Marco Aurélio requer aos governadores segurança para funcionamento da Justiça (atualizada)

24/03/2003 19:53 - Atualizado há 8 meses atrás

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Marco Aurélio, encaminha hoje (24/3), via fax, ofício aos governadores das 27 unidades da Federação requerendo garantias ao funcionamento do Poder Judiciário de todo o País. Uma transcrição do ofício foi enviado ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, aos presidentes do Senado e da Câmara, presidentes de todos os tribunais do país (Justiça comum, federal, eleitoral, trabalhista e militar) e presidentes de associações de classe da magistratura.


 


Na tarde de hoje, Marco Aurélio concedeu entrevista aos jornalistas para falar sobre o assassinato do juiz do Espírito Santo Alexandre Martins de Castro, ocorrido na manhã de hoje, em Vila Velha, no Espírito Santo. É a segunda morte de magistrado em dez dias. Outra vítima foi o juiz da Vara de Execuções Criminais e Diretor do Fórum da Comarca de Presidente Prudente, Antônio José Machado Dias.


 


Segundo o presidente, isso demonstra “o grau a que chegou o crime no Brasil. É preciso que as autoridades atuem. A segurança pública é um dever do Estado. É direito e responsabilidade de todos. E cumpre às unidades da Federação garantir o funcionamento do Poder Judiciário. Esse funcionamento – pelo mesmo nos dias de hoje – está abalado”.


 


E continuou: “A repressão à criminalidade – e quando cogito de repressão ao crime eu atento também para as buscas da causa – por quê se chegou a esse estágio? Isso é o que precisamos indagar e cobrar das autoridades constituídas”.


 


O presidente do STF salientou que “a Justiça é obra do homem. Nós somos emoção e temos nossa formação humanística. A tentativa é de intimidação e eu receio que essa intimidação possa ocorrer”.


 


Questionado sobre o uso das Forças Armadas nas ruas, que estaria sendo defendido pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Nilson Naves, o presidente afirmou que respeita a ótica do presidente do STJ, “mas como juiz incumbido de guardar a Constituição, digo que as Forças Armadas têm outra destinação. A cargo da Polícia Militar é que está a repressão ao crime”.


 


Quanto ao projeto encaminhado ao Congresso Nacional tratando como crime hediondo o assassinato de magistrados por facções do crime organizado, o ministro assim se pronunciou: “A pessoa em si do juiz tem o mesmo valor da pessoa comum. Não creio que possamos estabelecer, sem quebra do princípio isonômico, essa distinção. Creio que o tratamento deva ser igualitário. O crime deve ser combatido, corra a execução desta ou daquela pessoa, desta ou daquela autoridade, deste ou daquele cidadão”.


 


Segundo o ministro, os magistrados estão receosos. “Não se pode ser ingênuo. Nós estamos sujeitos a emoções e somos homens, e como homens nós tememos certas coisas que estão se verificando e que não deveriam ocorrer”, frisou.


 


“Tenho sentido a preocupação da magistratura e, no ofício que estou dirigindo aos governadores saliento a necessidade de o Poder Executivo viabilizar o exercício do Poder Judiciário, dando segurança àqueles que têm o dever de cumprir e fazer cumprir as leis”, concluiu.


 


Para o ministro é preciso se preocupar primeiro com aqueles que têm o encargo da persecução penal, referindo-se aos promotores de Justiça, “e também com aqueles que personificam o Estado nos julgamentos, executam essas decisões e atuam na área criminal. Aí nós temos não só o juiz que impõe as penas como também aqueles responsáveis pelas execuções dos decretos condenatórios”.


 


O ofício enviado aos governadores, de acordo com o ministro, baseia-se em um diploma legal que prevê até mesmo a intervenção, caso não haja “a garantia de funcionamento de qualquer dos Poderes – e aí nós temos o próprio Poder Executivo, o Poder Legislativo, e especialmente nesse estágio, o Poder Judiciário”.


 


Quando questionado se o STF, então, é favorável à intervenção nos Estados que não garantirem segurança aos magistrados, o presidente Marco Aurélio afirmou: “Não é bem isso. O que estou dizendo é que há uma norma constitucional que prevê a necessidade de se preservar o funcionamento dos Poderes”.


 


Perguntado por um jornalista se o assassinato do juiz no Espírito Santo poderia reforçar o pedido de intervenção no Estado, Marco Aurélio afirmou que não sabe do estágio em que se encontra o processo, “mas revela que o quadro é estarrecedor”.


 


“Temos ainda no Brasil uma Federação e na Federação se observa a autonomia governamental das unidades federadas. A responsabilidade, de início, é dos governadores”, disse Marco Aurélio.


 


O presidente, por sua vez, acredita que a exacerbação de regime do cumprimento da pena ou o aumento da pena não modificam a situação vigente.


 


Questionado se teria havido omissão dos governadores, Marco Aurélio disse que “só pode imaginar que se perdeu tempo. Vamos recuperar esse tempo”.


 


#AMG/BB//AM


 


Leia a íntegra do ofício do presidente do STF, ministro Marco Aurélio:


 


 


 


Of. nº 83/GP


 


Brasília, 24 de março de 2003.


 


Senhor Governador, 


 


    A segurança pública, dever do Estado, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Essa máxima consta do artigo 144 da Constituição Federal, decorrendo do disposto no inciso IV do artigo 34, nela contido, o dever das Unidades da Federação de garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes.


 



    Nos últimos dias, acontecimentos vêm revelando risco de vida para os que atuam como Estado-Juiz. Em 14 de março de 2003, o Juiz Coordenador das Execuções Penais em Presidente Prudente, São Paulo, Dr. Antônio José Machado Dias, foi executado, e hoje o estarrecedor episódio veio a repetir-se na pessoa do Juiz da Vara de Execuções Criminais de Vila Velha, Espírito Santo, Dr. Alexandre Martins de Castro.


 



    Desnecessário frisar a gravidade desses fatos, a aterrorizarem, ainda mais, os cidadãos em geral. Repercutem na vida pública brasileira, colocando em jogo a integridade física de todos aqueles a quem caiba, nesta ou naquela seara, a administração em seu sentido abrangente e, em especial, daqueles que, personificando o Estado, cumprem a lei e a fazem cumprir, dando concretude ao Poder Judiciário.


 


   A tentativa de intimidação é flagrante, competindo aos Executivos estaduais atuar na proteção tanto dos que lidam com a persecução criminal – Ministério Público -, como dos que julgam os processos dela decorrentes, presidindo as execuções das decisões condenatórias.


 


   Na qualidade de Chefe do Poder Judiciário Nacional, requeiro a Vossa Excelência as providências próprias ao estágio vivido.


 


Atenciosamente,


 


 


Ministro MARCO AURÉLIO


 


Presidente do Supremo Tribunal Federal 


 



Marco Aurélio: segurança para Justiça (cópia em alta resolução)

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