Supremo interrompe julgamento sobre foro especial e aplicação da Lei de Improbidade
O Supremo Tribunal Federal interrompeu hoje (20/11) o julgamento da Reclamação (RCL 2138) que discute o foro privilegiado e a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) aos agentes políticos. Até o momento, a tese que tem prevalecido é a do voto do ministro Nelson Jobim. Segundo ele, os agentes políticos não podem ser julgados pela Lei de Improbidade Administrativa porque já estavam submetidos a regime especial de responsabilidade, previsto anteriormente pela Lei 1.079/1950, que prevê os crimes de responsabilidade.
No caso em questão, a União, que é a reclamante, pretende ver extinto o processo que tramita no primeiro grau da Justiça Federal de Brasília, contra o ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Mota Sardemberg. Ele foi condenado ao ressarcimento do erário e à perda dos direitos políticos por oito anos por ter utilizado indevidamente aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB) .
Após a leitura do voto pelo ministro Nelson Jobim, relator da ação, houve sustentação oral. O Advogado-Geral da União, José Bonifácio Borges de Andrada, defendeu a procedência da ação. No mesmo sentido, falou o Ministério Público, representado pelo vice-procurador-geral da República, Haroldo Ferraz da Nóbrega.
Não puderam fazer sustentação oral a Associação Nacional do Procuradores da República (ANPR), o Ministério Público do Paraná e a procuradora da República no Distrito Federal Walquíria Quixadá. Eles se posicionaram contra a Reclamação, e tentaram impugná-la e apresentar sustentação oral na tribuna. Porém, tiveram seu requerimento indeferido pela maioria dos ministros do Plenário.
A maioria entendeu que o Ministério Público tem interesse na causa mas, perante o Supremo Tribunal Federal, a instituição é representada pelo procurador-geral da República. Nesse ponto, ficaram vencidos os ministros Carlos Velloso, Celso de Mello, Ilmar Galvão, Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio. Eles defenderam tese distinta, a de que o procurador-geral da República atua no Supremo como mero fiscal da lei, e não como parte no processo. Portanto, para essa corrente, a procuradora Walquíria Quixadá poderia ter ingressado como interessada, já que atuou como parte na ação por improbidade contra o ministro Sardemberg junto à primeira instância da Justiça Federal.
RELATOR
Terminada essa parte, o relator do processo, ministro Nelson Jobim, que havia anteriormente concedido liminar no processo, votou pela procedência da Reclamação. De acordo com ele, o julgamento de um agente político, como ministro de Estado, por um juiz de primeira instância é incompatível com a Constituição Federal (artigo 102, I, “c”), que concede prerrogativa de foro a essas autoridades.
Nelson Jobim lembrou que essa prerrogativa não é um privilégio pessoal dos agentes políticos, mas uma garantia para que possam exercer suas atribuições político-administrativas, que consistem em expressar a vontade soberana do Estado.
Para o ministro, os agentes políticos, além do crimes de responsabilidade, podem ainda ser punidos pela lei penal comum, mas também desde que sejam julgados pelo juízo competente conforme o previsto pela Constituição Federal. Não caberia portanto, para o relator, a submissão do agente político a uma outra lei, para que fosse julgado por autoridade inferior.
“Se se quisesse introduzir essa mudança, ela haveria de provir de emenda constitucional”, defendeu Jobim. “E nessa hipótese, melhor seria suprimir de vez a competência desta Corte para processar e julgar os ministros de estado, em sede penal e de responsabilidade”, concluiu ele.
O ministro deu exemplo de situações que derivam do processamento de autoridades pela primeira instância, como o afastamento cautelar do Presidente da República, do Congresso Nacional ou mesmo do Supremo Tribunal Federal.
Em seu voto, o ministro criticou também a propositura de ações que classificou de “espetaculares”, derivadas da inadequada aplicação das leis, sendo que a maioria é destituída de qualquer fundamento.
“O propósito notório é dar ao perseguidor uma aura de coragem e notoriedade e impor ao atingido o maior constrangimento possível”, afirmou ele, lembrando também da ampla divulgação pelos meios de comunicação dessas ações.
Em seu voto, também pela procedência da Reclamação, o ministro Gilmar Mendes ressaltou o argumento do relator no sentido de que os delitos previstos pela Lei de Improbidade são “autênticos crimes de responsabilidade”. Além disso, para ele, se um agente político deve ser julgado por infrações penais comuns pelo Supremo Tribunal Federal, então não poderia ser julgado por instância inferior por delitos da Lei de Improbidade Administrativa, que pode acarretar penas bem mais graves que a de alguns crimes comuns. Ele citou a perda do cargo ou dos direitos políticos.
Em seguida, também fazendo referência ao voto de Nelson Jobim, votaram a ministra Ellen Gracie e os ministros Maurício Corrêa e Ilmar Galvão, no mesmo sentido.
Após esses cinco votos pela procedência da ação, o ministro Carlos Velloso pediu vista dos autos para melhor refletir sobre o tema. Para a conclusão do julgamento, faltam os votos de mais 6 dos 11 ministros da Casa.
Caso vença a tese do relator, o processo contra Ronaldo Mota Sardemberg junto à 14ª Vara Federal do Distrito Federal será extinto, sendo nula a condenação que sofreu.
Ministro Jobim, relator da Reclamação (cópia em alta resolução)
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