Judiciário não tem participação na crise fiscal, diz presidente do STF

Ministro Luís Roberto Barroso observou que, desde 2017, orçamento do Judiciário não tem aumento e é corrigido apenas pela inflação.

10/12/2024 20:38 - Atualizado há 2 semanas atrás
Foto colorida formato paisagem do ministro Barroso, ao lado da secretária de comunicação. Eles estão sentados numa mesa, na frente deles, e de costas para a foto, jornalistas estão sentados em cadeira e escutam ministro falar ao microfone. Foto: Antonio Augusto/STF

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que o Judiciário não tem participação ou responsabilidade sobre a crise fiscal brasileira. Em conversa com jornalistas que acompanham o trabalho da Corte, o ministro explicou que, desde 2017, o Judiciário está sob o regime de teto fiscal, ou seja, o orçamento é corrigido apenas pela inflação.

Barroso destacou, ainda, que o setor representa 1,2% do PIB, mas esse percentual vem caindo. “Nos últimos sete anos, o Judiciário não gastou um vintém a mais do que o orçamento que tinha em 2017 corrigido, de modo que não tem nenhuma participação nem responsabilidade sobre a crise fiscal brasileira”, afirmou.

Perguntado sobre os salários dos magistrados, Barroso salientou que abusos e pagamentos ilegais, ou seja, qualquer parcela não autorizada por lei, são inaceitáveis. Ponderou, contudo, que a remuneração dos juízes deve ser comparada com a remuneração média do mercado jurídico. Caso contrário, a carreira deixa de ser atraente para as pessoas mais qualificadas. “Juízes são recrutados em concursos públicos difíceis. Precisamos ter os melhores nomes do mercado jurídico, senão não teremos uma justiça de qualidade”, afirmou.

Emendas

Em relação à decisão que estabelece critérios para a liberação de emendas ao Orçamento da União, ele destacou que o Supremo interveio unicamente para dizer que é necessário ter rastreabilidade, controle e projeto, sem interferir no volume de recursos nem sua destinação. “Não é o papel do Supremo dizer quanto vai ser. Isso tem que ser uma questão política”, frisou.

Papel do Supremo

Quanto à amplitude de controvérsias que chegam ao STF, o presidente explicou que a Constituição de 1988 é mais abrangente que as constituições de praticamente todos os países do mundo, tratando de temas que, em outras partes, são resolvidos no campo da política, mas no Brasil são judicializáveis. Ele citou como exemplos a preservação do meio ambiente e o direito à saúde. “A Constituição procura estabelecer as competências de cada um dos Poderes. Mas, evidentemente, existem alguns espaços de fronteira em que há algum grau de tensão. O grande papel do Supremo é interpretar a Constituição”, disse.

Barroso considera que, nos 36 anos de vigência da Constituição, o Supremo prestou um serviço excepcional ao país no sentido de preservar o Estado de Direito e proteger e promover direitos fundamentais. “Vivemos o mais longo período de estabilidade institucional da vida brasileira. E conseguimos a promoção, o avanço em direitos fundamentais de mulheres, de negros, da comunidade LGBTQIA+, da comunidade indígena, das pessoas com deficiência, das pessoas trans, que talvez seja o grupo mais discriminado da sociedade. E estamos tentando diminuir a violação dos direitos humanos nos presídios brasileiros”, afirmou.

Fake news

Questionado sobre a duração dos inquéritos das fake news e das milícias digitais, Barroso afirmou que a demora ocorre porque os fatos foram se multiplicando ao longo do tempo, como os atos de 8/1. Além disso, novas provas foram surgindo a partir da capacidade da Polícia Federal de resgatar o material em arquivos eletrônicos que haviam sido deletados pelos envolvidos. Para o ministro, esses inquéritos foram decisivos para enfrentar o extremismo.

O presidente disse que tem se empenhado pela volta à civilidade e defendido a capacidade de pessoas que pensam de maneira diferente se sentarem à mesma mesa e poderem conversar, trocar e disputar ideias, mas com respeito e consideração pelas outras pessoas. Nesse sentido, em busca do resgate da civilidade, ele tem conversado com pessoas de diversos setores, “do agronegócio às comunidades indígenas, empresários, estudantes, Ministério Público, advogados, senadores e deputados de todas as convicções políticas, como eu acho que a vida deve ser”.

Descriminalização do aborto

Em relação ao recurso que discute a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, o presidente disse que ainda não sabe quando será pautado. Para o ministro, a discussão sobre o tema não está suficientemente amadurecida na sociedade brasileira, que, em seu entendimento, ainda não compreende que não é necessário prender a mulher que, por alguma circunstância da vida, precisou abortar.

Barroso pontuou que, além de considerar que o Estado não tem o direito de obrigar as pessoas a ter filhos, a criminalização não diminui o número de abortos, apenas impede que eles seja feitos de forma segura por quem não tem recursos financeiros para ir a outro país onde a prática seja legal. “Prender a mulher é uma péssima política pública”, ressalta. “Minha posição é que o aborto deve ser evitado. O papel do Estado é evitar que ele aconteça, dando educação sexual, distribuindo contraceptivos e amparando a mulher que queira ter o filho e esteja em condições adversas”.

Exame Nacional da Magistratura

O presidente destacou que a criação do Exame Nacional de Magistratura, em sua gestão no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), vai criar um padrão nacional. Ele explicou que os tribunais continuarão a ter autonomia para realizar seus próprios concursos. Mas, para participar do certame, o candidato terá de ser aprovado anteriormente no exame nacional. “Isso dá um choque de integridade e de qualidade no Judiciário prospectivamente, o que acho muito bom”.

Barroso também comentou o mecanismo de capacitação, por meio de bolsas, para aumentar a participação de pessoas negras no Judiciário, formado em sua maioria por pessoas brancas, em contraste com a demografia brasileira. Da mesma forma, destacou a implementação da regra de paridade, também do CNJ, prevendo que, se um homem tiver sido promovido por merecimento para um tribunal, a vaga seguinte tem que ser necessariamente de uma mulher.

(Pedro Rocha//CF)

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