutura do Poder Judiciário, desde que a Constituição de 1988 entrou em vigor.
Essa reforma não nasceu de nenhuma iniciativa individual. Não é uma proposta inteiramente do governo, dos juízes nem dos advogados. É, sim, um projeto democrático, cuja paternidade deve ser atribuída a todos que participaram do longo processo de tramitação legislativa, aos parlamentares diretamente envolvidos, ao conjunto dos operadores do Direito e às suas associações de classe.
É o resultado do amadurecimento que nosso país alcançou. É, também, o fruto do reconhecimento pela sociedade, e pelo próprio Judiciário, de que este Poder precisa se modernizar.
São evidentes as inovações que fazem parte do novo texto constitucional. Dentre elas destacam-se a criação do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, a súmula vinculante, a autonomia das defensorias públicas e a quarentena para que o juiz ou promotor afastado não possa advogar perante o tribunal no qual exercia suas funções pelo prazo de 3 anos.
A Reforma também contempla a federalização dos crimes contra direitos humanos, a ampliação da competência da Justiça do Trabalho, a exigência de período mínimo de atividade jurídica para os candidatos às carreiras de juiz e promotor e o fim das férias coletivas nos órgãos judiciais.
Devemos reconhecer, no entanto, que os avanços obtidos com a promulgação da emenda constitucional não esgotam, por si, a Reforma do Judiciário. Outros passos precisam ser dados para a construção de um sistema judicial mais transparente, democrático, acessível à população e adequado ao nosso tempo, acompanhando, assim, a demanda social por um sistema mais justo.
Por essa razão, no dia 15 de dezembro, uma semana após a promulgação da reforma constitucional, nos reunimos, os chefes dos três Poderes, o ministro Nelson Jobim, o senador José Sarney, eu, e juntos, assinamos o “Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano”. Naquele ato assumimos o compromisso público de unir nossos melhores esforços para viabilizar a implementação da reforma e das suas medidas complementares.
Isso significa que vamos fortalecer as defensorias públicas, modernizar a gestão do Poder Judiciário, produzir dados e indicadores estatísticos que auxiliem o planejamento de políticas judiciárias e estimular a aplicação de penas alternativas.
Todos sabemos da necessidade de tornar mais amplo o acesso à Justiça e mais ágil a prestação jurisdicional. Por essa razão, é muito importante o nosso pacto pela rápida aprovação, no Congresso Nacional, dos projetos de lei que propõem alterações nos Códigos de Processo Civil, de Processo Penal e do Processo Trabalhista.
Minhas senhoras e meus senhores,
Ainda neste primeiro semestre de 2005, como determina a mudança constitucional, deverão entrar em funcionamento os mecanismos concebidos para tornar o Judiciário mais moderno e próximo do cidadão. E o mais significativo desses mecanismos é, sem dúvida, o Conselho Nacional de Justiça.
O órgão será composto, na sua maioria, por juízes, mas também terá assentos para promotores, advogados e representantes da sociedade civil. Sua finalidade essencial será planejar o funcionamento do Judiciário e fiscalizar o cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados.
É grande a expectativa em relação ao papel a ser cumprido por ele. Sabemos que o Conselho, sozinho, não será capaz de remover todos os entraves que impedem o Judiciário de atender plenamente a demanda social por mais justiça.
Mas confiamos que sua consolidação se dará de acordo com os interesses da sociedade, expressos nas lutas por esse Conselho desde a Constituinte.
E confiamos também que isso significa um avanço importante na perspectiva da construção de uma instituição mais forte e cada vez mais acreditada pela população.
Por essa razão, a sua instalação e o início efetivo do exercício de suas atribuições neste primeiro semestre é requisito essencial para que adquira a desejável credibilidade.
Minhas senhoras e meus senhores,
O ano de 2004 foi marcante para o Poder Judiciário devido à aprovação da Emenda. Estamos todos comprometidos em trabalhar duro para que o ano de 2005 seja lembrado, no futuro, pela implementação da reforma e do cumprimento dos compromissos assumidos pelos três Poderes.
A criação do Conselho Nacional de Justiça é a concretização de um projeto, construído durante muitos anos, de todos que acreditam na necessidade de fortalecimento do Poder Judiciário para a consolidação das nossas instituições democráticas. Esse órgão deverá ser capaz de demonstrar que o controle social sobre o serviço público de qualquer um dos três Poderes pode ser realizado com o respeito estrito aos princípios e atribuições constitucionais.
Para todos nós, aqui reunidos, comprometidos com a luta dos brasileiros e brasileiras pela democracia, este momento é especialmente importante. Com o próprio Poder Judiciário à frente, estamos concretizando o sonho de ter no nosso país uma Justiça mais inclusiva, moderna e ágil.
Nós poderemos fazer do século XXI o século do Brasil. O Brasil perdeu oportunidades, mas pode olhar para trás e perceber que se o século XIX foi o grande século da Europa, se o século XX foi o grande século dos Estados Unidos, as reformas que estamos implantando no Poder Judiciário e as mudanças que podem acontecer, neste século, no Brasil, podem certamente transformar o século XXI no século em que o Brasil passará definitivamente para a história dos países economicamente avançados, do ponto de vista judiciário, moderno, e do ponto de vista social, justo com o seu povo.
Muito obrigado.