Barbosa e Rabban discutem a proteção da liberdade de expressão no Brasil e nos EUA

A proteção da liberdade de expressão foi o tema do segundo painel do “1º Diálogo Constitucional Brasil – Estados Unidos”, que está sendo realizado hoje, no auditório da Segunda Turma do STF. O assunto foi debatido pelo professor norte-americano David M. Rabban, da Universidade do Texas, e pelo ministro do STF Joaquim Barbosa.
Rabban é um dos maiores especialistas dos Estados Unidos em liberdade de expressão. Autor do livro “Free Speech in its Forgotten Years – 1870-1920” (Liberdade de Expressão nos seus Anos Esquecidos), ele também se dedica aos estudos da história da Constituição norte-americana e suas aplicações no país. Já o ministro Barbosa é um grande conhecedor do direito norte-americano e famoso por defender as garantias constitucionais que protegem as minorias e os sujeitos vulneráveis.
Rabban destaca o direito de os cidadãos criticarem o próprio governo
A Primeira Emenda à Constituição dos EUA, que determina que o “o Congresso não aprovará lei que restrinja a liberdade de expressão, ou a liberdade de imprensa”, foi o ponto central da exposição de Rabban. “Ao contrário da Constituição brasileira, a americana é muito breve”, afirmou o professor, lembrando que ela foi promulgada em 1787, permeada por uma nova teoria de soberania, distinta da que vigorava na Inglaterra. Para os ingleses, a soberania cristalizava-se no Parlamento, enquanto que, para os americanos, que declararam sua independência da metrópole britânica em 1776, a soberania pertencia ao povo.
“Acredito que essa teoria de soberania tenha conseqüências na liberdade de expressão. Em última análise, a soberania cabe ao povo e, por isso, o povo tem de ter a capacidade de criticar seus representantes”, analisou Rabban. Para ele, essa capacidade de criticar o governo é a essência da liberdade de expressão nos EUA. Ele explicou, ainda, que, no processo de elaboração da Constituição, havia o medo de dar muitos poderes ao governo, e que as emendas eram uma forma de se restringir tais poderes.
O professor, no entanto, fez uma ressalva quanto à aplicação da Primeira Emenda: ela limita-se aos governos estaduais e federal, não atingindo o setor privado. “Ela não evita que o empregador restrinja a liberdade de expressão do empregado, mas acredito que muitos do setor privado, voluntariamente, obedecem aos princípios de liberdade exigidos do governo”, ponderou.
Barbosa analisa os limites da liberdade de expressão no Brasil
“A liberdade de expressão [no Brasil] não é irrestrita. Há limites que podem redundar, até mesmo, em condenação penal”. A análise é do ministro Joaquim Barbosa, baseada na interpretação do artigo 5º da Constituição Federal.
Barbosa comparou, entre si, os incisos IX e X do artigo 5º da Constituição. O inciso IX diz que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Já o inciso X dispõe que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
O ministro ilustrou esse dilema entre assegurar a liberdade de expressão e, ao mesmo tempo, preservar valores como a intimidade e a reputação, com diversos casos. Entre eles, o de racismo contra judeus julgado pelo STF em setembro do ano passado – um habeas corpus impetrado por um editor de livros gaúcho (HC 82424). O Supremo negou-lhe o habeas, mantendo a condenação do editor por crime de racismo, determinada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Barbosa também explicou a diferença entre o tratamento da liberdade de expressão no sistema americano e no europeu, herdado pelo Brasil. Segundo ele, a abordagem americana poderia ser classificada como “negativista”, pois a Constituição dos EUA diz “o Congresso não editará lei limitando a liberdade de expressão”. Já a européia, assim com a brasileira, proclama o direito à liberdade como princípio fundamental e, em seguida, expõe as possibilidades de extensão desse direito. Essa tradição pode ser observada no artigo 5º da Constituição brasileira.
SI/EC
Da esq. para dir.: professor Rabban; mediador do debate, e ministro Joaquim Barbosa (cópia em alta resolução).