Ministra Ellen Gracie e ministros do STF destacam importância da Conciliação

02/02/2007 17:25 - Atualizado há 12 meses atrás

Na abertura do Ano Legislativo de 2007, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Ellen Gracie, destacou a importância da conciliação na Justiça brasileira. A ministra ressaltou que é muito importante “criar uma cultura de paz, de aproximação e de resolução pacífica das controvérsias”.

Em seu discurso no Congresso, Ellen Gracie afirmou que “o Poder Judiciário Brasileiro manifesta seu reconhecimento pelo esforço de aperfeiçoamento institucional consubstanciado na aprovação dos três projetos de lei que, agora darão uma nova feição ao serviço público que nos incumbe prestar”.

A ministra ressaltou que será necessária a atenção da atual legislatura para outras medidas propostas que deverão complementar as iniciativas já adotadas. Dentre elas, a presidente salientou a necessidade da criação de uma cultura de pacificação social mediante a adoção de medidas conciliatórias entre as partes, tema que consta da agenda da atual legislatura e faz parte das prioridades do CNJ.

Ministros do STF declaram que “conciliar é legal”

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso se declaram francamente favoráveis à conciliação. O questionamento “conciliar é legal?” foi feito aos dois ministros durante entrevista à imprensa, nesta tarde (2/2).

Cezar Peluso

Cezar Peluso declarou que conciliar “é mais do que legal”. Para ele, o CNJ assumiu agora uma atitude que representa um longo processo que se inspirou sobretudo em alguns movimentos de operadores de direito familiar.

Em sua experiência como juiz de Vara de Família, em São Paulo, Peluso disse que sempre trabalhou no sentido da conciliação, já que não se trata apenas de por fim a um conflito exclusivamente jurídico, pois esses escondem outros tipos de conflitos interpessoais, de conseqüência e alcance mais amplo, com repercussão na sociedade, na família, nos grupos sociais.

Peluso lembrou que esses conflitos geram situações que repercutem na formação de crianças e, portanto, no próprio processo de formação de cidadãos. Na conciliação, diferentemente das sentenças judiciais que sempre deixam mágoas e ressentimentos, a conciliação promove soluções consensuais que são mais eficazes sob todos os pontos de vista. Ainda que os cônjuges, as partes, as pessoas sejam obrigadas a abrir mão de alguma coisa, sem o que é difícil conciliar, elas mesmas “põem fim a um litígio, promovendo uma tranqüilidade pessoal, a situação social de calma, com uma grande vantagem para a sociedade, pois permite que não se multipliquem causas cujo processo iria envolver mais dificuldades em processar outras causas inevitáveis”.

O ministro informou que a conciliação se associa a um movimento amplo dos operadores do direito que é o projeto da lei sobre mediação, já que se tratam de atividades análogas. O projeto de lei, baseado em anteprojeto redigido inicialmente por Peluso, foi apresentado pela então deputada Zulaiê Cobra (PSDB-SP) e está sob apreciação do Congresso Nacional com apresentação de revisões e sugestões. O ministro disse que está acompanhando, na medida do possível, a tramitação do projeto de lei que deverá mobilizar, além dos Três Poderes, a sociedade brasileira.

Ricardo Lewandowski

Também o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que “conciliar é super legal, pois há um excesso de demanda no Poder Judiciário, demandas que poderiam ser resolvidas de outras formas que não necessariamente de formas processuais ou judiciais”.

O ministro informou que orientou uma tese de doutorado que trata do assunto de forma interessante ao comparar as demandas da sociedade pela resolução de controvérsias e dissídios a uma pirâmide. Aquelas mais importantes que estariam no ápice da pirâmide deveriam vir para o Judiciário e as que estão na base ou no meio da pirâmide seriam resolvidas pela conciliação, pela mediação, pela arbitragem e outros mecanismos que a própria sociedade tem. Ele citou como exemplos o pastor, o padre, o rabino, as sociedades de amigos de bairro, associações de pais e mestres e até os clubes e as próprias famílias que poderiam resolver grande parte das controvérsias.

A conciliação, feita por profissionais especializados se insere na idéia da pirâmide. Apenas as questões mais importantes, que dizem respeito a direitos indisponíveis, às questões de estado, viriam para o Judiciário. Já as que versem sobre direitos disponíveis, onde pode haver transação, poderiam ser resolvidas pela conciliação, pela mediação, pela arbitragem e outros mecanismos informais de ajuste e composição desses dissídios. Brigas entre vizinhos, conflitos de relação de consumo e até questões entre patrões e empregados, não precisam necessariamente chegar ao Judiciário, podendo ser resolvidas espontaneamente, finalizou Lewandowski.

A experiência do Dia Nacional da Conciliação

Em dezembro último, após um criterioso trabalho de preparação, o Dia da Justiça (8 de dezembro) ficou marcado como Dia Nacional da Conciliação. Quase 84 mil audiências foram realizadas em todo o país e o índice de acordos alcançado superou os 55,36%  dos casos (46.493). Ao todo, 56 tribunais Estaduais, Federais e Trabalhistas participam dos mutirões de conciliação, que foram realizados em 550 cidades de todo o País.

O Conselho implantou o movimento pela Conciliação como programa permanente de estímulo à adoção desta fórmula de solução de pendências que, de outra maneira, poderiam resultar em penosas demandas judiciais.

Em todo o país, alguns tribunais já definiram áreas preferenciais de conciliação, com resultados ainda mais promissores. É o caso da marca alcançada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), no Rio Grande do Sul, de 90,91% de acordos celebrados no crédito imobiliário.

