Proteção à família, crianças e meio ambiente marcam o espírito fraternal da Constituição

13/07/2009 21:40 - Atualizado há 9 meses atrás

A Revolução Francesa – que eclodiu há exatamente 220 anos pondo fim à monarquia totalitária da França do século XVIII e a um sistema de privilégios lá reinante que beneficiava o clero e a nobreza –, deixou legados que sobrevivem até hoje. O próprio lema “liberté, égalité, fraternité!” (liberdade, igualdade, fraternidade!) desfraldado para, em 14 de julho de 1789, derrubar a Bastilha, símbolo do poder absoluto, está atualmente consolidado nas Constituições dos países democráticos, e isto também ocorre em relação ao Brasil.

Na verdade, a “fraternidade” está indissoluvelmente ligada aos pilares da Liberdade e da Igualdade, assim como também eles mantêm, entre si, um vínculo indissolúvel, no sentido de que todos os homens têm o direito de viver em liberdade e igualdade. E isto somente é possível com respeito humano solidário, com “fraternidade”.

Relação de igualdade

A ideia de fraternidade estabelece que o homem, enquanto animal político, fez uma escolha consciente pela vida em sociedade e para tal estabelece com seus semelhantes uma relação de igualdade, visto que em essência, em sua natureza, não há nada que hierarquicamente os diferencie: são como irmãos (fraternos).

Esse conceito é a peça-chave para a plena configuração da cidadania entre os homens, pois, por princípio, todos os homens são iguais. De uma certa forma, a fraternidade não é independente da liberdade e da igualdade, pois para que cada uma efetivamente se manifeste é preciso que as demais sejam válidas.

A fraternidade é expressa no primeiro artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, quando ela afirma que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e de consciência e devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.

Poder-se-ia dizer que o conceito da fraternidade está inscrito na Constituição Federal brasileira mais especificamente no capítulo dos Direitos Sociais, em que assegura a todos o direito à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, a proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados (artigo 6º da  Constituição Federal e Título VIII, que trata da Ordem Social, artigos 193 a 250). 

A consolidação do conceito de fraternidade pode ser identificada, também, em tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil que versam sobre direitos humanos e cooperação na ajuda a pessoas necessitadas em outras partes do mundo, assim como na filiação do Brasil à Organização das Nações Unidas e a outros órgãos que têm por finalidade promover o bem-estar e a paz entre os homens.

A ideia de fraternidade caminha paralelamente, ainda, aos conceitos de democracia e liberdade. Seja mencionado aqui apenas um exemplo para ilustrar que isto nem sempre foi assim, nem mesmo na Antiga Grécia, berço da democracia: os gregos continuaram mantendo a escravidão como sendo algo normal, sem considerar os escravos como seres humanos iguais a eles, não lhes dando o direito de autodeterminação. Aliás, o Brasil foi o último país do Ocidente a abolir a escravatura.

Legados

Só para citar alguns dos legados deixados pela Revolução Francesa, que vincularam, indelevelmente, aquele movimento revolucionário à história da humanidade – além dos já tratados nesta série de reportagens: a gratuidade do ensino; a entrega de pensões (então anuais) e a prestação de assistência médica gratuita a crianças, velhos, enfermos, mães e viúvas; auxílio a indigentes; lei do máximo e do mínimo, teto para preços e salários, do que resultou o salário-mínimo existente na legislação brasileira.

CF de 1988

Em nossa Constituição, além dos direitos sociais já citados, podemos atribuí-la ainda, como influência do espírito fraternal revolucionário, a proteção à criança e ao adolescente, presente no artigo 227, que determina ser dever de todos garantir o desenvolvimento sadio desses seres que representam o futuro do país. A proteção do meio ambiente, dos povos indígenas, do idoso, dos deficientes físicos, entre outras minorias sociais, também são exemplos de impregnação do espírito fraternal em nossa Constituição.

Para incrementar a participação da sociedade no dia-a-dia da aplicação do direitos, recentemente o STF começou a aceitar a presença do “amicus curiae”. Ele é um terceiro que intervém no processo de tomada de decisão judicial, frequentemente, em defesa dos interesses de grupos por ele representados, oferecendo informações acerca da questão jurídica controvertida, bem como novas alternativas interpretativas.

É um instrumento utilizado, essencialmente, por entidades associativas, que oferecem memoriais com três tipos de informação: reforço a argumentações jurídicas já presentes no processo; elementos técnicos não legais ou dados sobre de fatos e indícios acerca das preferências políticas do grupo de interesses que representam. Um fator de abertura procedimental e de pluralização da jurisdição constitucional em nosso País.

O Supremo Tribunal Federal, imbuído desse sentimento, vem realizando audiências públicas, a fim de que suas decisões, referente a temas de grande relevância social, possam ser tomadas levando em conta a participação popular, aproximando-as das reais necessidades da população brasileira, servindo como a última trincheira do cidadão frente ao abuso de poder, bem como possíveis excessos cometidos contra seus legítimos detentores, o povo.

FK/LF//AM

Bibliografia:
BONAVIDES, Paulo. Teoria Constitucional da Democracia Participativa por um Direito Constitucional de luta e resistência por uma Nova Hermenêutica por uma repolitização da legitimidade. 2ª edição, editora Malheiros.

COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3ª edição, editora Saraiva.

GAZOTO, Luís Wanderley. Direito, Linguagem e Revolução Francesa, in Revista de Doutrina e Jurisprudência do TJ-DFT (jan-abr de 2000)

VAREJÃO, Marcela. Sobre o Direito Natural na Revolução Francesa, in Revista de Informação Legislativa, Senado Federal (1989/1990).

MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. As diversas correntes do pensamento jurídico, in Revista de Informação Legislativa, Senado Federal (1989/1990).

ALVES, Ricardo Luiz. A Revolução Francesa: um breve enfoque crítico, in Consulex, Ano XVII – nº 10.

OLIVEIRA, Adriana Vidal. Repensando os Valores da Revolução Francesa nas Sociedades Plurais: um debate entre Erhard Denninger e Jürgen Habermas, in Teoria Constitucional Contemporânea e seus impasses. PUC-Rio, Ano XI, nº 1, 2005.

Wikipédia: HTTP://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C#%A7%C3%A3o_Francesa

 

 

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