Ministra Ellen Gracie recebe documento de entidades de defesa da mulher
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Ellen Gracie, recebeu hoje, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em Vitória (ES), documento assinado pelo Fórum Estadual de Mulheres e mais 27 entidades de defesa da mulher. O documento pede apoio da ministra para a rápida implantação das Varas Especializadas de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, previstas na Lei nº 11.340/2006, conhecida como “Lei Maria da Penha”. Ellen Gracie declarou que é incentivadora da criação, em todo o país, de Varas e serviços especializados nesse tipo de crime contra a mulher.
Uma demanda nacional
Em 22 de setembro, quando esteve no Rio de Janeiro, em continuidade a seu projeto de visita às instâncias jurídicas em todos os estados brasileiros, Ellen Gracie conheceu o trabalho desenvolvido pelo Instituto Noos que, desde 1999 é parceiro da justiça fluminense. A ministra elogiou o trabalho realizado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) e declarou que o CNJ vai propor uma política nacional de criação desse tipo de serviço e varas especializadas em crimes domésticos contra a mulher.
Experiência de sucesso
Segundo o coordenador do Núcleo de Gênero, Saúde e Cidadania do instituto, psicólogo Fernando Acosta, o trabalho no estado do Rio começou com o programa PM Cidadã. Ele foi iniciado com um grupo de policiais presos no 9º Batalhão da Polícia Militar, que era conhecido, no estado, “por sua tradicional brutalidade e pelo freqüente desrespeito aos direitos humanos”. Para a coordenadora da área de segurança e gênero, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), da Universidade Cândido Mendes, Bárbara Musumeci Soares, também parceira no projeto, “os resultados foram simplesmente surpreendentes”. Policiais, “adestrados para o exercício da objetividade e muito pouco afeitos à reflexão subjetiva, pareciam ter descoberto outra arena” onde se reconstruíram como homens, conclui a pesquisadora.
Atualmente, o projeto denominado “Aplicação de Medidas Alternativas aos Homens Autores de Violência Intrafamiliar e de Gênero” é coordenado pelo Noos e operacionalizado em parceria com os Juizados Especiais Criminais (JECRIMs) da cidade do Rio, Duque de Caxias e São Gonçalo, no estado do Rio de Janeiro.
Os integrantes do projeto na justiça fluminense consideram que os homens que empregam a violência contra a mulher, o fazem quando percebem seu poder e controle ameaçados. Como alternativa é proposta a construção da “democracia do cotidiano: forma de poder que todo ser humano exercita com a finalidade de organizar nossas redes sociais – pessoais, institucionais e comunitárias”.
Agregando iniciativas
A experiência fluminense deverá servir de guia para a criação de serviços congêneres em todo o Brasil, mas não vai inviabilizar outros programas em andamento. Entre eles, destaca-se a inauguração no último dia 22 de setembro, no Distrito Federal e Mato Grosso, Varas Especializadas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Essas varas começaram a funcionar no mesmo dia da entrada em vigor da “Lei Maria da Penha” (Lei nº 11.340/2006).
Mesmo antes da inauguração dessas varas, alguns tribunais no Brasil já se preocupavam com o problema. Na Justiça do Distrito Federal, por exemplo, os casos de menor potencial ofensivo eram tratados nos JECRIMs, que contavam com apoio do Núcleo Psicossocial forense (NUPS). O grupo, multidisciplinar, realiza o acompanhamento psicossocial e terapêutico com a vitima e agressor. O projeto do TJDF também atua em casos originados pelo uso droga e do alcoolismo.
De acordo com o NUPS, na maioria dos casos, a mulher agredida não quer se separar do marido, mas apresenta a queixa para que o conflito doméstico termine, na tentativa de manter o núcleo familiar unido. Grande parte dos agressores são alcoólatras. Nesse caso o NUPS oferece terapia especializada visando a recuperação do álcool-dependente. As mulheres (e filhos) em situação de risco, vítimas de violência em casa, são encaminhadas pelo núcleo a um abrigo, por meio da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher.
O apoio do CNJ
A ministra Ellen Gracie acompanha a trajetória da Lei Maria da Penha, desde a apresentação do Projeto de Lei até a sanção presidencial em agosto, quando esteve presente à solenidade. Na ocasião, Ellen Gracie disse ver com muita alegria a sanção, que dá continuidade à chamada Convenção de Belém do Pará, criada para erradicação de toda forma de violência contra a mulher no mundo. “Trata-se de um instrumento importante para que eliminemos esse primeiro foco de violência”, completou. Desde aquela data a ministra já havia anunciado que o CNJ lançaria um programa para criação de Varas especializadas em problemas de violência doméstica, com a assistência de promotores, magistrados e psicólogos.
Lei Maria da Penha
A lei homenageia Maria da Penha Fernandes, símbolo da luta contra a violência familiar e doméstica. Cidadã cearense, ela sofreu duas tentativas de homicídio por parte do ex-marido. Na primeira, recebeu um tiro enquanto dormia, deixando-a paraplégica. O agressor alegou que errou o disparo contra um ladrão que tentava roubá-los. Como se não bastasse, durante sua recuperação, quinze dias após voltar para casa, o marido de Maria da Penha atentou pela segunda vez contra a vida da companheira, numa tentativa de eletrocutá-la durante o banho.
O agressor foi punido 19 anos após a ocorrência do crime, fato que provocou denúncias à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), pelo Centro pela Justiça pelo Direito Internacional (CEJIL) e pelo Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM).
Com a entrada em vigor dessa lei, a proteção da mulher vítima de violência familiar e doméstica recebe atenção diferenciada do sistema jurídico brasileiro. Entre as inovações mais importantes a vedação se aplicar penas pecuniárias [multas ou sanções que envolvam dinheiro] ao agressor. Também vai ser necessária a especialização em direitos humanos dos juízes, promotores, defensores e demais agentes que atenderão diretamente os envolvidos nos casos, sejam eles vítimas ou agressores.
IN/CG