1ª Turma nega pedido de trancamento de ação penal a desembargador capixaba

05/12/2006 18:35 - Atualizado há 1 ano atrás

Em decisão unânime, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve denúncia, em ação penal, recebida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o desembargador federal A.I.A. do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2). Os ministros negaram o Habeas Corpus (HC) 88759 impetrado pela defesa do magistrado que está sendo acusado pelos  supostos crimes de quadrilha (artigo 288), estelionato (artigo 171, parágrafo 3º), em concurso de pessoas, combinado com os artigos 69 e 71 , todos do Código Penal.

Consta da acusação que o desembargador associou-se de forma estável a dois advogados, um magistrado do TRF-2 e um membro do Ministério Público Federal, com a finalidade de obter vantagens ilícitas em detrimento do erário. A denúncia traz uma série de provimentos judiciais atribuídos ao magistrado que teriam beneficiado, sem previsão legal, os advogados denunciados que atuavam junto à Justiça Federal no estado do Espírito Santo.

Defesa

Em síntese, os impetrantes alegam a atipicidade da conduta, bem como a impossibilidade do recebimento da denúncia em virtude de sua inépcia e falta de justa causa para a instauração da ação penal. Alegam também que a denúncia não contém elementos mínimos de autoria e materialidade, limitando-se a apontar genericamente os fatos imputados ao denunciado.

Segundo a defesa, a configuração da falta de justa causa se daria em razão da inexistência da individualização da conduta atribuída ao acusado, além de não existir referência ao magistrado em gravações telefônicas trazidas na denúncia.

Denúncia

O relator, ministro Ricardo Lewandowski, ao ler principais trechos da denúncia, disse que as decisões proferidas pelo magistrado seriam controvertidas. Apesar dos juízes poderem decidir com em seu livre convencimento, conforme a denúncia, “a reiteração, permanência e a natureza das decisões permitem concluir que as atuações do magistrado, mais do que inusitadas, foram criminosas”.

Dentre outros pontos, a denúncia destaca que os advogados se valeram de artifícios fraudulentos visando burlar a livre distribuição dos processos da Justiça Federal do Espírito Santo e direcioná-lo para o juiz integrante da organização criminosa. Um deles consistiu na união de processos sem que se verificasse a hipótese de conexão de ações em razão do objeto ou da causa de pedir, tratando-se apenas de questões semelhantes. Conforme a denúncia, “a admissão de dezenas de empresas como litisconsórcios em processos, retrata grave violação do princípio da livre distribuição com a escolha do juiz”.

Consta, ainda, que um grupo de advogados teria se apropriado de empresas com inscrição regular no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) e, em seguida, promoveram alterações de seus contratos sociais declarando falsamente uma nova atividade. Informalmente constituídas, essas empresas – que não existiam de fato – ajuizaram diversas ações idênticas na Justiça Federal do Espírito Santo a fim de eximirem-se do pagamento de tributo. Tal fato teria causado relevantes danos ao erário.

De acordo com a denúncia, somente em três ações os cofres públicos tiveram prejuízos superiores a R$ 418 milhões e 700 mil reais.

Voto do relator

Para o ministro Ricardo Lewandowski, a conduta do desembargador foi individualizada na denúncia, segundo a qual destacou que o magistrado federal “deu guarida a organização criminosa em sede judicial concedendo absurdas decisões em ações propostas pelos advogados denunciados autorizando o levantamento de altíssima importância cujo depósito havia determinado a título de pagamento de tributos federais”.

Assim, para o relator, A.I.A. teria tido “papel proeminente nos trabalhos da organização criminosa, pois foi a partir de suas decisões que a empreitada criminosa obteve êxito”.

“A denúncia contém a exposição das condutas que configuram em tese os crimes nela tipificados, de sorte que não se pode cogitar de sua inépcia, já que estão atendidos os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal”, disse o ministro. Segundo ele, a jurisprudência do Supremo orienta-se no sentido de que não se declara inepta a denúncia se o seu teor permitir o exercício do direito de defesa.

Em seu voto, o Lewandowski também ressaltou que “diante dos indícios de autoria e da prova da ocorrência dos fatos delituosos não há que se falar em falta de justa causa ou na anulação do processo”. Para ele, a decisão contestada está em conformidade com a jurisprudência da Corte “não havendo falar em ilegalidade no recebimento da denúncia que, como se sabe, não representa o juízo condenatório”. O ministro explicou que o acusado tem a oportunidade de exercício da ampla defesa e do contraditório para provar sua inocência principalmente quanto aos fatos alegadamente delituosos imputados a ele.

“Por fim, relembre-se que a análise do contexto probatório, especial no que toca a materialidade do delito, extrapola os limites da via estreita do habeas corpus que não admite discussão aprofundada de fatos e provas como tem consignado esta Corte”, concluiu o ministro que votou pelo indeferimento do habeas. Os demais ministros votaram da mesma forma.

EC/RN


Ministro Ricardo Lewandowski, relator (cópia em alta resolução)

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