Presidente do STF concede entrevista sobre o julgamento da demarcação de Raposa Serra do Sol
Ao final do julgamento sobre a demarcação da área indígena Raposa Serra do Sol, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, respondeu às perguntas de jornalistas de diversos meios de comunicação. Leia a íntegra da entrevista:
Presidente, o senhor pode explicar de uma forma didática o que vem a ser uma execução imediata com o apoio do TRF?
Ministro Gilmar Mendes – Na verdade, o Tribunal já tinha decidido naquela assentada que era necessário aguardar a revogação da liminar, aguardar a conclusão do julgamento, embora houvesse já votos suficientes para a proclamação do resultado, muito claro que poderia haver mudança. E a decisão agora deve ser cumprida de imediato, acho que em parte ela já foi cumprida por negociação entre a Funai e os eventuais ocupantes na área, estranhos ao processo de ocupação indígena. E o Tribunal, então, está determinando que se cumpra a decisão. Claro que se podem surgir incidentes que serão resolvidos pelo relator. Para que não haja uma desintrusão administrativa, violenta, o Tribunal confiou essa supervisão ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O relator vai fazer a supervisão, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, especialmente o presidente, Jirair Meguerian, vai fazer a execução e articulação, eventualmente, com juízes auxiliares.
Imediato, nesse caso, é agora ou vai ter uma fixação de prazo como, por exemplo, 15 dias?
Ministro Gilmar Mendes – Isto o relator vai fixar tendo em vista peculiaridades existentes. Nós não conhecemos toda a realidade, a complexidade, colheitas, situações que exijam, talvez, uma desintrusão modulada. Tudo isso será feito em acerto com o relator e o presidente do Tribunal Regional Federal. O que não se quer é violência, extravagância, demonstração de poder. Isto que não se quer.
Ministro, como é que o senhor define a tramitação desse julgamento, do processo?
Ministro Gilmar Mendes – Eu acho que este é um processo histórico por várias razões. Eu tenho reiterado que, pela primeira vez, o Tribunal se debruçou sobre a Constituição de 1988 sobre um tema desta dimensão, a questão da posse indígena com tanta intensidade. Nós tivemos vários mandados de seguranças, várias discussões, mas não tínhamos tido uma análise tão aprofundada desse tema e agora, então, tivemos a oportunidade e fixamos um estatuto que deve ser aplicado não só ao caso de Raposa Serra do Sol, mas também aos demais processos de demarcação, inclusive aos processos em curso.
O senhor está se referindo às 19 condições que foram estabelecidas?
Ministro Gilmar Mendes – Essas condições se aplicam a Raposa Serra do Sol, mas têm também um efeito transcendente para os demais casos de demarcação. O Tribunal assentou, por exemplo, que áreas já demarcadas não serão mais objeto de revisão, sejam elas anteriores ou posteriores à Constituição. Com isso, nós estamos encerrando talvez um número elevado de controvérsias e alguns impulsos expansionistas.
Isso significa, ministro, que os demais casos não serão julgados ou eles serão julgados com base nessa decisão?
Ministro Gilmar Mendes – Os casos que estão aqui, muito provavelmente serão julgados, mas já com essas balizas assentadas. Com isso, acho que há um alívio para todas as partes, o governo passa a saber os limites de sua ação. Também os afetados passam a ter alguma segurança jurídica nesse contexto.
O fato de não ter sido definida a questão das indenizações isso pode ainda provocar tensões?
Ministro Gilmar Mendes – Não, isso pode ser questão no plano do direito civil. As pessoas poderão dizer que têm mais ou menos direito. Isso se estende na esfera cível, não há grandes repercussões. A própria Constituição já dá balizas para isso, quanto ao direito à indenização em relação às benfeitorias, mas aqui ou acolá nós podemos ter controvérsias. As pessoas podem dizer que o valor é mais elevado, mas isso se resolve, como em outros casos, no plano do direito civil, nas varas cíveis de forma adequada.
O que faz o senhor acreditar que não vão ter novos conflitos, tensões nas região?
Ministro Gilmar Mendes – Eu tenho a impressão que já há autoridade do Supremo Tribunal Federal, a legitimidade da Corte, a seriedade com que se julgou, com que se analisou este caso evita essas tensões. Depois, o Tribunal está estabelecendo limites para todos os lados no conflito. Acho que isso é extremamente positivo. E se houve eventual conflito, ninguém pode apostar que não haverá conflito ainda que tópico ou localizado, haverá meios jurídicos, meios judiciais, adequados para solucioná-los.
Essa análise que ficará a cargo do relator, vai demandar novos processos?
Ministro Gilmar Mendes – Não, são petições e decisões que podem ser agravadas. O próprio relator também poderá suscitar essa questão, trazer questão de ordem ao Plenário, como foi dito expressamente.