Envolvido no caso Propinoduto obtém liminar no Supremo
O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu liminar no Habeas Corpus (HC 85588) impetrado em favor de R.M.R.P. Acusado de suposto envolvimento no chamado caso Propinoduto, esquema de fraude na arrecadação estadual de tributos no Estado do Rio de Janeiro, ele pediu a suspensão de decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que autorizou a participação de autoridades da Suíça nas investigações sobre o caso, por provável conexão nos processos penais instaurados nos dois países.
Com a concessão da liminar, o ministro estabeleceu que a realização de atos instrutórios deve ser feita, exclusivamente, pelas autoridades brasileiras, com o simples acompanhamento, se for o caso, de autoridades suíças. O ministro ressaltou ser necessário manter, para a realização dos atos instrutórios, “o crivo do Superior Tribunal de Justiça, em face da competência que a Constituição Federal lhe reserva no campo da execução das cartas rogatórias”.
No pedido de HC, a defesa afirmou que a decisão do STJ manteve determinação do Tribunal Regional Federal da 2ª Região para que se realize, no Brasil, com a participação de autoridades suíças, uma série de atos investigatórios (inquirição de testemunhas, interrogatório de réus, produção de documentos e eventual realização de buscas e apreensões domiciliares) para a instrução de ação penal por suposto crime de lavagem de dinheiro.
Ao conceder a liminar, o relator, ministro Marco Aurélio, entendeu que a cooperação entre as justiças brasileira e suíça deve respeitar a organicidade do direito nacional, pois a prática de determinados atos somente podem ser realizados por meio de carta rogatória, como os ligados à audiência de instrução para fins de ação penal.
CG/EH
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Veja a íntegra da decisão:
DECISÃO
1. O juiz André Fontes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, implementou autuação de expediente tomado como a revelar atos de cooperação jurídica internacional, determinando providências (folha 75). Deu-se a formalização de medida na qual se apontou haver ficado configurada a usurpação da competência do Superior Tribunal de Justiça – artigo 105, inciso I, alínea “i”, da Constituição Federal – para conceder exequatur a cartas rogatórias passivas. O Vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça concedeu liminar, suspendendo audiências designadas. O Ministério Público interpôs agravo e então a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, contra os votos dos ministros Nilson Naves, Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler, Hamilton Carvalhido e Franciulli Netto, proveu o recurso.
Sustenta-se que está em jogo a soberania nacional, o cumprimento de conteúdo de carta rogatória com a participação, nos atos a serem efetuados, de autoridade suíça. Ter-se-ia o envolvimento de realização de audiência instrutória, com audição de cidadãos brasileiros. Afirma-se que a decisão do ministro Paulo Galotti, relator do Habeas Corpus nº 41.853-RJ, sob o ângulo liminar, não estaria a dar respaldo ao ato praticado na origem, mesmo porque o tema referente à necessidade de carta rogatória, a exigir o exequatur, ficara em aberto, projetando-se o exame para a oportunidade do julgamento definitivo. Ressalta-se que o tratado de cooperação jurídica em matéria penal entre a República Federativa do Brasil e a Confederação Suíça, celebrado em Berna, em 12 de maio de 2004, encontra-se sob a apreciação do Congresso Nacional e que, de qualquer forma, o meio de viabilização das providências pretendidas pela Confederação Suíça é a carta rogatória, a ser apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça. Menciona-se voto do ministro Celso de Mello na Carta Rogatória nº 8.279, em que analisada a recepção dos tratados ou convenções internacionais em geral e o sistema brasileiro de incorporação na ordem jurídica, bem como o precedente consubstanciado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.480-3/DF. Requer-se a concessão de medida acauteladora que implique suspender a eficácia do que assentado pela Corte Especial até decisão final deste habeas, solicitando-se informações e o acórdão relativo ao julgamento verificado ou, inexistente, o teor do voto condutor do pronunciamento, ouvindo-se a Procuradoria Geral da República, para, ao final, cassar-se o que decidido. À inicial juntaram-se os documentos de folha 20 a 288, vindo-me o processo por prevenção ante a relatoria do Habeas Corpus nº 84.038-8/RJ.
2. A relevância do que versado na inicial e o risco de se manter com plena eficácia o quadro até aqui delineado, mediante a cassação da liminar deferida pelo Vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Sálvio Figueiredo, está a conduzir à concessão de medida acauteladora. Cumpre atentar para o princípio da realidade, sobrepondo-se o conteúdo ao aspecto simplesmente formal. O empréstimo do rótulo de procedimento de cooperação internacional a certo instrumento não pode desaguar na prática de atos somente passíveis de serem alcançados por meio de carta rogatória, como são aqueles ligados à audiência de instrução, visando à persecução criminal. A cooperação há de se fazer com respeito irrestrito à organicidade de Direito nacional, reafirmando-se a República como revelada por um Estado Democrático de Direito, para tanto se mostrando indispensável que se homenageie a máxima segundo a qual o meio justifica o fim, mas não este, aquele. Defiro a liminar para suspender a eficácia do que deliberado pelo Órgão Especial do Superior Tribunal de Justiça, mantida, assim, até o julgamento final deste habeas corpus, a óptica da necessidade de se contar – para a realização de atos instrutórios, por sinal com a participação exclusiva de autoridades brasileiras e simples acompanhamento, se for o caso, de autoridades suíças – com o crivo do Superior Tribunal de Justiça, em face da competência que a Constituição Federal hoje lhe reserva no campo da execução das cartas rogatórias.
3. Solicitem-se as informações.
4. Publique-se.
Brasília, 5 de março de 2005.
Ministro MARCO AURÉLIO
Relator