Íntegra da palestra proferida pelo presidente do Supremo, na Câmara de Comércio Brasil-EUA, em Washington
O JUDICIÁRIO NO CONTEXTO NACIONAL
PARTE SIGNIFICATIVA DO CUSTO DE FINANCIAMENTO DO PAÍS É ATRIBUÍDO À MOROSIDADE E À INEFICIÊNCIA DAS INSTITUIÇÕES, ENTRE ELAS O JUDICIÁRIO.
NO ENTANTO, FORAM ESTAS MESMAS INSTITUIÇÕES QUE CONDUZIRAM O IMPEACHMENT DE UM PRESIDENTE DA REPÚBLICA EM 1992 E O AFASTAMENTO DE DEPUTADOS E SENADORES NA DÉCADA DE 90 DO SÉCULO PASSADO E NO INÍCIO DESTE.
FORAM PROCESSOS COM ABSOLUTA ISENÇÃO, INDEPENDÊNCIA E LISURA.
TUDO EM PAÍS ONDE A DEMOCRACIA, COMO INSTRUMENTO DE PODER, É PRÁTICA RELATIVAMENTE RECENTE.
ATÉ 1984 O PAÍS ESTAVA ORGANIZADO SOB A ÉGIDE DE GOVERNOS MILITARES. NÃO HAVIA O RESPEITO A REGRAS PRÉ-ESTABELECIDAS E AO LIVRE FUNCIONAMENTO DAS INSTITUIÇÕES DO ESTADO E DA SOCIEDADE.
ESTE É O BRASIL, ESTAS SÃO NOSSAS INSTITUIÇÕES:
SURPRENDENTE CAPACIDADE DE ADAPTAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO EM CURTO PERÍODO DE TEMPO.
MUITOS TÊM ATRIBUÍDO AO PROCESSO DECISÓRIO EXISTENTE NO JUDICIÁRIO, A RESPONSABILIDADE PELO ALTO CUSTO DE FINANCIAMENTO DO PAÍS – O CUSTO BRASIL.
A INSEGURANÇA CONTRATUAL NÃO VEM DO JUDICIÁRIO.
RADICA-SE, FUNDAMENTALMENTE, NA IMPREVISIBILIDADE ECONÔMICA.
ESSA IMPREVISIBILIDADE PODE GERAR SITUAÇÕES ABSOLUTAMENTE ADVERSAS PARA OS CONTRATOS E, COM ISTO, LEVAR A CONFLITOS QUE O JUDICIÁRIO TENHA QUE DIRIMIR.
LEIA-SE TRECHO DA EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA LEI QUE CRIOU O PLANO REAL, DE 1994:
“A REFORMA MONETÁRIA NÃO APENAS DERRUBA A INFLAÇÃO INSTANTANEAMENTE; ELA TAMBÉM INSTITUI UM NOVO PADRÃO MONETÁRIO PARA O PAÍS E, PORTANTO, NECESSITA, REDEFINIR NA NOVA MOEDA TODAS AS RELAÇÕES CONTRATUAIS PREEXISTENTES, PRESERVANDO SEU EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO”
AS NOVAS REGRAS NÃO MAIS PODERIAM CONVIVER COM CONTRATOS FIRMADOS EM AMBIENTE INFLACIONÁRIO.
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL COMPREENDEU A MUDANÇA.
DISSE O MINISTRO CELSO MELLO:
… OS PRESSUPOSTOS QUE DETERMINARAM AS PARTES A SE OBRIGAREM DEIXARAM DE EXISTIR E, SE IMPREVISÍVEIS AS CIRCUNSTÂNCIAS QUE DE MODO TÃO GRAVE FRUSTRARAM A JUSTIFICADA EXPECTATIVA DOS CONTRAENTES, SERIA, EVIDENTEMENTE, INJUSTO MANTER A ECONOMIA DO CONTRATO CONTRA A INTENÇÃO E A FÉ EM QUE ELE FOI AJUSTADO E CONCLUÍDO.
