Defensores de cotas raciais entregam “Carta da igualdade” ao presidente do STF aos 120 anos da Abolição
Um grupo de defensores das cotas raciais, integrado por representantes de todas as regiões e da maioria dos estados brasileiros, entregou, nesta terça-feira (13) ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, o manifesto “Carta da Igualdade”. O documento defende as cotas raciais já instituídas em várias universidades brasileiras. A audiência com o presidente do STF foi realizada na data em que se completam 120 anos de Abolição da Escravatura.
Antes do encontro com o ministro Gilmar Mendes, o grupo foi recebido pelo ministro Joaquim Barbosa. À saída do encontro, o professor Alexandre do Nascimento, integrante do Movimento Pré-Vestibular para Negros e Carentes e professor da FAETEC/RJ, uma rede de escolas técnicas mantida pelo governo fluminense, refutou o argumento daqueles que são contra as cotas e defendem, em vez de se priorizar o acesso às universidades, a priorização do ensino de primeiro e segundo graus.
A favor das cotas raciais nas universidades, o professor Alexandre disse que, em primeiro lugar, “elas pagam uma injustiça histórica, uma dívida que o Estado brasileiro tem com a população negra”. Segundo ele, as cotas não ferem o princípio do mérito, “até pelo contrário, quem precisa das cotas neste país são as instituições, principalmente as universidades, não necessariamente a população negra”.
“Nós estamos convictos de que as cotas serão um passo fundamental para a democratização não só do ensino superior, mas também das instituições brasileiras, inclusive desta Casa [o STF], que hoje tem apenas um ministro negro”, observou.
Quanto ao argumento de que seria mais importante priorizar o ensino de primeiro e segundo graus, o professor Alexandre disse que as cotas “não têm nada a ver com a não-priorização do primeiro e do segundo graus”. Conforme ele, o movimento negro foi o primeiro a defender, antes mesmo do Manifesto dos Pioneiros, uma escola pública para todos.
“Todos nós estamos de acordo em que a qualidade do ensino de primeiro e segundo graus, o ensino básico, tem que melhorar, ninguém tem dúvida disso”, afirmou. Para ele, as universidades precisam mudar a sua forma de seleção. “É preciso mexer na dinâmica das universidades, e as cotas, no nosso entendimento, vão ajudar a fazer isso e, mais que isso, vão ajudar a gente a ter um Brasil mais justo”, salientou.
Organizadores
“Nós estamos aqui entendendo que o Supremo Tribunal Federal está sensível a um Brasil melhor”, disse frei David Raimundo dos Santos, que participou da redação do documento entregue hoje ao presidente Gilmar Mendes. “Para nós, é lamentável que 97% do povo afro-brasileiro nunca teve acesso à universidade, é inaceitável que menos de 1% dos professores das universidades públicas são afro-descendentes”, ressaltou.
Segundo o frei, esses dados são suficientes para que os poderes da República promovam políticas contra as dificuldades dos negros quanto à igualdade de justiça nos demais seguimentos da sociedade. “A inclusão social será totalmente remodelada a partir do momento em que nós negros nos apresentarmos para a sociedade como pessoas capacitadas”.
Conforme ele, o sistema de cotas é o primeiro passo para começar uma sociedade mais igualitária. “Estamos combatendo o racismo e dando ao negro igualdade de condições”, completou.
O advogado Renato Ferreira também auxiliou a redigir o manifesto. Pesquisador de políticas públicas e especialista em direito e relações raciais, ele informou que o movimento é pacífico e republicano. De acordo com Ferreira, “existe uma diferença significativa entre negros e brancos no Brasil, e isso não foi tratado após a abolição da escravatura. Os negros ficaram numa situação de desvantagem flagrante em relação aos demais membros do Brasil”, disse.
Ele revelou que as cotas são um passo importante para o processo mais igualitário, entretanto considerou fundamental a melhoria do ensino público, com a revitalização do sistema educacional. “Sabemos que isso leva tempo e por si só não vai gerar um resultado”, destacou.
“Que o Brasil comece a trilhar um caminho de paz, um caminho fraterno, sem banalizar desigualdades incompatíveis com o estado democrático de direito”, finalizou, ressaltando que não se pode deixar para as gerações futuras uma sociedade desigual.
EC,FK/EH