Especialista afirma que Encontro de Cortes Supremas representa abertura à integração
O diretor do Centro de Estudos de Direito Internacional, professor Antenor Pereira Madruga Filho, foi um dos entrevistados na manhã desta quarta-feira (7) do programa Revista Justiça, da Rádio Justiça, que falou sobre o sistema jurídico do Mercosul.
O doutor em direito internacional afirmou que os sistemas jurídicos dos países que compõem o Mercosul são parecidos. Segundo ele, são sistemas de uma mesma família jurídica e bem parecidos. "É claro que têm assimetrias, que não são apenas jurídicas, mas também econômicas e que implicam em algumas diferenças, mas a base dos sistemas são equivalentes".
Ele explicou ainda que o sistema de integração tem, por um lado, a idéia de integrar normas, a integração normativa. Por outro lado, e talvez o maior desafio, é a integração judiciária. "Ou seja, não apenas a integração normativa mas também a integração das estruturas de solução de controvérsias e aplicação das leis. Esse inclusive é o objeto do encontro de cortes supremas, que acontece esta semana em Brasília. Como ampliar a cooperação judicial no âmbito do Mercosul – um fator muito importante, talvez tão importante quanto a integração normativa", ressaltou.
Segundo Antenor Madruga, as justiças dos países que compõem o bloco se comunicam, mas essa comunicação acontece ainda de forma arcaica, por meio de cartas rogatórias. As decisões precisam ser reconhecidas e homologadas em outro país e precisam passar por um processo chamado ”processo de homologação” que é razoavelmente lento. "Essa é uma situação que não acompanhou a evolução das proximidades entre os países principalmente dentro de um bloco de integração. Hoje as pessoas circulam mais entre os blocos, as empresas negociam e até mesmo as organizações criminosas, pela facilidade da tecnologia, atuam com maior liberdade sem respeitar as fronteiras e, a justiça ainda está muito presa aos princípios da territorialidade e o desafio é esse", afirmou.
Explicou também que se for observado o modelo de integração inclusive os erros e acertos como no caso da União Européia, observa-se que o terceiro pilar da integração para eles foi o da justiça. Um princípio que para eles foi muito importante foi o princípio da livre circulação de decisões judiciais. De forma que, a decisão de um país membro do bloco não precisa ser previamente homologada para ser válida no outro país. Além desse há outros instrumentos que permitem uma maior proximidade da justiça.
Para ele, a Constituição brasileira já é integradora. "Há vários princípios que determinam que devemos nos relacionar com os países vizinhos para alcançar os objetivos que a própria Constituição estabelece. Se no passado a idéia de executar no Brasil uma decisão estrangeira ela vinha com uma carga de potencial ameaça a nossa soberania e portanto deveria passar por um filtro, que hoje é exercido pelo Superior Tribunal de Justiça, essa idéia de que a cooperação internacional tem uma carga potencial de violação da soberania hoje não faz mais sentido. Hoje é o contrário. Se não tivermos cooperação judicial, a própria jurisdição pode ficar esvaziada, basta que os interesses que estão sujeitos a jurisdição saiam das fronteiras para dificultar a ação da justiça".
Um exemplo dado por ele foi no âmbito criminal, quando um réu sai do seu país e vai para outro país. Se não houver um processo de extradição rápido, a própria capacidade da justiça aplicar a lei aquele caso concreto pode ficar prejudicada. Outro exemplo é a lavagem de dinheiro. Se não houver mecanismos para obter dados bancários e provas com maior facilidade em outros países, isso também prejudicará a capacidade de atuação e eficiência do Poder Judiciário. "De forma que a cooperação internacional que antes poderia ser vista como ameaça a soberania hoje é essencial a soberania. Ou seja, essencial para a eficácia do poder judicipario que é um elemento da soberania".
Em sua opinião, a integração é necessariamente normativa mas fundamentalmente também judicial no sentido não só de solucionar controvérsias mas fazer aplicar a lei e maior circulação do fluxo de interesses.
Ele destacou como positiva a iniciativa dos encontros que reunem ministros das cortes supremas dos países. "O próprio fato de ter um quinto encontro já é um indicador de que há um interesse na integração judicial de modo geral. Mas a área jurídica é uma das áreas mais desconfidas em relação a integração. Principalmente nós juristas brasileiros negligenciamos todo aquele aspecto transacional dos problemas jurídicos. Basta olhar para as nossas universidades e a importância que se deu a matérias como direito internacional púiblico, direito internacional privado, quase negligenciadas na maior parte das universidades. Então nós temos ainda uma dívida a resgatar com a nossa capacidade de resolver os problemas jurídicos transacionais. Mas há um esforço muito grande nesse sentido. Eu vejo uma tendência de aproximação embora seja uma tendência que não tem a mesma velocidade da integração econômica".
Para ele, o fato de estarem juntos ministros e tribunais supremos anualmente pela quinta vez, já cria na própria jurisprudência uma abertura maior à integração. "Esse talvez já seja o maior resultado. Sem contar que temas são discutidos, dúvidas são esclarecidas. Para este quinto encontro dois temas vão ser abordados: de uma lado a questão previdenciária do Mercosul, que afeta os trabalhadores que circulam nesses países. O segundo tema é como avançar na coopeação jurídica internacional. Saber se já estamos preparados para dar um passo na livre circulação de decisões judiciais nos países. Eu diria que o maior resultado do encontro é a criação de uma cultura de cooperação no âmbito do judiciário", concluiu.
CM/EH