AS ÉPOCAS, …, COMO A NOSSA, … FORÇAM OS GOVERNOS DE TODOS OS PAÍSES ÀS MAIS DRÁSTICAS MEDIDAS DE EMERGÊNCIA, SERIA SUMARIAMENTE INJUSTIFICÁVEL QUE NO DOMÍNIO DO COMÉRCIO JURÍDICO E DA LIBERDADE CONTRATUAL, QUE SE FUNDAM PRECISAMENTE NO PRESSUPOSTO DA CONTINUIDADE DA ORDEM ESTABELECIDA, SE DEIXASSE AO EGOÍSMO INDIVIDUAL O PODER, DISSIMULADO EM DIREITO, DE APROVEITAR-SE DAS CIRCUNSTÂNCIAS IMPREVISTAS E ANORMAIS PARA TRANSFORMAR UM INSTRUMENTO DE EQUILÍBRIO ECONÔMICO, COMO É O CONTRATO, EM INSTRUMENTO DE EXTORSÃO OU DE ENRIQUECIMENTO INJUSTO.”
O BRASIL ATRAVESSOU, DURANTE O PERÍODO DE ALTA INFLACIONÁRIA, PLANOS ECONÔMICOS E TRANSFORMAÇÕES CONTRATUAIS QUE MUDARAM O NOSSO SISTEMA FINANCEIRO E A VISÃO DO JUDICIÁRIO.
ESTAS ALTERAÇÕES DEMONSTRARAM QUE AS INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS POSSUEM UMA CAPACIDADE DE ADAPTAÇÃO E MODERNIZAÇÃO ESPANTOSA.
SINGULAR EU DIRIA.
A VELOCIDADE COM QUE NOS ADAPTAMOS À INFLAÇÃO E VOLTAMOS A ESTABILIDADE É ALGO QUE FAZ DO BRASIL UM PAÍS ÍMPAR EM MATÉRIA DE TRANSFORMAÇÕES EFICAZES E VELOZES.
NOSSO SISTEMA FINANCEIRO É UM EXEMPLO DE FLEXIBILIDADE E ADAPTAÇÃO. NESTA DIREÇÃO, TODAS AS INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS TÊM SE MOSTRADO CAPAZ DE SE ADAPTAREM A SITUAÇÕES ADVERSAS.
A FLEXIBILIDADE A QUE ME REFIRO NÃO É AQUELA SUJEITA A PRESSÕES POLÍTICAS E FAVORES.
É, SIM, A QUE PERMITE UM AJUSTE EFICAZ ÀS NOVAS DEMANDAS IMPOSTAS PELA EVOLUÇÃO DO AMBIENTE POLÍTICO, ECONÔMICO E SOCIAL.
NÃO PRETENDO FUGIR DA DISCUSSÃO SOBRE A EFICIÊNCIA DO JUDICIÁRIO, SUA MELHORA OU TAMPOUCO OS IMPACTOS DESTA PARA O PAÍS.
HÁ MUITO A MELHORAR E CONTRIBUIR PARA A REDUÇÃO DO CUSTO BRASIL E O JUDICIÁRIO TEM O SEU PAPEL.
AS REFORMAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS FEITAS RECENTEMENTE CAMINHAM NO SENTIDO DE UM JUDICIÁRIO MAIS MODERNO, TRANSPARENTE E CÉLERE:
(1) DEMOCRATIZAÇÃO E CONTROLE DO PODER JUDICIÁRIO;
(2) VALORIZAÇÃO DAS FUNÇÕES ESSENCIAIS E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA;
(3) EFICIÊNCIA E CELERIDADE AO PODER JUDICIÁRIO;
(4) AMPLIAR A INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA DA MAGISTRATURA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
DESTACO REFORMAS QUE PROCURAM DAR MAIOR EFICIÊNCIA AO JUDICIÁRIO:
SÚMULA VINCULANTE – O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PODERÁ, MEDIANTE DECISÃO REITERADA DE DOIS TERÇOS DE SUA COMPOSIÇÃO, ADOTAR SÚMULA COM EFEITO VINCULANTE EM RELAÇÃO AOS DEMAIS ÓRGÃOS DO PODER JUDICIÁRIO E À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA, NAS ESFERAS FEDERAL, ESTADUAL E MUNICIPAL.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – TEM POR FINALIDADE FISCALIZAR AS ATIVIDADES ADMINISTRATIVA E FINANCEIRA DOS TRIBUNAIS. TAMBÉM ORGANIZARÁ UM SISTEMA NACIONAL DE ESTATÍSTICAS JUDICIAIS E REALIZARÁ O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO DO SISTEMA DE JUSTIÇA.
DELEGAÇÃO DE ATOS SEM CARÁTER DECISÓRIO – OS MAGISTRADOS DELEGARÃO AOS SERVIDORES A PRÁTICA DE ATOS DE ADMINISTRAÇÃO E ATOS DE MERO EXPEDIENTE SEM CARÁTER DECISÓRIO.
