AGU defende ato do ex-presidente Lula que negou extradição de Battisti
Ao falar perante os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) durante o julgamento da Reclamação (RCL) 11243, o advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, disse que a decisão do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, que negou extraditar Cesare Battisti para a Itália, respeitou o que dispõe o tratado assinado entre Brasil e Itália.
Por meio da Reclamação, a República da Itália pede ao Supremo que faça cumprir a decisão da Corte tomada em 18 de novembro de 2009, quando, por maioria, os ministros autorizaram a extradição do ex-ativista Cesare Battisti para a Itália.
De acordo com Adams, quando a Corte decidiu pelo deferimento da extradição (EXT 1085) de Battisti, estabeleceu que cabia ao presidente da República – responsável pela condução das relações internacionais do país – extraditar ou não o ex-ativista.
O ex-presidente motivou sua decisão no juízo de discricionariedade, previsto em cláusula do tratado bilateral, disse Adams. Esta cláusula, frisou o advogado-geral, remete a um juízo de suposição, ou hipotético, que compete ao presidente da República tomar.
A decisão de Lula, disse Adams, fundado nesse juízo hipotético, foi tomada com base em informações que chegaram ao ex-presidente por meio de notícias da imprensa. Nesse sentido, o advogado-geral lembrou que a Corte já admitiu, no julgamento da Extradição 986, juízos como esse, baseados em notícias de jornais.
O advogado-geral concluiu sua sustentação dizendo acreditar que não há razão para se substituir o juízo hipotético do presidente da República, previsto no tratado, por outro juízo de suposição, sob o risco de se substituir o chefe do Executivo nacional na condução das relações internacionais.
Os ministros analisam, em conjunto, petição nos autos da Extradição (EXT) 1085, em que a defesa de Battisti pede o relaxamento da prisão do italiano.
Defesa de Battisti entende que há vingança histórica tardia e injusta
Após a manifestação do advogado-geral da União, o advogado Luís Roberto Barroso, atuando no interesse de Cesare Battisti, defendeu da tribuna do STF o ato do presidente da República de negar a entrega do nacional italiano. “Este é um ato de soberania do Estado brasileiro”, disse Barroso, ao ressaltar que o presidente da República do Brasil tem competência e atuação legítima para tal decisão.
Para ele, o ato foi “injustamente atacado na sua honra por autoridades estrangeiras”, ao tentar impedir a consumação “de uma vingança histórica tardia e injusta”. “A vingança é o papel menos nobre da pena”, completou.
Decisão moralmente legítima
De acordo com o advogado, no caso estão em discussão três valores significativos para o Estado constitucional. São eles: a soberania nacional, a separação dos Poderes e a proteção dos direitos fundamentais. Além de ressaltar o acerto jurídico do ato da Presidência da República, Luís Roberto Barroso salientou não haver dúvidas de que a decisão contestada era moralmente legítima. “Não havia outra decisão a ser tomada nessas circunstâncias”, avaliou.
Nesse sentido, a primeira razão do ponto de vista moral citada pelo advogado é o fato de que já se passaram mais de 32 anos desde o último fato relevante imputado a Cesare Battisti, sendo que o maior prazo de prescrição do direito brasileiro é de 20 anos. “Este é o ponto de equilíbrio entre justiça e segurança jurídica no nosso ordenamento, não estou aqui fazendo uma invocação técnica do argumento da prescrição, mas uma invocação moral sobre o poder de punição e a finalidade da pena em um estado democrático de direito”, disse Barroso.
O segundo motivo moral relevante, conforme ele, está relacionado ao fato de que o Brasil concedeu anistia a militantes da esquerda, a militantes da direita e a agentes do Estado pelos mesmos fatos ocorridos no mesmo período. “Também não estou invocando o argumento técnico da anistia, mas o argumento moral”, afirmou.
“É não só moralmente legítimo como moralmente desejável que o presidente da República do Brasil não venha a punir no Brasil pessoas que aqui estão por fatos que nós tomamos a decisão política de não punir”, argumentou o advogado. “Se nós não punimos os nossos aqui também não vamos punir os dos outros que estejam aqui por qualquer circunstância”, ressaltou.
Decisão juridicamente legítima
Ainda conforme Luís Roberto Barroso, a decisão do presidente da República é igualmente justa e, sendo juridicamente correta, deve ser mantida. Segundo ele, Cesare Battisti foi julgado uma primeira vez e não foi sequer acusado por crime de homicídio.
“Depois que ele recebe abrigo político na França, as pessoas do seu grupo que já haviam sido condenadas pelos homicídios transformam-se em delatores premiados, acusam Battisti da prática dos quatro homicídios e ele é julgado e condenado à revelia, sem ter conhecimento do julgamento e sem ter constituído advogado”, disse Barroso. Ele ressaltou que se trata de um “caso absurdo de conflito de interesses”.
Para o advogado de Battisti, não cabe a reclamação apresentada pela República italiana, tendo em vista que ela não tem legitimação ativa neste caso. “Um estado estrangeiro não pode vir a juízo no Brasil, questionar um ato de soberania, não é assim e não pode ser assim em nenhum lugar do mundo”, disse. Além disso, ele disse que há impossibilidade jurídica do pedido porque essa é uma decisão política de soberania, que não é passível de controle judicial.
MB,EC/CG