Repercussão nacional

O interesse pelo tema não se restringe ao Poder Judiciário. A adesão de importantes setores do empresariado, por suas Federações, com a criação de câmaras permanentes de conciliação, revela que esta forma alternativa de solução de conflitos vem sendo estimulada e tem seus méritos reconhecidos. Ela é particularmente adequada às relações econômicas de caráter continuado, como são as que se estabelecem entre fornecedores de insumos e os grandes fabricantes, entre estes e sua rede de revendedores e com o grande número dos consumidores finais.

De acordo com Ellen Gracie, um dos segredos para que a conciliação alcance bons resultados é que os conciliadores sejam muito bem preparados, mas não atuem como juízes. “Eles são meros intermediários entre as partes e são as partes que constroem a solução”, disse a ministra que vê a conciliação como o caminho para a paz e para a aproximação do Judiciário ao cidadão.

A proposta lançada em todo o país é uma experiência inédita para os cidadãos que buscam a Justiça para solucionar algum conflito. Sob a coordenação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), naquele dia, foi iniciada uma campanha para criar uma cultura de conciliação em todo Poder Judiciário. De acordo com a presidente do STF, foi proposto “um movimento nacional para resolver, por meio de simples e rápido acordo entre as partes, disputas judiciais que levariam anos pelas vias tradicionais. Em alguns casos a conciliação pode solucionar conflitos que ainda nem chegaram a se transformar em ações judiciais”.

Para o juiz auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Pedro Yung-Tay Neto, o Dia Nacional da Conciliação foi "apenas um marco, o início de um trabalho definido como Prioritário pelo CNJ". Os números, de acordo com o juiz, mostram o grande potencial das iniciativas pela busca de soluções não litigiosas para os conflitos. "Entre as inúmeras vantagens da conciliação, podemos citar pelo menos duas: economia de tempo e economia de desgaste emocional. Não há nada que pague isso", comemora o magistrado.

As audiências resolveram desde reclamações trabalhistas, causas de família e sucessões, infância e juventude, execuções fiscais e até acidentes de trânsito. Não é só. Discussões envolvendo defesa do consumidor, contribuições previdenciárias e benefícios do INSS também estiveram na pauta de todos esses acordos.

Além de inovadora, a experiência foi extremamente enriquecedora tanto para usuários da Justiça e os juízes. Os primeiros tiveram contato com a conciliação e provavelmente irão desenvolver uma cultura favorável a acordos, que no Brasil ainda são incipientes: o índice atual de acordo nos processos judiciais oscila entre 30% e 35%, enquanto que em países que já adotaram a conciliação como forma alternativa de solução de conflitos passa dos 70%. “Os juízes, ao desafogar o Judiciário daquelas causas mais simples resolvidas por consenso, terão uma rara e concreta oportunidade de dedicar mais tempo aos questionamentos complexos e de interesse nacional ou regional”, declarou Ellen Gracie.

Mas, além de descongestionar o Judiciário – com a diminuição radical do tempo de tramitação e julgamento desses processos e, ainda, do próprio volume de processos, ao se evitar que eles sejam ajuizados –, o grande fruto da conciliação são os efeitos construtivos e transformadores que ela passa a gerar nas partes. A conciliação gera mudanças de atitude que habilitam os cidadãos a solucionar suas diferenças pela via amigável, deixando para o Judiciário apenas aqueles casos em que não possa fazê-lo, depois de qualificadas tentativas.

De acordo com o CNJ, não se quer, com isso, apenas diminuir a quantidade do trabalho dos juízes, mas ajudar a construir uma sociedade melhor, que enfrente as controvérsias de uma maneira menos litigiosa, e que, para isso, possa contar com pessoas qualificadas para exercer a conciliação. Daí, também, a necessidade de investir no aprimoramento desse instituto, com o treinamento de pessoas aptas a desempenhar o papel de conciliadores.

Também o presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal  (TJDFT), desembargador Lécio Resende, entende que “embora muitos encarem o mutirão somente como uma forma de eliminar a quantidade de processos em tramitação nos  Juizados  Especiais, o maior objetivo da iniciativa foi o de conciliar pessoas restabelecendo assim a paz social”. No Distrito Federal, o mutirão aconteceu em 29 juizados, em suas 12 circunscrições judiciárias e 64,09% das audiências resultaram em acordo.

A integração de projetos do Judiciário

"Acreditamos que o entendimento entre as partes é sempre o melhor caminho para que a Justiça prevaleça. Nós, magistrados, recebemos de segunda e terceira mãos a realidade dos fatos; quem conhece as motivações explícitas e ocultas que estão por trás de cada processo judicial são as partes envolvidas. O que fazemos, com grande esforço, dedicação e seriedade, é uma tentativa de enxergar através desse nevoeiro e buscar a solução mais próxima da Justiça", afirma Ellen Gracie.

Para ela, a conciliação, somada aos novos instrumentos jurídicos que o Congresso Nacional aprovou – a Súmula Vinculante, que evitará a chegada de milhares de processos repetitivos ao Supremo Tribunal Federal, a Repercussão Geral, que permitirá aos ministros do STF selecionar as causas que o Tribunal deve julgar, sob o critério da relevância dos temas tratados e a Lei 11.419/06, que dispõe sobre a informatização do processo judicial – inaugura um novo tempo para o Judiciário brasileiro. “Um tempo de maior agilidade e efetividade, de diálogo e contato com o cidadão comum, de conscientização mútua do papel das partes na busca de uma cultura da paz", concluiu Ellen Gracie.

IN/AR


Na abertura do Ano Legislativo de 2007, Ministra Ellen Gracie, destacou a importância da conciliação na Justiça brasileira (cópia em alta resolução)

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