JUÍZO ARBITRAL – OS INTERESSADOS EM RESOLVER SEUS CONFLITOS DE INTERESSE PODERÃO VALER-SE DE JUÍZO ARBITRAL, INCLUSIVE AS ENTIDADES DE DIREITO PÚBLICO, NOS TERMOS DE LEI.
CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE – AMPLIAÇÃO DO ACESSO A ESSE CONTROLE, AUMENTANDO A SUA IMPORTÂNCIA NO SISTEMA MISTO QUE ADOTAMOS (CONTROLE DIFUSO E CONCENTRADO).
DESCENTRALIZAÇÃO DA JUSTIÇA – OS TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS, OS TRIBUNAIS REGIONAIS DO TRABALHO E OS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA PODERÃO FUNCIONAR DESCENTRALIZADAMENTE, CONSTITUINDO CÂMARAS REGIONAIS, A FIM DE ASSEGURAR O PLENO ACESSO DO JURISDICIONADO À JUSTIÇA EM TODAS AS FASES DO PROCESSO.
DIREITOS HUMANOS – OS TRATADOS INTERNACIONAIS SOBRE O TEMA, CELEBRADOS PELO BRASIL, SE APROVADOS POR TRÊS QUINTOS DO CONGRESSO NACIONAL, PASSARÃO A VALER COMO EMENDA CONSTITUCIONAL. ASSEGURA-SE MAIOR FORÇA AOS NOSSOS COMPROMISSOS INTERNACIONAIS.
O GRANDE INTERVALO TEMPORAL, HOJE EXISTENTE, ENTRE A ENTRADA DO PROCESSO NO TRIBUNAL E SUA DECISÃO FINAL TENDE A SER REDUZIDO POR ESSAS E OUTRAS MODIFICAÇÕES IMPLEMENTADAS.
SEI QUE A SEGURANÇA DO CREDOR É UM PONTO IMPORTANTE PARA A OFERTA DE CRÉDITO E QUE NESTE PARTICULAR O RESPEITO AOS CONTRATOS É PONTO CRUCIAL.
CONTUDO, TAMBÉM É VERDADE QUE O PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS NÃO É ASSIM TÃO ABSOLUTO E FRIO COMO PARECEM PRETENDER.
O JUDICIÁRIO NÃO VIOLA CONTRATOS, MAS SIM, ARBITRA QUESTÕES QUANDO É CHAMADO A FAZÊ-LO.
NOS ÚLTIMOS ANOS, O QUE O JUDICIÁRIO BRASILEIRO PROCUROU FAZER FOI GARANTIR O ESTADO DE DIREITO VIGENTE.
CUMPRINDO SEMPRE SEU DEVER DE GARANTIR O REGIME DEMOCRÁTICO.
PODE SER QUE O BRASIL POSSUA LEIS E REGULAMENTAÇÕES DIFERENTES DE OUTROS PAÍSES.
CERTAMENTE A FORMAÇÃO CULTURAL DOS NOSSOS JUÍZES ESTÁ EMBASADA EM COSTUMES E NORMAS DIFERENTES. É FRUTO DE UM PROCESSO HISTÓRICO ESPECÍFICO.
CONTUDO, NÃO CREIO QUE A LÓGICA DECISÓRIA DE NOSSOS TRIBUNAIS SEJA, NA ESSENCIA, DIFERENTE DE QUALQUER OUTRO.
PECULIARIDADES EXISTEM E DEVEM EXISTIR.
A GLOBALIZAÇÃO NÃO IMPEDE E NÃO PODE IMPEDIR QUE TENHAMOS NOSSAS PRÓPRIAS LEIS E COSTUMES.
POSSO AFIRMAR QUE O JUDICIÁRIO BRASILEIRO É UMA INSTITUIÇÃO COM A MAIS ABSOLUTA INDEPENDÊNCIA PARA DECIDIR EM PROL DA JUSTIÇA E DA GARANTIA DO SEU CUMPRIMENTO.
SOBRE A TESE DAQUELES QUE AFIRMAM QUE O JUDICIÁRIO REPRESENTA PARCELA SIGNIFICATIVA DO CUSTO BRASIL E CONSEQÜENTEMENTE DO ELEVADO RISCO PAÍS, GOSTARIA DE LEMBRAR ESTUDO RECENTE DO BANCO MUNDIAL, (“MAKING JUSTICE COURT: MEASURING AND IMPROVING JUDICIAL PERFORMANCE IN BRAZIL”).
