Defensores de cotas raciais entregam “Carta da igualdade” ao presidente do STF aos 120 anos da Abolição

13/05/2008 20:15 - Atualizado há 12 meses atrás

Um grupo de defensores das cotas raciais, integrado por representantes de todas as regiões e da maioria dos estados brasileiros, entregou, nesta terça-feira (13) ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, o manifesto “Carta da Igualdade”. O documento defende as cotas raciais já instituídas em várias universidades brasileiras. A audiência com o presidente do STF foi realizada na data em que se completam 120 anos de Abolição da Escravatura.

Antes do encontro com o ministro Gilmar Mendes, o grupo foi recebido pelo ministro Joaquim Barbosa. À saída do encontro, o professor Alexandre do Nascimento, integrante do Movimento Pré-Vestibular para Negros e Carentes e professor da FAETEC/RJ, uma rede de escolas técnicas mantida pelo governo fluminense, refutou o argumento daqueles que são contra as cotas e defendem, em vez de se priorizar o acesso às universidades, a priorização do ensino de primeiro e segundo graus.

A favor das cotas raciais nas universidades, o professor Alexandre disse que, em primeiro lugar, “elas pagam uma injustiça histórica, uma dívida que o Estado brasileiro tem com a população negra”. Segundo ele, as cotas não ferem o princípio do mérito, “até pelo contrário, quem precisa das cotas neste país são as instituições, principalmente as universidades, não necessariamente a população negra”.

“Nós estamos convictos de que as cotas serão um passo fundamental para a democratização não só do ensino superior, mas também das instituições brasileiras, inclusive desta Casa [o STF], que hoje tem apenas um ministro negro”, observou.

Quanto ao argumento de que seria mais importante priorizar o ensino de primeiro e segundo graus, o professor Alexandre disse que as cotas “não têm nada a ver com a não-priorização do primeiro e do segundo graus”. Conforme ele, o movimento negro foi o primeiro a defender, antes mesmo do Manifesto dos Pioneiros, uma escola pública para todos. 

“Todos nós estamos de acordo em que a qualidade do ensino de primeiro e segundo graus, o ensino básico, tem que melhorar, ninguém tem dúvida disso”, afirmou. Para ele, as universidades precisam mudar a sua forma de seleção. “É preciso mexer na dinâmica das universidades, e as cotas, no nosso entendimento, vão ajudar a fazer isso e, mais que isso, vão ajudar a gente a ter um Brasil mais justo”, salientou.

Organizadores

“Nós estamos aqui entendendo que o Supremo Tribunal Federal está sensível a um Brasil melhor”, disse frei David Raimundo dos Santos, que participou da redação do documento entregue hoje ao presidente Gilmar Mendes. “Para nós, é lamentável que 97% do povo afro-brasileiro nunca teve acesso à universidade, é inaceitável que menos de 1% dos professores das universidades públicas são afro-descendentes”, ressaltou.

Segundo o frei, esses dados são suficientes para que os poderes da República promovam políticas contra as dificuldades dos negros quanto à igualdade de justiça nos demais seguimentos da sociedade. “A inclusão social será totalmente remodelada a partir do momento em que nós negros nos apresentarmos para a sociedade como pessoas capacitadas”.

Conforme ele, o sistema de cotas é o primeiro passo para começar uma sociedade mais igualitária. “Estamos combatendo o racismo e dando ao negro igualdade de condições”, completou.

O advogado Renato Ferreira também auxiliou a redigir o manifesto. Pesquisador de políticas públicas e especialista em direito e relações raciais, ele informou que o movimento é pacífico e republicano. De acordo com Ferreira, “existe uma diferença significativa entre negros e brancos no Brasil, e isso não foi tratado após a abolição da escravatura. Os negros ficaram numa situação de desvantagem flagrante em relação aos demais membros do Brasil”, disse.

Ele revelou que as cotas são um passo importante para o processo mais igualitário, entretanto considerou fundamental a melhoria do ensino público, com a revitalização do sistema educacional. “Sabemos que isso leva tempo e por si só não vai gerar um resultado”, destacou.

“Que o Brasil comece a trilhar um caminho de paz, um caminho fraterno, sem banalizar desigualdades incompatíveis com o estado democrático de direito”, finalizou, ressaltando que não se pode deixar para as gerações futuras uma sociedade desigual.

EC,FK/EH

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