NÃO TENHO OBSERVADO NESTE, OU EM QUALQUER OUTRO ESTUDO, UMA DESPROPORÇÃO ENTRE O JUDICIÁRIO BRASILEIRO E DE OUTROS PAÍSES QUE JUSTIFIQUE A PUJANÇA DO “RISCO BRASIL”.
ESTATÍSTICAS SOBRE O CUSTO DO NOSSO JUDICIÁRIO E DA QUANTIDADE DE PROCESSOS QUE ELE É CAPAZ DE JULGAR POR HABITANTE NÃO NOS COLOCAM COMO O PRIMEIRO OU TAMPOUCO COMO UM DOS ÚLTIMOS DA FILA.
TUDO LEVA A CRER QUE UMA ASSOCIAÇÃO DIRETA ENTRE EFICIÊNCIA DO JUDICIÁRIO E “RISCO PAÍS” TENDE A SER FRUTO DE UMA ANÁLISE SIMPLISTA DA QUESTÃO.
O JUDICIÁRIO TEM TRABALHADO NO SENTIDO DE ASSEGURAR O CRESCIMENTO ECONÔMICO SUSTENTADO DO PAÍS.
SABEMOS DA IMPORTÂNCIA DA SEGURANÇA JURÍDICA EM RELAÇÃO AO VOLUME DE CRÉDITO OFERTADO.
E É PREOCUPADO COM ESTA, DENTRE OUTRAS QUESTÕES, QUE TEMOS EVOLUÍDO EM TRANSPARÊNCIA, RESULTADOS E EFICIÊNCIA.
ASSUMI A PRESIDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM JUNHO DE 2004.
ELEGI COMO OBJETIVOS FUNDAMENTAIS DO MEU MANDATO:
(1) INICIAR PROCESSO CONSISTENTE DE DIMINUIÇÃO DA MOROSIDADE DO JUDICIÁRIO;
(2) ADOTAR INICIATIVAS QUE REPERCUTAM DIRETAMENTE EM FAVOR DOS DIREITOS HUMANOS E DO ACESSO À JUSTIÇA;
(3) INSTITUCIONALIZAR UM NOVO MODELO ORGANIZACIONAL QUE PONHA FIM AO PURO “GERENCIAMENTO DE ROTINA”, AO IMPROVISO E AO INSULAMENTO ADMINISTRATIVO;
(4) AMPLIAR A LEGITIMAÇÃO DEMOCRÁTICA DA MAGISTRATURA, INTERAGINDO FORTEMENTE COM A OPINIÃO PÚBLICA;
(5) AUMENTAR A VISIBILIDADE DOS PONTOS POSITIVOS DA ATUAÇÃO JUDICIAL.
COMO EXPUS EM MEU DISCURSO DE POSSE, O ALCANCE DESSES OBJETIVOS DEPENDE DE UMA ESTRATÉGIA DE ALIANÇAS:
“A MESA DE DISCUSÕES TEM QUE SE AMPLIAR.
NÃO MAIS SÓ OS TRADICIONAIS ATORES – JUÍZES, PROMOTORES E ADVOGADOS.
DEVEM ESTAR NA MESA O GOVERNO, OS POLÍTICOS, OS FILÓSOFOS, OS ANTROPÓLOGOS, OS ECONOMISTAS, OS ADMINISTRADORES. TAMBÉM AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS E OS SINDICATOS DE TRABALHADORES E PATRÕES. ENFIM, TODOS OS QUE SÃO E FAZEM O PAÍS.”
A CRIAÇÃO E A CAPACIDADE OPERACIONAL DESSES ESPAÇOS DE ALIANÇAS DEPENDEM DE UMA AGENDA CONCRETA, QUE CONDUZA AOS OBJETIVOS ENUNCIADOS E MOTIVE OS AGENTES MENCIONADOS.
COM ESSE ESPÍRITO, EM DEZEMBRO DE 2004 FOI ASSINADO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, PELOS PRESIDENTES DO SENADO E DA CÂMARA DOS DEPUTADOS E PELO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, UM PROTOCOLO CONJUNTO: O “PACTO DE ESTADO EM FAVOR DE UM JUDICIÁRIO MAIS RÁPIDO E REPUBLICANO”. FORAM APROVADOS COMPROMISSOS EM TORNO DE VÁRIOS TEMAS, ESSENCIAIS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO SISTEMA DE JUSTIÇA.
SENHORES.
TENHAM CERTEZA DE QUE O JUDICIÁRIO BRASILEIRO ESTÁ FAZENDO A SUA PARTE.